O Brexit vai ser um desastre para a indústria cinematográfica da Grã-Bretanha.

Esse é o sentimento geral que surge nas primeiras horas após serem conhecidos os resultados do referendo que determinou a saída da União Europeia.

Michael Ryan, o presidente do Independent Film and Television Alliance, disse à revista norte-americana Variety que a votação "dinamitou os nossos alicerces. A partir de hoje não sabemos mais como irão funcionar as nossas relações com co-produtores, financiadores e distribuidores".

Salientando que o setor criativo britânico tem sido um contribuinte forte e enérgico para a economia, concluiu que o Brexit "provavelmente vai ser devastador para nós".

Na base desse estado de espírito está por exemplo a indústria audiovisual provavelmente vir a ser alvo de novos impostos no resto da Europa e a incerteza em relação aos subsídios para os filmes britânicos, que dependem tanto das agências europeias como de Hollywood e dos fundos da lotaria nacional.

Tanto na Grã-Bretanha como nos Estados Unidos, as análises coincidem nestes, mas também noutros pontos.

A consequência imediata será que menos dinheiro vai estar disponível para fazer filmes, apoiar distribuidores e festivais, através do programa Media, que só entre 2014 e 2015 atribuiu ao cinema britânico mais de 40 milhões de euros. Deduções fiscais implementadas por diretivas europeias para incentivar rodagens também ficam em causa.

Se a curto prazo, a desvalorização da libra significa que a rodagem de filmes na Grã-Bretanha ficará mais barata, também significa que adquirir filmes que se pagam em euros e dólares ficará mais caro.

Muitas das distribuidoras que trazem e exibem filmes europeus na Grã-Bretanha também recebem subsídios da União Europeia por isso e normalmente operam com margens de lucro pequenas; o delicado equilíbrio pode ficar em causa se as tarifas aumentarem e as ajudas forem cortadas, fazendo desaparecer os filmes europeus das salas de cinema da ilha que não tenham a visibilidade dos grandes prémios de festivais ou um Óscar de Melhor Filme Estrangeiro.

O mesmo acontecerá na Europa se as produções britânicas deixarem de ser incluídas nas quotas de conteúdo europeu que estão instituídas para as salas de cinema, canais de televisão ou operadores como o Netflix.

Sem essa proteção, o aumento de tarifas e a ausência de subsídios para as salas de cinema na Europa que exibem filmes britânicos, os efeitos numa indústria em que 40% das exportações são para a União Europeia podem levar ao encerramento de produtoras e a perda de muitos empregos.

Os acordos de co-produção com outros países da Europa, e destes com a Grã-Bretanha, também serão mais complicados porque deixam de ser aplicadas as mesmas regras das convenções europeias: após a separação, a burocracia vai agravar-se quando os britânicos tiverem de negociar os termos com cada um dos países envolvidos a partir do zero.

A grande dúvida é se este abrandamento que se antecipa será temporário ou permanente.

Os líderes da indústria temem que o Brexit possa ter um efeito semelhante ao momento nos anos 1970 em que os estúdios de Hollywood decidiram concentrar a sua atividade na Califórnia e praticamente deixaram de existir co-produções com a Grã-Bretanha.

Sem esse apoio e com menos espectadores nas salas e a concorrência da televisão, a produção de filmes britânicos decaiu bruscamente e só um esforço concertado, com a ajuda europeia, permitiu iniciar a recuperação a partir dos anos 1990.