“Jardins Selvagens” estreou na última quinta-feira nas salas de cinema portuguesas. O filme é uma produção britânica independente que conta a história verídica de uma jovem designer paisagística irlandesa que é aceite para concorrer na prestigiada Exposição de Flores de Chelsea.

Mas há um lado muito português na fita: Matilde Ramos Pinto,  jovem portuguesa a viver em Londres, trabalhou como produtora no filme.

O SAPO MAG conversou em exclusivo com Matilde Ramos Pinto, portuguesa que vive na capital britânica desde os 18 anos e que trabalhou neste filme com Jeremy Zimmerman, diretor de casting de filmes como "Comboio Noturno para Lisboa".

Como começou o seu trabalho como produtora em Londres? 

Quando fui para Londres tinha 18 anos. Estava a estudar teatro, queria ser atriz, mas não sabia onde estudar, não conhecia nenhuma atriz em quem me apoiar e não tenho a nacionalidade inglesa. Não fazia sentido competir com atrizes inglesas para papéis ingleses. Um dia escrevi uma carta ao Jeremy Zimmerman (o director de casting do filme "Comboio Noturno para Lisboa")  a pedir para ele me contratar para um filme, (como se funcionasse assim) , e ele convidou-me para trabalhar no escritório dele.

Aos 21 anos comecei a fazer sessões de casting como assistente e foi por essa altura que comecei  a perceber como funciona a indústria. Todas as semanas entravam produtores, eu ouvia o que eles diziam e ia aprendendo. Nunca imaginei que fosse trabalhar como produtora, acho que encontrei o meu papel no mundo do cinema. É uma indústria com muitas pessoas de talento, nomeadamente em Portugal, com quem eu gostaria um dia de trabalhar.

Como produtora, o que mais gosta de fazer? 

Gosto muito de juntar uma equipa criativa e técnica e ver o filme a ser concretizado. Sempre gostei de ver as personagens com quem vivemos em papel e na imaginação a tornarem-se reais e a interagirem em cena. Por exemplo, levámos a atriz principal Emma Greenwell a passar o fim de semana na casa da protagonista real Mary Reynolds, em Dingle,  antes das filmagens. (Dingle é o local onde foi filmado "A Filha de Ryan"). Foi lá que a Emma conheceu a Mary pela a primeira vez, que viu como ela andava, falava, interagia com a natureza e como fazia jardinagem.

Quando começámos a rodagem ninguém suspeitou que a Emma não fosse Irlandesa, tinha aprendido as nuances da voz da Mary. Essa autenticidade encanta-me. Outro prazer secreto que tenho é o guarda-roupa, tínhamos uma figurinista fantástica, a Consolata Boyle, e o estúdio dela era o meu sitio preferido para descomprimir.

Tenho muita sorte pois todos os dias das rodagens são estimulantes, é impossível não o ser quando estão  80 ou 100 pessoas a trabalhar num só projeto, independentemente das complicações que isso implica . Imagino que os músicos numa orquestra sintam o mesmo. Eu gosto de trabalhar assim.

O que mais a fascina no cinema?

O que me fascina no cinema é o que me fez querer entrar neste meio. O cinema tem a possibilidade de nos transportar, educar, de fazer sentir empatia por pessoas que não são do nosso círculo habitual. O cinema consegue transformar as pessoas de uma forma subtil e humana apenas por contar histórias, faz-nos rir e chorar.

Falando agora de "Jardins Selvagens", como ficou a conhecer e esta história? Como surgiu o convite para trabalhar no filme?

Foi uma amiga de Lisboa que conheceu a realizadora e falou-lhe de mim. Inicialmente não era suposto ajudar na produção visto que foi um projeto que já tinha uma produtora Irlandesa e outra Americana, o meu trabalho seria com a realizadora, Vivienne de Courcy, mas as coisas foram-se desenvolvendo. Achei que iria por três meses e depois voltaria  para Londres, mas fui-me apaixonando pela Irlanda e pelo filme e fiquei quase três anos. O convite para trabalhar no filme foi uma decisão de várias pessoas após me terem conhecido. A realizadora e eu entendíamo-nos muito bem e criamos uma boa relação. Tudo aconteceu de uma forma orgânica, creio que foi “right place, right time”.

Nessa altura lia muitos guiões e o que me cativou neste filme foi a sua relevância ecológica, numa estrutura acessível em oposição a relatos de desastres naturais. O filme é um romance com a natureza que nos estimula a olhar para o mundo selvagem como essencial para o nosso bem estar, e não como algo que podemos ou devemos abusar ou domesticar. A Natureza é alguém com quem devemos viver lado a lado.

 Do convite ao trabalho no filme, qual foi o maior desafio?

Este foi a primeira primeira longa metragem que produzi e foi um grande teste de persistência. Trabalhei três anos para a concretizar e a realizadora já estava há seis anos a escrever o guião.  Na verdade os desafios estão sempre a aparecer, há sempre novos e imprevistos e desafios ao virar da esquina, nunca acaba.

Toda a equipa tem de estar sempre atenta, tudo é essencial, o casting, ter uma equipa profissional, focada, feliz e que nunca se esqueça que a visão do filme tem de ser respeitada em cena. A montagem do filme foi particularmente complicada, é a fase onde o entusiasmo das rodagens já acabou e estamos só com uma pequena equipa a juntar as peças. Nesta fase o filme é quase re-escrito, o Pedro Kos, que fez a montagem, foi sensacional, pois consegui que o filme mantivesse a força da história como tinha sido concebida originalmente pela realizadora.

Um dos maior desafios hoje em dia é conseguir que o filme seja visto.

Não sei tão bem como funciona o mercado em Portugal, mas em Londres há cerca de 20 filmes por semana a serem estreados tornando o mercado inglês muito competitivo. Nós tivemos sorte, creio que pela originalidade do filme, conseguimos que ele esteja em cinco continentes este ano.  Mas sinto que os desafios não acabam nunca, houve um produtor que me disse que se for fácil não é bom sinal.

Qual o balanço que faz de todo o trabalho em "Jardins Selvagens"?

Olhando para trás há algumas coisas que faria de forma diferente, mas não sei quem não sente isso com qualquer coisa que faz.

Quais são os ingredientes principais deste filme?

O filme transporta-nos pelos os lugares mais espetaculares da Irlanda e da Etiópia, é uma autentica aventura do início ao fim. Um romance fantástico sobre dois jovens ecologistas, Mary e o Christy Collard.

É para todos, independentemente do sexo e da idade, que querem ir ao cinema e sair da sala entretidos, revitalizados e inspirados. É, na minha opinião, um filme que pode mudar a maneira de vermos e sentimos perante a manutenção do nosso ativo mais valioso, o Meio Ambiente. Traz à luz os problemas e dá-nos soluções concretas com o objetivo de contribuirmos para um mundo melhor.

Veja o trailer do filme:

Veja algumas das imagens do filme "Jardins Selvagens":