Aos 74 anos, este compositor e cantor de sorriso perene não tem a reputação internacional de contemporâneos como Caetano Veloso e Gilberto Gil, mas no Brasil é uma instituição, um dos seus sambistas mais queridos e uma referência incontornável quando se fala sobre a música de raízes africanas.

Sozinho com o seu violão, Paulinho foi responsável pela abertura dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro com a sua delicada interpretação do hino nacional e, com esse mesmo calor e tranquilidade com a qual cantou para milhões, avalia o ritmo mais internacional do Brasil na privacidade da sua casa, numa entrevista à AFP.

"O samba se mantém vivo porque as pessoas não vão deixá-lo morrer", diz em sua sala de estar, de amplas janelas, cercado por vegetação tropical na zona oeste do Rio de Janeiro.

Esse ritmo que surgiu na Bahia e se consolidou na segunda metade do século XIX no Rio com a chegada dos escravos negros do norte do país, foi cultivado como uma expressão clandestina até que em 1916 veio à tona oficialmente, com a gravação na Biblioteca Nacional de "Pelo Telefone", considerado o primeiro samba da história.

Desde aqueles tempos de Pixinguinha, Donga ou Sinhô, considerados os pais do género, o samba sobreviveu a ditaduras, "a dos Beatles e a dos Rolling Stones" e a todos os tipos de estigmas, como quando jovens sambistas como Paulinho - lembra - eram considerados "malandros" e os produtores compravam por alguns tostões os direitos de canções que iriam fazê-los milionários.

Catapultado para o mundo pelo carnaval e as escolas de samba, este género ligado ao DNA brasileiro é mantido vivo todos os dias nas ruas e bares e vai muito além do musical.

"Eu vi muitas vezes ensaios em que se podia sentir que toda aquela manifestação de canções, de sambas bonitos, que às vezes falavam sobre coisas tristes, era uma catarse, uma maneira de dizer: hey, aqui eu domino, aqui em mando em mim", expressa emocionado este mulato alto, de cabelo crespo branco.

Simplificar o ritmo sedutor

Paulinho não tem pressa. Chegou atrasado para a entrevista porque estava a praticar Tai Chi e alonga as suas respostas, sem olhar para o relógio. Em cada reflexão, acaricia as palavras com a sua voz aveludada e transmite paz.

O autor de sambas convertidos em hinos, como o seu tributo à escola de samba Portela "Foi um rio que passou em minha vida", "Timoneiro" ou "Coração leviano", celebra o bom estado do género, que celebra o seu dia mundial a 2 de dezembro.

Ao tentar medir as suas palavras, o músico confessa que está "um pouco preocupado".

O turbilhão do quotidiano, acredita Paulinho, está a contagiar esta música centenária, não só com a multiplicação das escolas de samba pelas exigências do turismo, mas encurtando os samba-enredos dos desfiles e acelerando algo tão essencial como o ritmo, originalmente mais lento.

"Na medida em que esse ritmo se acelera, toda essa composição (de música) vai-se simplificando", explica o compositor, usando como exemplo um pandeiro que deveria tocar cinco batidas e que, por esse ritmo acelerado, agora às vezes toca apenas duas.

"Eu sinto que é um empobrecimento porque elimina uma coisa que você justamente sente que existe na cultura negra, que é o 'batuque', aquela coisa mais sedutora do ponto de vista rítmico", lamenta.

Com 50 anos de carreira nas costas, Paulinho assegura que "o novo é sempre muito importante". "É o mais importante", reafirma.

"Mas também é importante conhecer a nossa história, sabermos como tudo aconteceu, o que os nossos antepassados fizeram para chegar a isso", afirma.

Com o samba aclamado hoje na maior parte do planeta, Paulinho abre um largo sorriso ao pensar sobre o futuro. Ele sonha que uma das primeiras canções de carnaval da sua amada Portela se torne realidade: "O samba dominando o mundo."