Desconhece-se, todavia, o percurso dos portugueses que voluntariamente se alistaram nas fileiras do Exército francês, depois da declaração de guerra de Paris a Berlim, a 3 de setembro de 1939, e combateram as tropas alemãs-nazis, como refere o autor.

“Para além do nome, local e data de nascimento, o historial e o destino desses portugueses esfumou-se, como se nunca tivessem existido enquanto soldados – soldados que morreram em combate, que foram feitos prisioneiros pelos alemães ou que sobrevieram”.

Segundo Barata-Feyo, “os arquivos históricos franceses dão uma lista com o nome de 905 portugueses, alguns dos quais repetidos”. Todavia “foi possível identificar muito mais voluntários em outras fontes documentais”.

Segundo o autor, na secção dos militares mortos durante o conflito mundial, “consta apenas o nome de 89 voluntários portugueses, número que peca muito por defeito”, pois terão sido entre 300 e 400.

Barata-Feyo considera surpreendente o desaparecimento do historial dos militares portugueses que serviram a bandeira tricolor, face à “documentação abundante” que existe sobre os cinco milhões de homens que, em 1940, constituíam as Forças Armadas francesas.

“Nada ou quase nada existe, de fonte oficial, sobre os cerca de dez mil voluntários [portugueses e de outras nacionalidades] que integraram os três ‘Régiments de Marche’ dos Voluntários Estrangeiros” (RMVE), escreve Barata-Feyo.

Esta falta de informação é um “contraste flagrante com toda a documentação disponível sobre os 357 civis, portuguesas e portugueses, que lutaram na resistência, em França, contra a ocupação nazi”. Sobre estes portugueses “foi possível encontrar e aceder aos seus dossiês individuais” no mesmo Serviço Histórico, instalado no Château de Vincennes, em Paris.

Refira-se que José Manuel Barata-Feyo tinha já investigado a participação de portugueses na resistência, tendo publicado em 2019 o livro “A Sombra dos Heróis”, com dados inéditos sobre essa participação.

Num arquivo em Caen, no norte de França, Barata-Feyo encontrou o que poderá ser uma pista para o desaparecimento de certos dados, a destruição pelos militares franceses para que determinadas informações não caíssem nas mãos das tropas nazis.

No arquivo da cidade normanda, foi encontrado um relatório militar de um oficial dos RMVE que dá conta da destruição de documentação a 6 de junho de 1940, quando o regimento se rendeu às tropas invasoras alemãs. Entre os documentos que “o Exército francês não queria que caíssem nas mãos do inimigo” estariam, “talvez, os diários de operações de voluntários”.

Todavia, alerta Barata-Feyo, tal “não justifica o desaparecimento dos processos individuais, o registo feito na altura em que os portugueses se inscreveram como voluntários”. “O processo individual [com a morada e os nomes de familiares e amigos mais próximos, caso morressem em combate] não era um documento militar mais ou menos secreto, como Diário de Operações dos regimentos, nem certamente foi levado para a frente de batalha”, refere o autor.

“Igual opacidade – mas aqui deliberada – manifesta a Legião Estrangeira francesa” que incorporou “pelo menos 125 portugueses”, cujos nomes se conhecem e que engrossaram as fileiras dos 11.º e 12.º Regimentos Estrangeiros de Infantaria e da 13.ª Meia-Brigada.

Aqui qualquer investigação só é possível aos próprios interessados, ou aos seus representantes ou descendentes, caso tenham falecido, segundo a resposta recebida por José Barata-Feyo do Comando da Legião.

No prefácio a “Os Soldados Fantasma”, o militar Rodrigo de Sousa e Castro realça que, apesar das dificuldades da investigação, “o autor dá-nos ‘flashes’ impressivos sobre a condução das operações militares do invasor alemão e dos defensores de França, a natureza e intensidade dos embates, e sobretudo os inúmeros casos de heroísmo protagonizados pelos voluntários, bem como as peripécias operacionais quase inéditas”, destacando a atuação da 9.ª Companhia, “La Nueve”, composta por republicanos espanhóis e dois portugueses que tinham combatido na Guerra Civil de Espanha (1936-1939) que foram dos primeiros combatentes a entrar em Paris, antes da libertação da cidade pela tropas aliadas (Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália, entre outros países).

Quanto aos voluntários portugueses, adianta o autor que “a quase totalidade é oriunda do Algarve e das províncias a norte do Tejo”, não tendo, no entanto, sido possível “definir o percurso individual de todos eles”, sendo porém “muito provável que a esmagadora maioria fosse composta por ‘emigrantes económicos’”, mas também alguns exilados, vindos de Espanha, onde lutaram nas hostes republicanas contra os nacionalistas de Francisco Franco (1892-1975).

O autor verifica que, no início da II Guerra Mundial, viviam em França entre 20.000 e 25.000 portugueses.

Segundo a consulta dos documentos, a maioria dos portugueses que se alistaram tinha entre 25 e 40 anos, havendo alguns mais novos, com 18 e 19 anos, mas também mais velhos, como António da Silva, de 53 anos, enviado para uma Secção de Ajudantes.

Barata-Feyo refere ainda que alguns “foram dos primeiríssimos estrangeiros a voluntariar-se”, como Augusto Afonso da Costa, natural de Montalegre, cuja matrícula de recrutamento é a nº. 866, entre mais de 50.000, ou José de Oliveira, que se alistou em Valence, no sul de França, sete dias depois após a declaração de guerra da França à Alemanha.

Segundo cálculos do autor, “dos mil portugueses alistados no Exército francês terão sobrevivido entre 300 e 400 homens”, cujo rasto procura delinear nesta obra.

José Manuel Barata-Feyo, exilado político em Paris durante a ditadura portuguesa, foi director de Informação da RTP2 e responsável, na década de 1980, pelos programas “Grande Reportagem” - que lançou depois em revista semanal -, “Portugal sem Fim” e “Enviado Especial” da televisão pública. Foi correspondente em França da agência noticiosa portuguesa (ANOP), trabalhou para o International Herald Tribune, o New York Times News Service e a Radio France, e colaborou com o jornal francês Libération.

Como repórter recebeu prémios nacionais e estrangeiros de televisão, como o prémio Frantz Fanon, da Union of National Radio & Television of Africa (URTNA).

É autor dos livros “O Grande Embuste” e a Última Missão”. em 2019, também pelo Clube do Autor, publicou “A sombra dos Heróis – A História Desconhecida dos Resistentes Portugueses que Lutaram contra o Nazismo”.