Em Vilar Formoso, no concelho de Almeida, a televisão espanhola faz parte do dia-a-dia de muitos dos seus habitantes. A constatação não é de estranhar numa vila raiana, onde o intercâmbio entre as duas culturas é visível.

Aqui, a Liga espanhola de futebol é seguida por alguns com o mesmo entusiasmo do que a portuguesa, as touradas transmitidas na televisão espanhola reúnem público nos cafés, joga-se à lotaria "El Gordo", nas redes sociais comenta-se o espaço de debate desportivo "El chiringuito de Jugones". As "Crónicas marcianas", "Verano azul" ou o "El hormiguero" são programas que muitos recordam.

"Desde pequeno que a televisão que vejo foi sempre a espanhola", diz à agência Lusa Carlos Ribeiro, de 45 anos, que começou por ver televisão em castelhano quando em Portugal só havia televisão pública.

Em Espanha, sempre encontrou programas mais agradáveis para os jovens e crianças e o hábito que criou de pequeno manteve-se com a entrada dos privados em Portugal, a partir de 1992.

No entanto, os espanhóis sempre se anteciparam. As privadas Antena 3 e Telecinco arrancaram em 1990 e a Televisão Digital Terrestre (TDT) começou a funcionar em 2000, alargando a sua oferta ao longo dos anos.

"Conseguimos apanhar 30 e tal canais em sinal aberto, com programas variadíssimos: dos touros ao futebol, informativos, desportivos ou regionais", nota o habitante de Vilar Formoso, que considera que a entrada da TDT espanhola "potenciou bastante o consumo de televisão" do país vizinho.

Ainda hoje, em sua casa, a televisão espanhola ganha terreno à portuguesa.

"O tipo de programas que passam é mais apetecível de ver, é mais divertido, mais informativo. Em Portugal, só passam telenovelas [em horário nobre]", sublinha.

António Reinas, radialista em Vilar Formoso, constata que não há uma discrepância "tão grande" entre o que a população do lado de lá da fronteira e o que as gentes da vila raiana consomem.

"Reconhecemo-nos na cultura espanhola", refere, salientando que "toda a gente, de uma forma geral, consome televisão espanhola", pela proximidade, mas também pela atratividade que a cultura do país vizinho tem naquela zona.

Apesar de constatar que o hábito de consumo da televisão espanhola já foi maior do que é hoje, a TDT de Espanha continua a ter impacto e a criar raízes desde cedo, muito por culpa dos dois canais existentes focados em conteúdos infantojuvenis.

No primeiro restaurante depois da fronteira, é quase obrigatório ter o televisor num canal português, por causa dos emigrantes que chegam. No entanto, em casa, o proprietário do estabelecimento, Ricardo Rico, vê programas espanhóis.

"Quando me apanho sozinho em casa, vou sempre espreitar o que está a dar no La Sexta", conta.

As suas filhas cresceram a ver programas infantis em castelhano, mas hoje, já adolescentes, "preferem ver sempre televisão portuguesa".

Para Ricardo Rico, a maior mudança de hábitos de consumo veio com a oferta de pacotes por parte das operadoras de telecomunicações, aumentando a variedade de conteúdos em português.

Em casa de Luísa Antunes, os serões e as horas de almoço são divididas entre os dois idiomas.

A mãe não perde as telenovelas portuguesas, mas os Simpsons dobrados em espanhol são um hábito à hora de almoço, conta a dentista de 33 anos que não precisou de aulas de castelhano para entrar na universidade em Espanha.

"Eu aprendi espanhol a ver desenhos animados", frisa Luísa, que garante que o hábito de ver programas do país vizinho "vai persistir".