É, aliás, clicando na informação legal associada à recolha dos dados dos interessado, que descobrimos que quem os está a recolher é a NOS Lusomundo TV, S.A.. Uma primeira pista a dizer-nos pela mão de quem chega a dita HBO. Ora, a NOS tem já quatro canais de cinema e um de séries pago (TV Cine e TV Séries) e parte de cinco canais de desporto (Sport TV). O MOV, embora exclusivo, tem outros donos.

Eu sei que isto dos conteúdos, do entretenimento, das séries, são coisas de pouco importância para reguladores e afins mas a verdade é que é muita coisa. Sobretudo se lhe somarmos os direitos sobre cinema em que quase todas as "majors" e grande parte do conteúdo independente estão nas mãos da NOS Audiovisuais.

Momento para disclaimer - o meu empregador é o MEO e sou responsável pelo MEO Kanal.

O panorama não é simples, até porque os direitos não são simples. Há direitos para exibição em canal de televisão incluído em pacote por subscrição, há direitos para exibição em canal aberto (RTP, SIC ou TVI), há direitos para gravações automáticas ou não, há direitos para outras plataformas (apps, websites, Playstation, Apple TV e afins) e, no caso dos filmes, há as salas de cinema.

Indo aos modelos de negócio de distribuição específicos para conteúdos específicos, a coisa complica-se um pouco mais. Só um exemplo: a "Guerra dos Tronos", sem dúvida o maior sucesso da HBO dos últimos anos, é distribuída em Portugal pelo SyFy, um canal que é propriedade de uma das divisões da NBC Universal.

A HBO tem a minha idade, não é propriamente coisa de ontem, construiu a pulso o seu sucesso com investimento em conteúdos, alguns deles particularmente inovadores pela qualidade narrativa ou pelo investimento em valores de produção que eram, até aí, do cinema. E também o "Sexo e a Cidade" (sim, ok, inovador por motivos diferentes).

Os irmãos mais novos da HBO aprenderam muito com o mano mais velho e é vê-los a gastar os rios de dinheiro feitos em negócios digitais (e não só) em novos e bons conteúdos. Estou a falar da Amazon (que continua a ignorar olimpicamente o cantinho luso) e da Netflix que vai entrar no nosso mercado em todas as plataformas lá para Outubro. E a HBO lançou também um primo destes mais novos, o HBO Go (vai existir por cá?) - é o chamado mercado "over-the-top", basta juntar internet.

Com a generalização da televisão de acesso pago, o panorama audiovisual português sofreu uma primeira desnatação: os conteúdos internacionais mais valiosos, susceptíveis de atrair audiências mais interessantes para os anunciantes migraram para os canais disponíveis nos vários pacotes de televisão. Nos canais em aberto ficaram concursos, telenovelas e entretenimento barato.

No mesmo movimento, generalizou-se o consumo ilegal, obrigando a um estreitamento dos períodos decorridos nas janelas de lançamento e a inovações como as gravações automáticas, elas próprias fortemente canibalizadoras de outros modelos como o do Video On Demand. "Fear The Walking Dead" estreia simultaneamente nos Estados Unidos e no mercado global no mesmo dia, à mesma hora, na noite de 23 para 24 de Agosto, às 2h30 da manhã em Portugal, no AMC.

Netflix e HBO são pagos por subscrição. Assumindo que vão puxar para si os conteúdos de maior valor em que investem, uma nova desnatação vai acontecer e o mercado da televisão vai ter mais degraus do que nunca. A Amazon, já sabemos, quer é vender sapatos. A nova era de ouro da televisão vai custar-nos mais do que nunca. E a Apple, o que anda a Apple a fazer?