Carregamos memórias de infância a vida toda. De um brinquedo, de uma praia, de um cheiro, de uma tarde ao sol, de uma estação. Sejam fiéis, seja um borrão de acções que já não sabemos situar, são emoções que nos definem para sempre.

Para a realizadora Carla Simón foi o Verão de 1993, que representa no filme autobiográfico candidato espanhol ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro.

No calor catalão, Frida, de seis anos, vive um novo passo na sua vida. Os seus pais faleceram à mercê do vírus da SIDA e a menina é acolhida pela sua nova família adoptiva, onde tio, tia e prima passam a ser pai, mãe e irmã... e todos têm de aprender a lidar com novas emoções e vivências, num ambiente rural e paradisíaco.

Frida passa o Verão a provocar os novos pais e a refugiar-se numa estátua de uma santa escondida na floresta. É egoísta, prepotente, algo calculista, e os avós, que vêm de Barcelona todos os domingos, relembram-lhe constantemente um passado urbano e católico, aumentando a angústia. Não sabendo como lidar com o luto, nem com a alegria pueril da sua nova irmã, tem um acto de ciúme irreflectido que irá deixar todos em sobressalto.

A natureza, as tardes ensolaradas, as galinhas pelo pátio, as aventuras no topo de uma árvore, os banhos e o deitar, são acções contadas com um olhar comovente, longo e improvisado, onde Carla Simón deixa acontecer o esboço da sua memória, procurando definir os sentimentos reprimidos e desatar o nó dos mesmos.

A câmara é objetiva e enquadra o mundo à altura do olhar das duas crianças, criando uma intimidade soberba entre estas e a lente. A observação do lirismo permite-nos estabelecer uma empatia única e viver a disfunção de Frida com grande compaixão e naturalidade.

Mas para tal, nota de relevo também para os atores que interpretam os pais adotivos, Bruna Cusi e David Verdaguer, que são generosos, carinhosos e conseguem criar um local seguro, único e familiar, dando toda a força às nossas duas pequenas estrelas: Laia Artigas como Frida e Paula Robles como Anna.

A cena final é de tal ternura e emoção que cimenta a ideia e a verdadeira essência que Carla Simón procurou alcançar com "Verão 1993": uma família é uma família e devemos valorizar mais estas relações básicas, questionando-as e adaptando-nos a quem nos quer mais e melhor.

"Verão 1993": nos cinemas a 18 de outubro.

Crítica: Daniel Antero

Saiba mais no site Cinemic.

Trailer: