Numa entrevista com Charlie Rose, George Lucas abordou a sua vida e carreira, onde naturalmente "Star Wars" assume uma importância determinante.

Parte da conversa foi ocupada com a decisão de abdicar efetivamente das chaves do controlo criativo do que sempre protegeu e descreve a certa altura como "os seus filhos" ao vender o seu império à Disney por quatro mil milhões de dólares em 2012.

"Decidi vender aos esclavagistas brancos que pegam nestas coisas e...", afirmou antes de rir e optar por não terminar o pensamento, o que não foi suficiente para que a frase incendiária não chamasse a atenção da comunicação social americana.

Em retrospetiva, os quatro mil milhões foram uma autêntica pechincha para a Disney, tendo em conta os lucrativos acordos comerciais em redor de "O Despertar da Força", que em menos de duas semanas também se tornou um dos filmes mais rentáveis da história do cinema, mas, tanto mais que já deu quase tudo para obras de caridade, claramente não é a questão monetária que está por detrás do tom revelado por Lucas.

Embora tenha estado presente na antestreia mundial de "O Despertar da Força" e adiantado que "gostou" do resultado, durante meses o criador de Star Wars" optou sempre por um tom de distanciamento, deixando claro que a Disney decidiu não aproveitar as suas ideias e que este não era o filme que teria feito.

Esse foi precisamente um dos temas abordados com Charlie Rose e as respostas revelaram os sentimentos contraditórios que ainda o acompanham.

"Eles [Disney] olharam para as histórias  e disseram 'Queremos fazer algo para os fãs'. Decidiram que não queriam usar aquelas histórias, que iam fazer a sua própria coisa. (...) De qualquer forma, eles não estavam assim tão interessados em me ver envolvido", afirmou, antes de reconhecer que isso seria complicado.

"Apenas iria causar problemas porque eles não vão fazer o que eu quero que façam.  E não tenho mais o controlo para fazer isso e tudo o que eu ia fazer era estragar tudo. E portanto disse 'OK, vou para o meu lado e vou deixá-los ir para o seu.'"

"E acaba por ser uma simples regra da vida que é: quando se separa de alguém, a primeira regra é não fazer telefonemas; a segunda regra é não ir a casa deles e passar lá perto para ver o que estão a fazer; a terceira é não aparecer no café ou noutros sítios [que frequentam]. Tem de se dizer 'Não, foi-se, passou à história, tenho de seguir em frente'. Porque, e aprendemos todos por experiência, sempre que se faz isso  está-se a abrir a ferida outra vez e apenas torna tudo mais difícil para nós. É preciso deixar isso para trás e é muito difícil. Muito, muito difícil. Mas é preciso cortar-se e dizer que acabou, tenho de seguir em frente. E tudo no nosso corpo diz-nos não, que não podemos. E são os meus filhos [os filmes "Star Wars"]. São os meus filhos. Adoro-os, criei-os, estou muito intimamente envolvido neles..."

E foi quando Charlie Rose acrescentou "E vendeu-os" que surgiu a frase que revela todo um estado de alma.

"Sim, vendi-os aos esclavagistas brancos que pegam nestas coisas e... [risos]".

Quando o jornalista insistiu na questão da dor "por se tratar da sua família, a sua história", George Lucas recuperou o discurso oficial da altura da venda.

"No final sabia que havia mais histórias. E sabia que, para o fazer bem, levaria 10 anos. E tenho 70. Não sei se estarei aqui aos 80. A cada 10 anos diminuem as probabilidades. E não estava preparado, queria fazer estas outras coisas [filmes pequenos e pessoais, de natureza experimental]. Portanto, tinha de tomar a decisão por mim de que era a altura de seguir em frente. Não foi uma questão de mos tirarem."

Logo a seguir, novo sinal de distanciamento da abordagem da Disney e, consequentemente, do realizador J.J. Abrams.

"Eles queriam fazer um filme retro [nostálgico]. Não gosto disso. [Em] cada filme trabalho bastante para o tornar completamente diferente, com planetas e naves diferentes, torná-lo novo", antes de insistir que está em paz com a decisão, ainda que reconhecendo que ficou numa situação em que tem de viver com isso e os comentários das pessoas.

"É como se falassem de um divórcio: é esquisito nas não doloroso."