“Um filho adoptivo do proletariado”, disse de si mesmo Alvaro Cunhal. E disse bem. Filho de mãe austera, muito católica e conservadora de quem herdou o caracter e de um pai advogado, progressista, com ideias socialistas, “um homem bom” de quem herdou as convicções, muito cedo procurou o comunismo, muito cedo o encontrou. Os seus heróis? Um colectivo, a grandiosa revolução russa que fez tremer e mudar o mundo. Outro individual, o generoso e grande dirigente comunista Bento Gonçalves.“
Em nenhum outro politico português se condensa melhor a história do Portugal que recusava Salazar” escreveu José Pacheco Pereira. Em nenhum outro português nos terríveis tempos do século XX se encontra um homem com tanta coragem para defender aquilo que acredita, digo eu. Coragem é a palavra justa para definir o jovem Cunhal que aos vinte anos já era um homem. E tantos anos na clandestinidade e tantos anos na prisão! Isolado, espancado e torturado nunca disse nada, nunca cedeu. Escreveu textos notáveis. Leiam, ou melhor ouçam “a superioridade moral dos comunistas”, “se fores preso camarada” ou a tese de formatura que, sob prisão, foi defender perante um júri fascista, “o direito ao aborto das mulheres trabalhadoras”. E excertos dos seus vários livros, romances e contos escritos sob pseudónimo Manuel Tiago, muitas vezes auto-biográficos. E dizer também, que em tempos mais calmos, o jovem Cunhal foi o teórico, formador e agitador do movimento neo-realista. Encontrar o modo certo de filmar o percurso de um jovem complexo e corajoso foi tão difícil como fascinante. Para mim não há documentários nem ficções, há cinema. E o cinema pode nestes tempos de perigos e ameaças ajudar as pessoas a serem mais corajosas e mais humanas.