A HISTÓRIA: Paul Atreides, um jovem brilhante e talentoso com um grande destino para além da sua compreensão, tem de viajar para o planeta mais perigoso do universo para garantir o futuro da sua família e do seu povo. Quando forças malévolas entram em conflito para obter uma quantidade exclusiva do recurso mais precioso do planeta – uma substância capaz de desbloquear o maior potencial da humanidade – apenas os que conquistam os seus medos conseguirão sobreviver.

"Dune – Duna": nos cinemas a partir de 21 de outubro.


Crítica: Daniel Antero

É sabida a complexidade desta obra tremenda de Frank Herbert chamada "Duna", que vive de conflitos tribais e ambientais, ideias de transcendência e religião, profecia e política, a uma densidade tão profunda como os túneis das suas "sandworms". É uma extravagância espacial sobre impérios feudais que lutam pelo controlo da especiaria Mélange. E é também a jornada de um herói, Paul Atreides, um herdeiro que tanto representa o conceito de homem como o do Messias.

Alejandro Jodorowsky tentou adaptá-la ao grande ecrã com um dos maiores devaneios financeiros alguma vez projetados para o cinema: um filme que contaria com Pink Floyd, Marlon Brando, Salvador Dali, H.R. Giger ou Mick Jagger, mas que não teve aposta nem fundos e foi arrumado num "storyboard" que se tornou uma bíblia em Hollywood de onde "Alien" e "Star Wars" muito beneficiaram. E, claro, David Lynch ainda filmou uma versão em 1984 à qual não chamou sua e ainda hoje vai dividindo gostos e opiniões.

Por tudo isto, acreditar que este universo teria espaço num filme de duas horas e meia é estar a pedir uma grande dose de frustração. Foi o que Denis Villeneuve (de "O Primeiro Encontro" e "Blade Runner 2049") percebeu e, disposto a enfrentar os maus presságios, avançou para a sua adaptação solene, épica e ambiciosa, onde perfurou o livro de Herbert e arou as linhas narrativas que um "blockbuster" mais precisa. Este não é um filme para os puristas de "Dune", mas irá atrair para o livro os que não conhecem a história.

Co-escrito por Villeneuve com Eric Roth e Jon Spaihts, "Dune – Duna" respira, medita e transcende-se nos ritos cerimoniais e na gravidade dos diálogos. Duas horas e meia com um imponente elenco de atores, arquitetura futurista, CGI monumental, e mesmo que as maquinações políticas do argumento se percam, este filme quer-nos atingir com o peso de um monólito.

Para isso muito contribui a banda sonora de Hans Zimmer, que agora recorre aos drones de gaita de foles para aumentar a atmosfera draconiana do diretor de fotografia Greig Fraser. São características majestosas que adornam os sublimes efeitos visuais, onde os fatos dos vários exércitos, os meios de transporte, os desertos e as casas são intrincados e repletos de detalhes. Para quem leu "Duna", a imaginação e a emoção irão convergir.

Claro está que todo este arrojo visual, com tempo para ser apreciado, existe em detrimento da densidade milenar deste mundo interestelar. Temos pouco tempo para compreender os Fremen liderados por Stilgar (Javier Bardem), que com os seus "thumpers" (dispositivos que provocam vibrações rítmicas na areia) chamam o poderoso verme Shai Hulud; a física levitacional do peçonhento vilão Baron Harkonnen (Stellan Skarsgård em modo Coronel Kurtz do espaço) e o seu capanga Beast Rabban (Dave Bautista); os poderes da ordem matriarcal das Bene Gesserit, liderada pela Reverenda Madre Mohiam (Charlotte Rampling); ou mesmo a razão de ser dos Mentats (Stephen McKinley Henderson e David Dastmalchian). Ilustres como Jason Momoa ou Josh Brolin também por cá andam, mas pouco espaço têm e a sua figura de celebridade até acaba mais por distrair do que cativar.

Esta adaptação foca-se na casa Atreides e no seu líder Duque Leto (poderoso Oscar Isaac), a concubina Lady Jessica (Rebecca Ferguson dá a melhor interpretação no meio desta constelação) e no seu filho Paul Atreides (o melancólico e sempre igual a si mesmo Timothée Chalamet), em busca do seu lugar na governação planetária, que se expande fisicamente e mentalmente pelo medo, coragem, alucinações e previsões.

O desequilíbrio no foco sente-se mais no terceiro ato, quando o ritmo hipnótico e o perigo cinético abrandam e nos defraudam, para dar espaço ao clímax individual do nosso herói. Aqui falta-nos suporte, vida e mundo que expliquem e nos engajem com a senda de Paul e a sua importância messiânica.

Mas como Chani (Zendaya) diz a Paul no final: “Isto é só o início”. Aguardemos a segunda parte, com a conclusão desta "space opera" mais lenta do que muitos esperariam, mas com a cadência de um "thumper", pacientemente ritmada, forte e hipnótica, que queremos que chame também um monstro cinematográfico.