Morreu Michael Cimino, o realizador do lendário filme "O Caçador", o grande triunfador dos Óscares de 1978. Tinha 77 anos.
A informação foi dada este sábado por Thierry Fremaux , diretor do Festival de Cannes, através do Twitter, onde deu conta que "morreu em paz, acompanhado pelos amigos e pelas duas mulheres que o amaram. Nós também o amámos".
Distinguido com cinco Óscares (Filme, Realização, Ator Secundário, Montagem e Som), "O Caçador", uma reflexão sobre o trágico impacto da guerra do Vietname em quem nela participou, mas também a ferida que deixou nas suas famílias, é um dos mais controversos e aclamados títulos do cinema norte-americano, causando grande impacto noutros filmes e na cultura popular, principalmente a cena da roleta russa.
No elenco estavam Robert De Niro, Christopher Walken (o vencedor do Óscar) e Meryl Streep, que iniciava aqui verdadeiramente a sua carreira imparável.
Para Michael Cimino, este era apenas o segundo filme enquanto realizador, depois de começar como argumentista com "O Cosmonauta Perdido" em 1971 e "Harry - O Detective em Acção", a sequela de "Dirty Harry", dois anos mais tarde.
Foi Clint Eastwood que, impressionado, lhe deu a oportunidade de se estrear atrás das câmaras com "A Última Golpada" em 1974, que valeu a Jeff Bridges uma nomeação para os Óscares.
Após este percurso meteórico, o sucesso de "O Caçador", quando tinha 39 anos, deu-lhe carta branca para avançar com o que quisesse em Hollywood.
O seu projeto seria sobre a história pouco conhecida, e menos gloriosa, da conquista do Oeste americano: "As Portas do Céu", com Kris Kristofferson, Christopher Walken, Isabelle Huppert, Jeff Bridges e muitos outros, que teve 11 meses de rodagem com os custos a escalarem por causa do perfeccionismo de Cimino.
Na mitologia de Hollywood, foi este filme que conduziu à falência da United Artists, ainda que na verdade o estúdio tenha sido vendido pela Transamerica Corporation não tanto pelo prejuízo financeiro (custou 44 milhões de dólares, que hoje seriam 126, e rendeu menos de 3,5), mas pela enorme publicidade negativa.
No entanto, o fracasso ajudou a apressar o fim de um período extravagante em que os realizadores tiveram grande poder dentro da indústria, quando uma nova geração de realizadores (William Friedkin, Francis Ford Coppola, Martin Scorsese, George Lucas, Steven Spielberg, Peter Bogdanovich), que surgiu após os sucessos de "Bonnie e Clyde", "A Primeira Noite" (1967) e "Easy Rider" (1969), trabalhou com orçamentos generosos e pouca interferência dos estúdios, uma "política de autor" que contribuiu para o período criativo mais rico do cinema americano.
"As Portas do Céu", arrasado pela crítica na época e mutilado para duas horas e meia, tem vindo a ser reavaliado de forma muito mais favorável e após ser restaurado para 216 minutos. Thierry Fremaux afirmou mesmo que devia não visto "não apenas como um filme a merecer melhor reputação, mas como uma das obras-primas do cinema mundial".
Mas Michael Cimino ficou com a carreira destruída e nos poucos projetos que concretizou a seguir, nunca reencontrou o sucesso comercial ou lhe foi reconhecida a genialidade dos seus primeiros trabalhos.
Em 1985, regressou com "O Ano do Dragão", protagonizado por Mickey Rourke, que causou nova polémica pela forma como era retratada a comunidade chinesa. Foi outro fracasso comercial, mas o filme tem os seus defensores.
Para esquecer são "O Siciliano" em 1987, uma adaptação de um romance de Mario Puzo que tinha como protagonista Christopher Lambert, e uma encomenda, "Noite do Desespero", de 1990, com Anthony Hopkins e Michey Rourke, nova versão de "Horas de Desespero" com Humphrey Bogart (1955).
Em 2007, dirigiu uma das curtas (três minutos) de "Cada Um o Seu Cinema", o projeto que comemorava o 60º festival de Cannes, mas o último filme foi o discreto "Espírito do Sol", em 1996, onde o rapto de um médico oncologista (Woody Harrelson) por parte de um doente terminal (Jon Seda) era o pretexto para novo olhar espiritual sobre a América.
Esteve ainda ligado a dezenas de projetos que acabaram por ir parar às mãos de outros realizadores ("Footloose", "Iniciação ao Crime", "Nascido a 4 de Julho") ou não avançaram, incluindo um sobre a viagem marítima e a descoberta do Brasil por Pedro Álvares Cabral.
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