A HISTÓRIA: A história da cineasta síria que filmou durante cinco anos a sua vida na cidade de Alepo. Waad al-Kateab ficou na cidade para lutar por uma Síria livre, enquanto documentava a terrível violência que a cercava, apaixonou-se, casou-se e teve uma filha. Uma profunda história de horror e esperança.


Incrivelmente derrotado para o Óscar de Melhor Documentário, "Para Sama" é um grito que se ergue da penumbra que as bombas levantam.

O documentário é uma carta apaixonada, de sobrevivência vital dos valores de resiliência e liberdade, dirigida à bebé Sama, nascida em Aleppo, cidade síria brutalmente destruída e esgotada num cerco desumano.

A sua mãe é a realizadora Waad Al-Kateab, que capturou os crimes hediondos da guerra num registo sangrento e visceral, algo que irá angustiar e fazer parar o batimento cardíaco enquanto ouvimos o silvo de um míssil ou aguardamos pelo choro de uma criança.

O pai é Hamza, médico ativista, que com o apoio da equipa incansável, ergue hospitais no meio dos destroços, longe dos mapas territoriais, invisíveis ao regime de Assad. Aqui é o centro onde caiem as consequências das atrocidades da guerra.

No conforto hipócrita do nosso cadeirão, no escuro do cinema, não há nada que nos prepare para esta agonia e horror: sangue bolçado ao chão, que por ali fica estagnado; membros destruídos em corpos moribundos; o desespero de mães que carregam filhos mortos no colo.

De câmara em punho, Waad não se impõe limites, não se demarca da violência e segue todos os momentos de aflição e terror pelas ruas de Aleppo e os corredores de hospitais. A sua mensagem é de esperança e a balança pende sempre para a crença e confiança num apoio internacional, que nunca chegou. Esse foi o seu propósito, com 500 horas de imagens capturadas durante seis anos, muitas delas publicadas nas redes sociais.

Mas destas ruínas humanas erguem-se monumentos de coragem e perseverança. A seriedade dos incríveis médicos que mantêm a sua compostura, impedindo que as fraquezas e os sentimentos sejam abalados pelo que vêem, enquanto agem e rezam para que a próxima bomba não os atinja; ou as famílias que se recusam a sair, acreditando que estão a dar o melhor exemplo aos filhos, encontrando alegria nas canções comoventes ou num diospiro maduro.

São vinhetas de realidade quotidiana que nos comovem e nos fazem torcer pelo melhor, quando vemos a família em fuga e uma luz ao fundo que anuncia o último "checkpoint" territorial libertador.

"Para Sama" é um filme fortíssimo e chocante, mas que graças à narrativa poética de Waad, assume e inspira-nos a deixar um futuro melhor para Sama.

"Para Sama": nos cinemas a 5 de março.

Crítica: Daniel Antero