A Audiência Nacional, que tem jurisdição em toda a Espanha, com sede em Madrid, emitiu o mandado de captura nacional e internacional contra José Miguel Arenas Beltrán, mais conhecido como Valtonyc. A entidade atendeu ao pedido da Procuradoria, que advertiu que o cantor teria fugido do país. Segundo os jornais locais, o artista estaria na Bélgica.
Condenado a três anos e meio de prisão por enaltecimento do terrorismo, injúrias à Coroa e ameaças, uma pena confirmada em fevereiro pelo Supremo Tribunal, o rapper, pouco conhecido até esse episódio, tinha até à passada quinta-feira para se entregar.
Na semana passada, o músico já havia anunciado, pelo Twitter, a sua intenção de "desobedecer".
"Amanhã vão bater à porta da minha casa para me meterem na prisão. Por umas canções. Amanhã Espanha vai fazer um papelão, mais uma vez. Não vai ser assim tão fácil, desobedecer é legítimo", afirmou o rapper, que chamou o Estado espanhol de "fascista".
Perante o suposto exílio voluntário, Valtonyc recebeu o apoio do ex-presidente separatista catalão Carles Puigdemont. No Twitter, afirmou que essa "decisão difícil a nível pessoal" era necessária para "continuar a defender valores e liberdades fundamentais, sem os quais não há democracia".
Instalado na Bélgica após a frustrada declaração de independência na Catalunha de 27 de outubro, Puigdemont espera atualmente na Alemanha para saber se será extraditado para Espanha.
Suposto apoio à ETA
Nas suas canções com mensagens políticas de extrema esquerda, Valtonyc promove o assassinato de membros do governo, da família real e de partidos conservadores. Num concerto recente, convocou a multidão a matar "um agente da guarda civil".
"Que tenham medo como um guarda civil no Euskadi (País Basco)", "ETA é uma grande nação", ou "o Rei tem um encontro na praça do povo, uma corda no pescoço e que caia sobre ele o peso da lei" são algumas das linhas das canções do rapper em catalão.
A Justiça considerou que as mensagens representam, entre outros pontos, uma apologia da organização separatista basca ETA, dissolvida este mês e que, em 40 anos de luta armada, deixou mais de 850 mortos.
A lei antiterrorista espanhola, que pune o crime de enaltecimento do terrorismo e o de injúria à Coroa, tem sido alvo de uma polémica cada vez maior.
Nos últimos meses, vários internautas, ou artistas, foram condenados por essas acusações, como o rapper Pablo Hasel, sentenciado em março passado a dois anos de prisão por várias declarações no Twitter e por uma canção.
Essas penas deflagraram uma onda de críticas, incluindo as da Amnistia Internacional, que afirmou que a lei espanhola está a ser usada para "reprimir expressões de caráter político" nas redes sociais.
O ator espanhol Javier Bardem juntou-se ao debate na terça-feira, perante um ato de apoio a um ator citado judicialmente por blasfémia por escrever "estou-me a cagar para Deus" e "no dogma da 'santidade e virgindade da Virgem Maria'".
Bardem considerou que a perseguição judicial de opiniões pode fazer o país retroceder até a "época do franquismo", em referência à ditadura de Francisco Franco (1939-1975).
Outras vozes defendem, porém, que a liberdade de expressão tem limites.
"Não é a permissão para dizer qualquer coisa que se queira e esconder-se nisso para dizer que é a minha opinião", comentou, em conversa com a AFP, Antonio Torres del Moral, especialista em Direito Constitucional.
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