A banda traz-nos uma versão contemporânea do cante alentejano e promete chegar ao público mais jovem. O SAPO On The Hop esteve à conversa com o grupo sobre as suas origens e o seu primeiro álbum.

SAPO On The Hop: Como surgiu o vosso gosto pelo cante alentejano?

Jorge Roque (J): Nós nascemos e fomos criados no Alentejo e, portanto, comecei a ouvir o cante desde muito novo. Depois, aos 8 anos comecei a cantar.

Herlander Medinas (H): A minha história é parecida com a do Jorge. Cresci nesse meio e portanto sempre ouvi o cante alentejano nas tascas, quando ia chamar o meu pai para jantar. Por volta dos 15 anos, integrei o grupo de canto de Reguengos, de onde sou natural e tudo começou a partir daí.

Pedro Zagalo (P): Eu vivi em Elvas, e lá não há muito essa tradição. No entanto, como músico e como Alentejano é um estilo a que sou sensível e é com muito orgulho que avancei com este projeto.

Como é que o projeto Monda surgiu? Já se conheciam?

J: Nós já nos conhecemos há seis anos.

P: Nós já há uns anos que trabalhamos juntos. Começámos por trabalhar num disco que o Jorge tinha a solo, eu fazia a direção musical e era o pianista, o Herlander era o contrabaixista. Portanto, já havia aqui um cruzamento musical e, também, uma forte amizade.

Dizem que vocês estão a tentar (re)inventar o Cante Alentejano. Esse é um dos vossos objetivos?

J: (Re)inventar é um termo muito forte. Já nos têm sugerido isso mas nós temos sempre o cuidado de dizer que não queremos (re)inventar nada porque isto está mais que inventado. Queremos dar o nosso cunho, a nossa identidade musical e trazê-lo um bocadinho para outras linguagens que podem chegar até a um público mais jovem. Não querendo substituir nada, nem querendo descurar nunca a parte tradicional do cante, pois essa irá manter-se. Podemos diferenciá-las, talvez, dar-lhe outra roupagem e outra forma de ser cantado mas é muito ambicioso e arriscado dizer que queremos (re)inventar o cante. Queremos, sim, fazer o nosso caminho mais contemporâneo.

O que é que está na origem do nome do vosso grupo e, por sua vez, do primeiro álbum, “Monda”?

J: Bem, monda, para quem não sabe, é uma expressão alentejana que significa “tirar as ervas daninhas”, fazer uma nova sementeira. Ou seja, para fazer uma nova sementeira temos de tirar o que está em excesso e deixar o essencial. Por acaso nós, na altura, tínhamos dois ou três nomes mas achámos piada a isto e, depois de sondarmos alguns amigos, foi este que ficou. Para nós fazia todo o sentido e estava relacionado com a música que estávamos a criar. Por isso, chamamos Monda à banda, ao álbum, a um vinho que estamos a criar, não sei se os nossos próximos serão Monda, mas é melhor não irmos por aí! (risos)

H: Joaquim Monda, por exemplo!

Para o vosso álbum, contaram com a participação de vários artistas de renome. Como foi trabalhar com eles?

J: Contámos com muitos músicos e muitos artistas, alguns deles de renome internacional, como o caso da Katia e o do Rui Veloso. Primeiro, foi um privilégio ter trabalhado e gravado com dois nomes da música portuguesa. E depois, foi uma honra para nós, já que somos daquela geração que cresceu a ouvir Rui Veloso. E ppodermos fazer o primeiro disco com dois nomes como estes é um orgulho enorme. Mas também tivemos participações como a do Tiago Oliveira, que é um guitarrista e fundador dos Pólo Norte, o Mário Caeiro, o João Ferreira, o Pedro Vidal, os Cantadores de Portel. Tenho sempre medo de me esquecer de algum, mas tivemos um lote de amigos que nos ajudaram a fazer este primeiro disto e para nós foi um privilégio enorme.

Há uma maneira muito específica para cantar o cante alentejano. Durante a troca de experiências com esses artistas, foi necessário ensinar-lhes algumas dicas sobre o cante?

(risos)

P: Não. Porque quando eles os integramos neste trabalho, não queríamos ter um Rui Veloso a cantar à alentejano, nós queríamos ter um Rui Veloso e uma Katia Guerreiro como eles são naturalmente. Queríamos o seu cunho, muito especial, sobre a musica. Até porque não é fácil e não é ali, com duas ou três dicas, que se consegue colocar uma pessoa a cantar alentejano.

A meu ver, acho que é bastante complicado...

H: Eu acho que não se consegue! (risos)

J: É um bocadinho naquela: não é fadista quem quer, é fadista quem nasce. E, neste caso, é exatamente a mesma coisa. Por mais que a pessoa tenha uma excelente voz e uma técnica vocal enorme, nem toda a gente consegue cantar fado ou o cante alentejano. Acho que tem de haver uma aprendizagem desde pequenos.

O cante tornou-se Património Imaterial da Humanidade. O vosso objetivo é levá-lo além-fronteiras, tal como aconteceu com o fado?

J: Sim, porque não? O nosso objetivo é levar o cante até onde for possível. Para já, a nossa função enquanto músicos é essa mesmo, levar a música para que outros a oiçam e, nesse sentido, não há fronteiras. Acho que não devemos marcar nenhum território como sendo o limite ou a meta da nossa expressão musical. Acho que devemos deixar as pessoas ouvir. Acho que já fazem, neste momento, transmissões para a lua ou para marte, pode ser uma sugestão para a NASA.

H: Há um alentejano em todo o lado, pode ser que esteja lá um também! (risos)

O que esperam com o lançamento do vosso primeiro álbum?

H: Esperamos isso mesmo, que a nossa música chegue a todo o mundo. E vamos onde nos quiserem levar!

J: Hum… não é bem assim. (risos) Não… vamos ver até onde o público nos pode levar.

E se calhar, como já disseram, chegar a um público mais jovem.

J: Sim, ainda no outro dia comentámos isso mesmo. Porque não, termos um palco num festival com músicas do Alentejo? Se vêm tipos de todo o mundo cantar no Sudoeste, por exemplo, porque não um palco para dar a conhecer a música que é feita em Portugal, que é nossa, que é nacional e que faz tanto furor lá fora?

Utilizem apenas uma palavra para caracterizar um alentejano e outra para caracterizar um lisboeta.

(risos)

J: Essa vou deixar para o Herlander!

H: Epá… é difícil! Vocês são de Lisboa? (risos)

J: Mas eu vou-te dizer! O alentejano, por norma, é um tipo desconfiado. A desconfiança é uma coisa que ainda perdura no Alentejo. Mas depois é uma coisa que se apaga e a pessoa acaba por ficar muito amiga do seu amigo.

P: São pessoas que gostam de partilhar.

J: Mas não consigo definir uma palavra para um lisboeta…

H: hospitaleiro?

J: Um lisboeta?!

H: Sim…?

J: não! A palavra para um alentejano é “verdadeiro”. Os lisboetas são… “apressados”!

Stressados…

J: Sim, stressados!

P: Eu teria que ter um conhecimento mais profundo sobre o tema. (risos)

Fotos: Carina Sousa