Bong Joon-ho diz que o seu novo filme, agora nos cinemas portugueses, destaca a resiliência das pessoas vulgares contra os poderosos numa época de autoritarismo crescente tanto tanto a nível nacional como no exterior.

Protagonizado pelo ator britânico Robert Pattinson na personagem do título, "Mickey 17" conta a história de um jovem voluntário num programa de clonagem futurista que lhe permite morrer repetidamente.

Mickey suporta exposição à radiação, inala gases venenosos e é submetido a injeções experimentais de vacinas, apenas para renascer através de uma impressora 3D humana.

"Mickey é um jovem vulnerável e um tanto insignificante, mas, apesar dos muitos desafios que enfrenta, acaba por sobreviver sem ser vergado", disse o realizador, que triunfou nos Óscares com "Parasitas" (2019).

"Essa é a história que queria contar", disse numa conferência de imprensa em Seul há duas semanas.

Rodagem de "Mickey 17": Bong Joon-ho com Robert Pattinson

Enquanto "Parasitas" atingia os moradores mais abastados da capital da Coreia do Sul, o vilão neste filme — interpretado por Mark Ruffalo, nomeado no ano passado para os Óscares por “Pobres Criaturas” — é um multimilionário narcisista que lembra tanto o presidente dos EUA Donald Trump quanto o assessor chegado Elon Musk, o homem mais rico do mundo.

Situado num futuro próximo (2054), a personagem de Ruffalo — um político racista e fracassado — embarca numa jornada espacial para colonizar um planeta gelado.

Enfrentando dificuldades financeiras, Mickey inscreve-se para ser "dispensável" — e é encarregado do trabalho mais perigoso na nave espacial.

O papel marca a primeira interpretação de Ruffalo de um vilão, e Bong disse que ficou surpreendido que tivesse sido uma estreia.

"Ao longo da história, os ditadores não foram apenas figuras aterrorizantes, mas também possuíam um estranho charme... que cativa as massas", disse.

"Estava confiante que Ruffalo retrataria bem esta personagem", continuou.

O filme foi rodado em 2022, antes do regresso de Trump à Casa Branca.

"Não queríamos que fosse ninguém em particular e queríamos que fosse toda a gente", disse Ruffalo sobre o seu multimilionário, que descreveu como egoísta e frágil.

"Vimos este tipo de líder repetidamente ao longo do último século."

As pessoa podem superar

Mas com o regresso de Trump e o caos que veio com ele, Ruffalo reconheceu que "Mickey 17" tem uma certa qualidade de "oráculo".

"Três anos depois, este filme é agora mais relevante do que era durante a rodagem", disse.

Bong fez história com "Parasitas" ao tornar-se o primeiro realizador a ganhar o Óscar de Melhor Filme por uma produção que não era em inglês.

E embora esse filme lidasse com grandes tópicos como desigualdade e pobreza, Bong disse que deixa a "análise do capitalismo" para os sociólogos.

"O propósito do filme é partilhar as emoções dos humanos" envolvidos nessa análise, explicou.

Ainda com Naomi Ackie (“Star Wars: Episódio IX”) e os nomeados aos Óscares Steven Yeun ("Minari", “Nope”) e Toni Collette ("O Sexto Sentido", "Hereditário"), "Mickey 17" surge numa altura em que o país de Bong está nas garras de uma crise política após a declaração de lei marcial do presidente Yoon Suk Yeol em dezembro.

Na conferência de imprensa, o realizador disse que acreditava que a força do povo tinha ajudado "superar" esse caos.

"Música, filmes e a vida quotidiana continuam sem interrupção", apontou.

"Acredito que isto reflete um momento de orgulho para os nossos cidadãos, que já superaram a lei marcial."

VEJA O TRAILER.