Bruce Willis faz 68 anos este domingo, protegido pela família e amigos dos olhares mais indiscretos.

Recentemente, a sua esposa pediu aos paparazzi para não o incomodarem durante as suas raras raras aparições públicas desde que colocou um ponto final na sua carreira no final de março de 2022, quando foi anunciado que sofria de afasia, um distúrbio da comunicação adquirido que interfere na capacidade de processamento da linguagem, sem afetar a inteligência, cuja causa mais comum é um acidente vascular cerebral.

Já em fevereiro deste ano, a família anunciou um diagnóstico oficial de demência frontotemporal (ou DFT). Antigamente conhecida como doença de Pick, caracteriza-se por um conjunto de distúrbios que atingem partes específicas do cérebro, os lobos frontais e temporais, que não tem tratamento nem cura, que leva a mudanças dramáticas de personalidade, indiferença emocional, ações impulsivas e incapacidade de se comunicar adequadamente.

Assalto ao Arranha-Céus (1988)

Nascido em 1955 na Alemanha, onde o seu pai conheceu a futura esposa quando fazia o serviço militar, a fase de grande glória na carreira de Bruce Willis foram de 1997 a 2000, quando foram lançados "O 5º Elemento", "Armageddon", "O Sexto Sentido" e "O Protegido", em que bastava o seu nome para dar luz verde a um projeto.

Por essa altura também chegaram os menos conseguidos "O Chacal", "Nome de Código: Mercúrio", "Uma Vida a Dois", "Um Homem Influente" ou "Nunca É Tarde".

Ou seja, a carreira, tão emocionante como os seus filmes, foi de extremos, de onde podiam surgir títulos como o clássico "Assalto ao Arranha-Céus" (1988) como um muito menos clássico "Die Hard: Nunca é Bom Dia para Morrer" (2013).

O que não mudava, ou raramente, era a imagem que se lhe colou à pele: fosse polícia, militar, mafioso ou corrupto, Bruce Willis, estrela de cinema, era um sedutor brincalhão e sarcástico. E duro.

Apesar do seu indiscutível carisma, a carreira no cinema esteve quase para acabar antes de começar.

Após várias peças teatrais e presenças não creditadas em alguns filmes ("O Primeiro Pecado Mortal", "O Príncipe da Cidade", "O Veredicto"), bateu três mil candidatos para o papel de David Addison na série "Modelo e Detective" (1985–89), onde entre as histórias de comédia e drama, se destacava uma explosiva química com Cybill Shepherd.

A popularidade foi meteórica e Hollywood rapidamente lhe prestou atenção, mas "Encontro Inesquecível" (1987) e "Hollywood 1929" (1988), ambos realizados pelo lendário realizador de comédia Blake Edwards, foram grandes fracassos de bilheteira. De repente, parecia que o seu nicho seria mesmo o pequeno ecrã.

Foi à terceira que se deu o clique, quando foi escolhido para um filme de ação chamado "Die" Hard", de John McTiernan (1988), ou "Assalto ao Arranha-Céus" em Portugal.

O detetive nova iorquino John MacLane, em Los Angeles de visita à esposa, tornou-se a sua segunda pele e regressou para as sequelas "Assalto ao Aeroporto" (1990), "Die Hard: A Vingança" (1995), "Die Hard 4.0 - Viver ou Morrer" (2007) e "Die Hard: Nunca é Bom Dia para Morrer" (2013). Só "A Vingança" se aproximou da magia do original, sem dúvida por também ser realizado por John McTiernan.

Por esta altura, já era casado com Demi Moore desde 1987, uma relação tumultuosa que terminou em 2000 e de que surgiram três filhas, incluindo a atriz Rumer Willis.

Bons momentos como "A Fúria do Último Escuteiro" (1991), "A Morte Fica-vos Tão Bem" (1992), "Pulp Fiction" (1994), "Vidas Simples" (1994) e "12 Macacos" (1995) antecederam a melhor fase artística, mas foram intercalados com trabalhos que o próprio reconheceu publicamente que eram péssimos, como "A Fogueira das Vaidades" (1990), "Hudson Hawk - O Falcão Ataca de Novo" (1991), "Zona de Impacto" (1993) ou "A Cor da Noite" (1994).

UMA CARREIRA EM IMAGENS.

Após o auge artístico com o realizador M. Night Shyamalan em "O Sexto Sentido (1999) e "O Protegido" (2000), Bruce Willis não parou de trabalhar, a brincar com a imagem nas comédias "Falsas Aparências" (2000 e 2004), ou usando-a a sério em "Em Defesa da Honra" (2002) ou "Operação Especial" (2003).

Após "Sin City: Cidade do Pecado" (2005), continuou a trabalhar muito, ainda que vários filmes fossem lançados diretamente em vídeo sem passarem pelas salas de cinema. E irregular como sempre: se um "Fogo Contra Fogo" (2012) ou "Catch.44 Tiro Certeiro" (2011) faziam pensar que a sua melhor fase já tinha passado e estava em "piloto automático" só a trabalhar pelo cheque, surgiam logo a seguir títulos de qualidade como "Looper - Reflexo Assassino" (2012) ou "Moonrise Kingdom" (2012), ou mesmo as comédias "Red: Perigosos" (2010 e 2013), em bom plano ao lado de Morgan Freeman, John Malkovich, Mary-Louise Parker e Helen Mirren.

Meio a brincar, meio a sério, tornou-se popular nesta altura a teoria de que se podia perceber quando Bruce Willis estava mesmo interessado no que estava a fazer e a mostrar o seu talento: as personagens tinham cabelo.

"Confuso" e "perdido": saúde preocupava colegas dos seus últimos filmes

Deadlock: Sem Saída (2021)

Em 2019, Bruce Willis regressou ao sistema dos estúdios de Hollywood para um reencontro com M. Night Shyamalan e o ator Samuel L. Jackson em "Glass", a sequela tanto de "O Protegido" como de "Fragmentado" (2016), uma ligação que era estabelecida coma sua presença nos instantes finais deste filme.

Por esta altura, aumentava a participação em produções de baixo orçamento destinados principalmente ao mercado de vídeo, principalmente para duas produtoras. E a 7 de fevereiro de 2022, fez história nos Razzies, os "Óscares para os piores", ao ter direito a uma categoria exclusiva que evidenciava a sua prolificidade: "Pior interpretação de Bruce Willis num filme de 2021".

"Cosmic Sin" ganhou o "prémio" e estavam ainda na corrida os filmes "American Siege", "Apex", "Deadlock", "Fortress", "Meia-Noite em Switchgrass", "Sem Hora Marcada" e "Survive the Game", mas as personagens representavam toda uma carreira: ex-polícia, xerife, militar aposentado, ex-espião, etc.

Após o anúncio da reforma artística no fim de março, o prémio e as nomeações foram retiradas do currículo.

O seu estado de saúde preocupava muitos dos que trabalharam com ele, à frente e atrás das câmaras: quase duas dúzias de pessoas disseram ao jornal Los Angeles Times que eram evidentes os sinais de declínio e tinham questionado se estava totalmente lúcido sobre o que se passava à sua volta durante as rodagens.

Vários realizadores dos 22 filmes produzidos entre 2020 e 2022 "descreveram cenas de partir o coração com a adorada estrela de 'Pulp Fiction' a lutar com a perda de capacidades cognitivas e incapacidade de se recordar dos diálogos".

Algumas das soluções encontradas para contornar estas situações foram a utilização de auriculares para lhe transmitir os diálogos, cortes nas páginas dos argumentos para reduzir a sua participação e cortar monólogos, concentrar o trabalho em poucos dias e horas, e rodar perto do local onde vivia.

Segundo o jornal, o trabalho nesta fase era limitado a dois dias, pelos quais muitas vezes recebia dois milhões de dólares. E apesar do contrato estipular oito horas, normalmente trabalhava apenas metade, com a maioria das cenas de ação em que era previsto aparecer feitas com duplos, o que disfarçava os poucos minutos em que realmente aparecia em cada filme.

Os realizadores também tinham de filmar o mais depressa possível, mesmo quando era evidente o seu estado de confusão.

"Não era tanto uma contrariedade, mas mais algo do género 'Como é que não fazemos o Bruce parecer mal?'. Alguém dava-lhe um diálogo e ele não percebia o que queria dizer. Estava apenas a ser uma marioneta", acrescentava uma das pessoas envolvidas.

Apesar do declínio, o envolvimento do ator, mesmo por alguns minutos, ajudava a vender os filmes de baixo orçamento no mercado internacional: o seu rosto no poster era suficiente para chamar a atenções dos espectadores que navegavam pelos menus das plataformas de streaming.

Desconfortáveis com o agravamento do estado de saúde e as condições de trabalho, alguns realizadores recusaram repetir a experiência.

Um deles foi Jesse V. Johnson, um duplo que recordou a experiência do reencontro muitos anos mais tarde, agora como realizador: "Era evidente que não era o Bruce que eu recordava. Após a nossa experiência em 'White Elephant', foi decidido como equipa que não faríamos outro. Somos todos fãs do Bruce Willis e a combinação parecia errada e, em última análise, um final bastante triste para uma carreira incrível, com o qual nenhum de nós se sentia confortável”.

Um dos últimos filmes acabou por ser "Paradise City”, filmado no Havai e com John Travolta no elenco: uma mini-reunião "Pulp Fiction".

"Ele estava entusiasmado por trabalhar com John Travolta e podia-se ver que ainda lá estava o velho charme de Bruce Willis. Ele realmente deu o seu melhor e garantimos que ele e John tivessem uma ótima experiência filmando juntos", contava o realizador Chuck Russell.

Essa é a imagem que continua bem viva nos seus melhores filmes.