A paixão por Chaplin: Apesar da vertente intelectual e hermética muitas vezes associada à obra de
Manoel de Oliveira, o cineasta portuense já afirmou diversas que o realizador que mais profundamente amou terá sido aquele que porventura mais sucesso comercial e popular teve em toda a história do cinema:
Charlie Chaplin. Oliveira nasceu em 1908, portanto viu na respetiva época toda a obra de Charlot, que arrancou em 1914, e já disse que em novo gostaria de ter sido ator de comédia. Não será por acaso que na participação que faz em
«Viagem a Lisboa», de
Wim Wenders, Oliveira imita precisamente o pequeno vagabundo.

Um ás do volante: Na década de 30, Oliveira foi um nome razoavelmente popular como piloto de automóveis, tendo vencido, por exemplo, o Circuito Internacional do Estoril em 1937 num Ford V8. Foi essa celebridade que lhe valeu a contratação para o papel de Carlos, o amigo de
Vasco Santana no incontornável
«A Canção de Lisboa» (1933), já que se considerava que ele poderia atrair ao filme espetadores do norte do país.

Um estreia pateada: A estreia do primeiro filme de Manoel de Oliveira, a curta-metragem documental
«Douro, Faina Fluvial», deu-se em setembro de 1931, no decorrer do I Congresso Internacional da Crítica, organizado por António Ferro. Reza a história que o filme foi recebido com uma pateada tão monumental que um estrangeiro de visita a Lisboa terá perguntado se era assim que se aplaudia no nosso país.

O fundador do neo-realismo: Oliveira podia ter sido considerado internacionalmente o fundador do neo-realismo caso tivesse conseguido terminar
«Aniki-Bobó» a tempo de o enviar ao Festival de Veneza de 1942. No ano seguinte,
«Ossessione», de
Luchino Visconti, marcaria nesse certame o início da corrente neo-realista no cinema, embora o filme de Oliveira já tivesse, um ano antes, as marcas desse estilo, nomeadamente a rodagem em cenários reais e não em estúdio, com atores não profissionais e com histórias urbanas passadas entre as classes mais desvalidas.

O caso Duarte de Almeida:
João Bénard da Costa, um intenso defensor da obra de Manoel de Oliveira, tornou-se presença recorrente na obra do mestre portuense enquanto ator a partir de 1972 em
«O Passado e o Presente». Sempre usando o pseudónimo Duarte de Almeida, o falecido diretor da Cinemateca foi tendo sempre participações nas fitas do realizador, sendo a última no segmento mais divertido do filme coletivo
«Cada um o seu Cinema», de 2007, em que interpretava o Papa João XXIII.

A origem do chavão dos «filmes lentos e intermináveis»: Foi a imensa polémica gerada pela transmissão televisiva na RTP em 1978 de
«Amor de Perdição» que colou a Oliveira uma imagem de que ele nunca mais se conseguiu livrar: a de que os seus filmes são sempre longuíssimos e absolutamente monótonos. Se a segunda classificação variará consoante o grau de sintonia do espetador com a narrativa do realizador, a primeira é absolutamente injusta, uma vez que o realizador raramente faz filmes com mais de 90 minutos. «Amor de Perdição» foi filmado em simultâneo como filme e série de televisão e o primeiro contacto que todos tiveram com ele foi precisamente através do pequeno ecrã, em que as virtudes do filme eram abafadas por uma exibição com a formatação errada e ainda a preto e branco. Só o sucesso no estrangeiro o viria depois a reabilitar no nosso país.

A origem da dupla Oliveira-Branco: A parceria entre Manoel de Oliveira e Paulo Branco arrancou precisamente com «Amor de Perdição», quando o segundo, ainda programador de uma sala de cinema em Paris, a Action Republique, projetou o filme em 1979 e o lançou na senda do sucesso internacional. Entre
«Francisca» (1981) e
«O Quinto Império - Ontem Como Hoje» (2004), Branco produziu 20 longas-metragens de Oliveira, cerca de uma por ano, uma produtividade que ninguém imaginava para um cineasta que toda a vida encontrara entraves para filmar e num país com crónica dificuldade de produção continuada.

O filme póstumo: Em 1982, Oliveira rodou
«Visitas ou Memórias e Confissões» que por sua vontade explícita só poderá ser mostrado publicamente após a sua morte. O cineasta tinha então 74 anos, tivera até aí uma produção muito intervalada e todos pensavam que a sua carreira não demoraria muito a terminar. Afinal, a partir daí, quando todos os outros começam a abrandar, o cineasta disparou numa produção imparável, assinado mais 24 longas-metragens e uma série de outros projetos, numa bulimia criativa que não tem paralelo com qualquer outro realizador da história a partir dos 80 anos.

Um dos melhores da Cahiers du Cinema:
«O Estranho Caso de Angélica» foi o segundo melhor filme de 2011 para a «Cahiers do Cinema», só precedido de
«Habemus Papam - Temos Papa», de
Nanni Moretti, e empatado com
«A Árvore da Vida», de
Terrence Malick. Porém, não foi a primeira vez que a revista colocou Oliveira entre os 10 melhores do ano. Em 1981,
«Francisca» foi considerado o Melhor Filme do ano, em 1989
«Os Canibais» ficou na quinta posição, que o realizador manteve no ano seguinte com
«Non ou a Vã Glória de Mandar». Em 1993, Oliveira ascendeu à segunda posição da lista com
«Vale Abraão», e em 1998
«Inquietude» valeu-lhe o quinto lugar. Em 1999,
«A Carta» ficou em sétimo lugar e em 2001 Oliveira voltou a conquistar o quinto lugar com
«Vou para Casa», repetindo o feito e a posição em 2002 com
«O Princípio da Incerteza», e em 2009 com
«Singularidades de uma Rapariga Loura».

O próximo filme: A película que se segue na carreira de Oliveira já está rodada e está atualmente em fase de pós-produção. Chama-se
«O Gebo e a Sombra», é uma adaptação de uma peça de Raúl Brandão e nele voltou a trabalhar com
Michel Piccoli,
Leonor Silveira e o seu neto
Ricardo Trêpa. Trata-se do primeiro filme do cineasta produzido pela O Som e a Fúria, e deverá chegar às nossas salas em 2012, após estrear num dos três maiores festivais internacionais de cinema: Cannes, Veneza ou Berlim.