Bertrand Tavernier, um dos mais eminentes realizadores do cinema francês, faleceu esta quinta-feira (25), anunciou o Instituto Lumière em Lyon, que ele dirigia. Tinha 79 anos.

Um entusiasta sem limites pela literatura, jazz, blues e cinema, artista ativista com obra eclética e reconhecida fora do seu país, dirigiu filmes de época e contemporâneos, com predileção por temas sociais. Escrevia os seus próprios argumentos sobre enredos policiais, políticos, históricos, de aventura, guerra...

Além de "À Volta da Meia-Noite" (1986), um dos melhores retratos do cinema centrado no jazz, é incontornável a colaboração artística com o ator Philippe Noiret, que incluiu esse filme, mas que começou com a sua primeira longa-metragem "O Relojoeiro" (1974), a que se seguiram "Vamos a Isto Que É Festa" (1975), "O Juiz e o Assassino" (1976), "Uma Semana de Férias" (1980), "Justiceiro por Conta Própria" (1981) e "La vie et rien d'autre" (1989).

Em tom menor, o último trabalho da dupla foi "A Filha de D'Artagnan" (1994), cuja rodagem passou por Portugal.

"Justiceiro por Conta Própria" (1981)

Tavernier deixa uma filmografia produzida a partir do sentimento, em guerra contra as injustiças, o racismo, as drogas e o desemprego. Mimava a narração e as personagens, os mesmos que a corrente cinematográfica da "Nouvelle Vague" rejeitava.

O seu objetivo era "explorar e introduzir-se nas épocas e universos através de personagens" com destinos complicados.

"E não ficar aborrecido, é uma questão de cortesia!", afirmava o realizador, que descrevia o "prazer físico" que sentia ao estar num estúdio e dirigir os atores.

Entre a comédia e o crime andou com outros trabalhos importantes como "A Morte em Directo" (1980), "Um Domingo no Campo" (1984), "Daddy Nostalgie" (1990), "L.627" (1992), "L'appât" (1995), "Capitão Conan" (1996), "Ça commence aujourd'hui" (1999), "Laissez-passer" (2002), "A Princesa de Montpensier" (2010) e "Palácio das Necessidades" (2013).

Os seus filmes foram amplamente nomeados e premiados pelos festivais e organizações de cinema: "Justiceiro por Conta Própria" concorreu para o Óscar então conhecido como Melhor Filme Estrangeiro; "Um Domingo no Campo" valeu-lhe o Prémio de Realização em Cannes; "La vie et rien d'autre" recebeu o BAFTA da Academia de Cinema britânica para Filme Estrangeiro; "L'appât" foi Urso de Ouro em Berlim; e Veneza atribuiu-lhe um Leão de Ouro pelo conjunto da obra (2015).

Era também um grande cinéfilo, dedicado à preservação e transmissão de filmes, movido tanto pelo desejo de defender o cinema independente francês como pela paixão pelo cinema americano do século XX.

Esse amor refletiu-se em vários livros e nos seus excecionais últimos trabalhos: "Uma Viagem Pelo Cinema Francês com Bertrand Tavernier" (2016) e a série de dez episódios "Voyage à travers le cinéma français" (2017-2018).

Um amante do "western"

Bertrand Tavernier nasceu em 25 de abril de 1941 em Lyon.

Filho do escritor e combatente da resistência René Tavernier, descobriu o cinema durante uma estadia num sanatório. Ao mudar-se para Paris, fundou com alguns amigos o cineclube NickelOdéon e colaborou nos anos 1960 para várias revistas.

Foi assessor de imprensa de filmes de Jean-Luc Godard e Claude Chabrol, entre outros, e em 1970 escreveu um livro que se tornou uma referência no assunto: "30 ans de cinéma américain" [30 anos do cinema americano]. Também publicou entrevistas com grandes autores de Hollywood.

Tavernier dizia que tornara realizador "devido à admiração pelos westerns".

Dentro e fora das suas produções, militou em diferentes questões: contra a censura, contra a tortura durante a guerra da Argélia, a favor dos imigrantes indocumentados, a favor de resgatar alguns realizadores do esquecimento etc.

"Não me sinto mais cansado agora do que quando comecei", afirmou em 2016, ao apresentar o documentário "Uma Viagem Pelo Cinema Francês com Bertrand Tavernier", uma história muito pessoal da Sétima Arte que produziu após ter visto centenas de filmes.

Com a argumentista Colo Tavernier (de quem se divorciou e faleceu em 2020), teve dois filhos: Nils, ator e realizadores, e Tiffany, escritora. Com ela filmou "Holy Lola" (2004) sobre a adoção no Camboja.

Voltou casar-se em 2005 com a argumentista Sarah Thibau.

* Atualizado às 18h43 com mais informação biográfica e declarações.

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