«Feral» é um dos filmes que mais tem dado que falar este ano em Portugal durante o período de nomeações aos Óscares. Nomeado na categoria de Melhor Curta-Metragem de Animação, é realizado por Daniel Sousa, um português de origem cabo-verdiana, que viveu em Portugal até aos 16 anos, rumando depois aos EUA onde hoje vive como animador independente e professor. O filme, sobre um menino selvagem, é americano mas o cineasta mantém bem vivas as raízes nacionais, regressando ao país todos os anos para visitar a família.
Mas é um facto que Portugal e os Óscares têm andado sempre de costas viradas. Não tanto por vontade do nosso país, que anualmente submete um filme à nomeação ao troféu de Melhor Filme Estrangeiro, até à data sem qualquer sucesso, além das curtas-metragens de animação que vão tentando fazer o seu caminho (em 2006, por exemplo,
«História Trágica com Final Feliz», de
Regina Pessoa, esteve na «short-list» de 10 filmes nomeáveis, mas não chegou à lista final).
Mas a verdade é que a Academia já premiou talentos lusos.
Carlos de Mattos é o principal, tendo sido distinguido duas vezes pela Academia de Artes e Ciências de Cinematográficas de Hollywood com certificados especiais, naquelas cerimónias dedicadas aos galardões técnicos de que são apenas apresentados excertos durante a cerimónia de entrega de prémios que vemos anualmente.
Carlos de Mattos nasceu em Luanda em 1952 e foi viver para os EUA aos 18 anos, desenvolvendo aí actividade importante na área tecnológica. Recebeu o primeiro «Technical Achievement Award» em 1983, em parceria com Con Tresfons, Adriaan De Rooy e Ed Phillips pela criação e concretização da Tulip Crane, uma grua utilizada em filmes como
«E.T. O Extraterrestre».
Em 1986 recebeu um «Scientific and Engineering Award», em parceria com Ernest F. Nettman e Ed Phillips, pela criação de uma câmara de controle remoto utilizada em filmes como
«África Minha» e
«Cotton Club».
Já o célebre dramaturgo
Christopher Hampton, apesar de ser visto por todos como britânico, nasceu na verdade na ilha do Faial, no arquipélago dos Açores, mudando-se muito novo para o Reino Unido onde faria carreira, sem qualquer ligação ao país de origem. Enquanto argumentista ele ganhou o Óscar de Melhor Argumento Adaptado por
«Ligações Perigosas» em 1989 e foi nomeado ao mesmo troféu por
«Expiação» em 2008.
Mas Carlos de Mattos e Christopher Hampton fizeram praticamente toda a sua vida e carreira fora de Portugal. Haverá algum português sequer nomeado com carreira relevante no nosso país? Há apenas um: o diretor de fotografia
Eduardo Serra.
Ele nunca ganhou mas já foi nomeado duas vezes para o Óscar, pelo seu trabalho em
«As Asas do Amor» (1997) e
«Rapariga com Brinco de Pérola» (2003). Em Portugal, assinou a fotografia de filmes tão importantes como
«Sem Sombra de Pecado» e
«A Mulher do Próximo», de
José Fonseca e Costa,
«O Processo do Rei», de
João Mário Grilo,
«Amor e Dedinhos de Pé», de
Luis Filipe Rocha, e
«O Delfim», de
Fernando Lopes.
Mas mesmo em filmes norte-americanos, Portugal esteve presente.
O caso emblemático é o do filme
«Lobos do Mar», de
Victor Fleming, pelo qual o incontornável
Spencer Tracy ganhou o primeiro Óscar de Melhor Ator ao interpretar o pescador português Manuel (na imagem), em que até tentava, de forma algo sofrível, cantar algumas canções em português.
E não esquecer que o documentário
«Portugal», integrado na popular série de documentários «People & Places» que a Disney produziu na década de 50, foi nomeado em 1958 ao Óscar de Melhor Curta-Metragem Documental de Imagem Real.
A língua portuguesa, claro, esteve presente em algumas nomeações de filmes brasileiros, nomeadamente nas designações em várias categorias dos recentes
«Cidade de Deus» e
«Central do Brasil».
Porém, o único filme falado na língua de Camões a receber um Óscar foi o belíssimo
«Orfeu Negro», em 1960, realizado em Terras de Vera Cruz pelo francês Marcel Camus. É uma co-produção entre a França, o Brasil e a Itália, que adapta a peça «Orfeu da Conceição», de Vinicius de Moraes, com música de António Carlos Jobim e Luis Bonfá. O filme foi um enorme êxito internacional, ganhando também a Palma de Ouro do Festival de Cannes.
Mais recentemente, claro, em 1994, o filme espanhol
«Belle Époque», rodado em grande parte no nosso país, conquistou o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, com Portugal a merecer uma palavra de agradecimento no discurso do realizador do filme,
Fernando Trueba.
Finalmente, sem ser falado em português mas adaptado de uma obra fundamental da literatura nacional da autoria de Eça de Queiroz, distinguiu-se
«O Crime do Padre Amaro», nomeado ao Óscar de Melhor Filme de Língua Não Inglesa em 2003 pelo México.
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