Bong Joon-ho, o cineasta vencedor dos Óscares por "Parasitas", e outras estrelas da Coreia do Sul pediram uma investigação na sexta-feira (12) sobre a conduta da polícia e da imprensa nos dias que antecederam a morte do ator Lee Sun-kyun.

Lee, mais conhecido mundialmente pelo seu papel no filme de Bong, de 2019, foi encontrado morto num carro em Seul no mês passado, após uma investigação policial de dois meses sobre suspeita de consumo de drogas.

Lee Sun-kyun: ator de "Parasitas" encontrado morto em parque de Seul
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Após a sua morte, a polícia foi acusada de divulgar detalhes confidenciais da sua investigação, desencadeando uma cobertura frenética dos meios de comunicação social e uma enxurrada de conteúdos prejudiciais nas redes sociais no YouTube e noutros locais.

"Pedimos uma investigação completa por parte das autoridades para determinar se houve alguma falha na segurança de investigação da polícia", disse Bong na sexta-feira durante uma conferência de imprensa com a presença de outros cineastas sul-coreanos e figuras da indústria.

Ele acrescentou que as autoridades também deveriam examinar "se alguma divulgação não autorizada" teve origem de polícias envolvidos na investigação sobre Lee, comunicando indevidamente com a imprensa.

Bong estava a ler uma declaração assinada por cerca de 30 organizações da emergente indústria do entretenimento da Coreia do Sul, incluindo festivais de cinema, sindicatos de atores e a associação local de argumentistas.

O ator Kim Eui-sung, que também esteve no evento de imprensa na sexta-feira, disse que a morte de Lee Sun-kyun aconteceu por causa de um "assassinato social".

“Espero que tais tragédias nunca se repitam na investigação dos artistas da cultura pop”, disse.

Lee Sun-kyun com Cho Yeo-jeong em 'Parasitas'

Outrora celebrado pela sua imagem saudável e uma das maiores estrelas do país, a reputação de Lee Sun-kyun sofreu um impacto significativo quando a notícia da investigação policial sobre drogas se tornou pública em outubro.

Ele foi rapidamente removido de projetos de televisão, cinema e publicidade, incorrendo em prejuízos estimados pela imprensa em até dez mil milhões de won (sete milhões de euros).

Desde então, os peritos deploraram a falta de presunção de inocência, que criou uma atmosfera pouco saudável, através da cobertura sensacionalista do caso, alimentada pela difusão de elementos da investigação.

Bong Joon-ho e outros apelaram a uma legislação reforçada para proteger melhor os artistas e os profissionais da indústria, e apelaram aos meios da comunicação social a melhorarem no futuro.

Eles destacaram especificamente o canal nacional da Coreia do Sul KBS pela sua cobertura do caso. Em novembro, o canal divulgou gravações de áudio alegadamente de conversas telefónicas privadas de Lee Sun-kyun.

"Pode a KBS garantir [...] que a sua cobertura das conversas privadas dos falecidos, não relacionadas com as alegações, foi apenas para o direito de informação?" disse o comunicado conjunto.

“Pedimos a todos os meios de comunicação, incluindo a KBS, que removam imediatamente qualquer conteúdo que não esteja alinhado com o propósito de jornalismo responsável”, acrescenta.

Rodeado por jornalistas, Lee Sun-kyun à chegada à esquadra para ser interrogado a 23 de dezembro

Lee Sun-kyun testou negativo a drogas duas vezes durante as investigações da polícia e num teste de laboratório em novembro, segundo a agência de notícias Yonhap.

Ele também participou em três longas sessões de interrogatório policial, com a última a começar a 23 de dezembro e com a duração de 19 horas. O seu corpo foi encontrado em 27 de dezembro.

O chefe da Polícia Metropolitana de Incheon, Kim Hui-jung, disse no mês passado que “todo o processo de investigação” foi realizado “de acordo com os procedimentos legais” e que não ocorreram fugas de imprensa.

A Coreia do Sul tem leis sobre drogas extremamente rigorosas e a opinião pública normalmente apoia as investigações policiais sobre o uso ilegal e critica as pessoas que violam a lei.

Mas desde a morte de Lee, têm sido muitas as críticas ao tratamento dado pela polícia e pela imprensa à falecida estrela.

“Não existia a necessidade de nomear o suspeito nesta investigação”, disse no final de dezembro Vladimir Tikhonov, professor de estudos coreanos na Universidade de Oslo, à France-Presse.

“Na Coreia do Sul, a um nível muito mais elevado do que em qualquer país europeu que seja mais tolerante com o uso de drogas psicotrópicas, ser suspeito num caso de drogas equivale a uma punição em si, com ostracismo público”, explicou.

É um “assassinato social”, criticou Yu Hyun-jae, professor de comunicação da Universidade Sogang, em Seul, que apontou a responsabilidade partilhada dos meios de comunicação, da polícia e do público, na “enorme humilhação” que o ator teve de suportar.