A HISTÓRIA: Depois de sobreviver milagrosamente, o mercenário australiano de operações secretas Rake regressa com outra missão letal: libertar da prisão a família de um impiedoso gangster georgiano.

"Tyler Rake: Operação de Resgate 2": disponível na Netflix a partir de 16 de junho.


Crítica: Francisco Quintas

Em 2014, o cinema de ação americano alcançou novos ares graças a “John Wick”, protagonizado pelo acarinhado Keanu Reeves. Além da história simples e a distinta criação de universo, um dos fatores de sucesso foi ter sido concebido por Chad Stahelski, antigo duplo e coreógrafo de duplos que se estreava na cadeira de realizador.

A longa experiência com produções de ação em Hollywood permitiu-lhe, em certa medida, recriar a identidade do género. Uma feliz consequência, sentida até hoje, é a maior exigência por parte do público, que já se tinha cansado da câmara "tremida", dos rápidos cortes e da confusão audiovisual de tantos outros filmes.

A conciliação entre lutas "mano-a-mano" e a própria linguagem cinematográfica, que depositou confiança em planos sequência abertos e efeitos práticos, convenceu os estúdios a apostar em projetos dos especialistas em “stunts”.

Da mesma fornada, permitiu a credibilização de David Leitch, realizador de “Deadpool 2” (2018), dos irmãos Joe e Anthony Russo, de “Capitão América: O Soldado do Inverno” (2014) e, mais recentemente, Sam Hargrave, de “Tyler Rake: Operação de Resgate” (2020).

Original da Netflix e protagonizado por Chris Hemsworth, o filme de 2020 contou uma história com semelhantes veias emocionais às de “John Wick”: uma personagem principal reservada e introspetiva, motivada por laivos de um passado doloroso e armada até aos dentes, regressa da reforma para deixar um rasto de corpos.

Baseado na banda desenhada “Ciudad”, do americano Ande Parks, o filme não demonstrou vontade em ser mais do que era, num terreno saturado de violência extrema, personagens com motivações descomplicadas e sequências de ação de excelência técnica.

No que toca a espetáculo, por sua vez, o novo "Tyler Rake: Operação de Resgate 2" cumpre o que promete e mais além. Se o primeiro filme orquestrava um combate labiríntico em Bombaim com 12 minutos, a sequela exibe um plano sequência de 21 minutos, uma fuga de uma prisão em pleno motim e debaixo de fogo. Mesmo que seja de lamentar breves vislumbres de efeitos visuais que ficaram por refinar, a ilusão de um 'take' único é rigorosa e, como é óbvio, a coordenação de duplos e câmara é monumental e impecável.

No entanto, no que toca em alargar o universo e aprofundar as personagens, esta é uma oportunidade perdida.

A presença calorosa da iraniana Golshifteh Farahani continua desaproveitada e na tentativa de manter uma personagem infantojuvenil carismática, Andro Japaridze revel-se um ator muito "verde". Já o vilão é, não obstante uma motivação credível, mais uma vez, de uma nota só, tanto pelo guião de Joe Russo, como pela prestação do georgiano Tornike Gogrichiani. E para uma participação tão irrelevante, o anunciado Idris Elba foi uma escolha gratuita, já a pensar no próximo filme.

No papel do mercenário, Chris Hemsworth, sem surpresa, continua bastante empenhado e mostra-se um ator mais do que pronto para personagens diferentes das típicas acrobacias dos filmes da Marvel. E vale a pena dizer, tanto ao ator australiano como ao realizador Sam Hargrave, que ainda se vai a tempo de, fortalecendo e superando a qualidade dos confrontos, tiros, encontrões, facadas e perseguições, vincar as necessidades dramáticas destas histórias. Os filmes de ação deveriam ambicionar ser mais do que uniformes de combate...