Palco Principal – Desde sempre pautou a sua carreira de forma dissidente, tendo em conta aquilo que se entende como o perfil do fadista. Pisou o palco pela primeira vez no estrangeiro (na Holanda) e conseguiu, como poucos, crescer com o Fado. Esta coletânea reflete todo esse percurso ou serve como um qualquer ponto de viragem?
Cristina Branco - A antologia reflete simplesmente o caminho, desde os primórdios envergonhados até uma interpretação mais consistente.
PP – É sabido que fazer um “melhor de…” é tarefa complicada. Como surgiu a ideia para a criação de “Idealist” e qual o critério para chegar a estas quase seis dezenas de canções?
CB - Sim, foi complicado. Devo dizer que a ideia não partiu de mim - foi a editora que o sugeriu, numa primeira instância. Aliás, dificilmente me imaginava a realizar esta tarefa tão cedo, sendo que, na verdade, já lá vão 13 discos! O critério foi intuitivo e, mais do que outra coisa, um exercício de memória. Foram os temas eleitos do público e os que me marcaram por esta ou aquela razão, pessoal, profissional. Costumo dizer que os meus discos refletem a minha evolução como indivíduo, dão-me sempre a antevisão do momento seguinte.
PP – Depois de ouvirmos os três discos de “Idealist” (“Fado”, “Poemas” e “Ideal”), sentimos a complexidade da sua obra, assim como o seu lado eclético. Em que território é que a Cristina Branco se sente “melhor”? Enquanto recria clássicos fadistas, como “Gaivota” ou “Trago um fado nos sentidos”, quando interpreta temas como “A case of you” ou “Construção”, ou quanto canta originais seus?
CB - Se não me sentisse confortável em todos esses territórios, seriam experiências falhadas por esta ou aquela razão. A verdade é que a minha voz habita facilmente vários espaços no mapa da música. Eu sou todos eles, porque os interiorizo antes de cantar e dou-lhes um cunho muito pessoal. Claro que os originais não têm passado, foram feitos para mim e tudo o que lhes imprima é novo e, logo, um desafio ainda maior.
PP – Sendo que a grande maioria dos temas de “Idealist” são Fado, como fazer coexistir a canção portuguesa por excelência com outras peças cantadas em francês, inglês ou castelhano? Deixa-se de ser “fadista” ao cantar numa língua que não o português?
CB - Acredito que sim. Ser fadista é estado de alma, diz-se. Não renego essa também minha condição, mas não creio que, quando me atiro a outros géneros musicais, a expressão fadista coexista. Fecho os olhos e vou buscar a minha orelha eclética, curiosa.
PP – Tem por hábito afirmar que é uma mulher privilegiada, pois sempre “cantou o que quis cantar”. Depois de 17 anos de carreira, 13 discos lançados e muitos concertos dados ainda sente esse privilégio? É uma idealista por natureza?
CB - Tenho esse privilégio e outros, como partilhar o palco e os discos sempre com grandes músicos! Idealista já fui mais, apesar de, na música, ainda ter algumas reservas de convicção!
PP – Para além dos muitos temas já anteriormente editados, “Idealist” traz três surpresas: os inéditos “Fado de partilha”, “Se fores, não chores por mim” e “Na rua do silêncio” - dois originais e uma reinterpretação. Qual a razão da sua inclusão nesta coletânea?
CB - Porque pedi para regravar alguns dos temas mais antigos, mas pouco depois percebi que não seria justo para com o público (isso surgirá em palco apenas), e a proposta passou a ser de criar novas músicas. Foi muito justo e muito mais estimulante! Assim percebemos todos que o caminho continua!
PP – O Fado é, hoje, um género com enorme aceitação e são muitos os novos e bons intérpretes que têm surgido ultimamente. Como encara esta “nova geração” de fadistas?
CB - Têm uma grande vontade e um desprendimento do passado que lhes permite ousar e ainda assim defender o bastião! Com eles, também chegou um público jovem, seja pela nova atitude, seja pela qualidade, seja pela curiosidade que veio de fora e entrou de rompante, mostrando a todos, finalmente, que se podem orgulhar de algumas coisas que se fazem em português e para portugueses. Bem hajam!
PP – Para promover “Idealist” tem agendados dezenas de concertos em países como Israel, Rússia, Bélgica, Holanda, Alemanha, Espanha, Suécia, França…e Portugal. O que a motivou a colocar o concerto marcado para o dia 11 de dezembro no CCB – único agendado para terras lusas – como última data?
CB - Foi mero acaso e fruto de um encontro de agendas entre o CCB e nós. Além disso, como há ainda alguma liberdade de movimentos, resolvemos considerar a construção de uma pequena tour à volta dessa data.
Texto: Carlos Eugénio Augusto
Comentários