"É curioso, é um álbum de versões, mas é o meu álbum mais pessoal", diz a cantora em entrevista à AFP.
Elisapie conta que a escolha por estas canções está ligada às "bonitas lembranças" da sua adolescência nos anos 1980, mas também à conscientização do que acontecia à sua volta, como "os efeitos da colonização, da sedentarização". "Tudo o que fez o meu povo sofrer", explica.
"Os Metallica eram um pouco como nossos irmãos mais velhos. Enquanto a música durava, sentíamos que estavámos protegidos", recorda.
A canção "The Unforgiven", da banda norte-mericana, tornou-se "Isumagijunnaitaungituq" no seu álbum intitulado "Inuktitut" (língua inuíte do Ártico), lançado este mês.
A cantora foi criada em Salluit, pequena cidade de Nunavik, uma região mais ao norte de Quebeque. A artista conta que quando era mais jovem, não sabia por que é que tantos primos da sua etnia colocavam um ponto final à vida.
O povo inuíte vive atormentado pelas lembranças do passado, em que as crianças da comunidade indígena deveriam estudar intensamente, medida que se estendeu até a década de 1990.
Os abusos e maus-tratos eram comuns e, posteriormente, o governo do Canadá reconheceu que houve um "genocídio cultural".
"As crianças eram separadas das suas famílias desde muito pequenas. Arrancavam as suas origens indígenas, de acordo com alguns relatos. Algo muito violento", conta a artista, que trabalhou como assistente social antes de se tornar cantora e porta-voz da sua comunidade.
O profundo mal-estar das comunidades inuítes deslocadas reflete-se particularmente na taxa de suicídios, que Elisapie descreve como uma "pandemia ártica".
Como forma de homenagear os seus parentes, a artista adaptou "I Want to Break Free", dos Queen, para "Qimatsilunga", em memória de um dos seus primos, Tayara, que era um pouco mais velho que a artista quando se enforcou.
O caso, assim como o de outros primos desaparecidos, aparece em "Qaisimalaurittuq", versão da famosa "Wish You Were Here", dos Pink Floyd.
"Somos bons, valemos alguma coisa"
Filha de mãe inuíte e pai branco, a cantora foi entregue pela avó a uma família adoptiva quando nasceu. E embora tenha feito parte da banda de rock dos seus tios, Sugluk, Elisapie seguiu para a carreira solo para se aprofundar ainda mais na aventura de "capturar" mais aspectos da música.
O seu quarto álbum não foi concebido apenas para curar feridas antigas, mas também para dar esperança a uma comunidade que tem sido muito "ignorada", denuncia. "Este disco é um pouco para dizer que somos bons, bonitos, que valemos alguma coisa, que podemos ser ouvidos e vistos na televisão", reforça.
No disco, a canção "Heart of Glass", dos Blondie, torna-se "Uummati Attanarsimata", uma versão inuíte que foi partilhada pelo baterista e um dos fundadores dos Metallica, Lars Ulrich.
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