
O MEO Arena recebeu, ontem à noite, a digressão artRAVE: The ARTPOP Ball, de Lady Gaga, que regressou aos palcos nacionais para apresentar o seu mais recente álbum de estúdio, “ARTPOP”, e para festejar com os little monsters portugueses o primeiro aniversário da edição. Numa sala longe de estar esgotada, foram mostrados, com pompa e circunstância, os novos temas, e revisitados, como não poderia deixar de ser, os grandes êxitos de uma carreira iniciada em 2008, num espetáculo ambicioso e sofisticado.
“ARTPOP”, álbum criado a partir da "rebeldia artística" – palavras da própria cantora -, não consegiu atingir o número de vendas inicialmente ambicionado pela editora, crítica e público. Numa indústria ditada por números de vendas, foram, inclusive, muitos os que auguraram o fim do estrelato para Lady Gaga. E o menor sucesso do disco refletiu-se, naturalmente, nas atuações ao vivo. Há quatro anos, um Pavilhão Atlântico lotado recebia o concerto de apresentação de um disco aplaudido e recebido com entusiasmo e surpresa um pouco por todo o mundo. Na segunda passagem de Gaga por solo nacional, o público mostrou-se em menor número, mas não com menos euforia, perante uma performance que manteve a ousadia e qualidade.
O amor e preocupação com os fãs tem sido uma «bandeira» amplamente agitada pela artista, quer em espetáculos, quer em entrevistas, quer nas mensagens que deixa, frequentemente, nas redes sociais. E toda essa disponibilidade foi evidente no concerto de ontem, que contou com um palco munido de várias plataformas, que permitiam a circulação de Gaga por todo o espaço e uma aproximação invulgar entre a protagonista e a plateia.
A festa começou com uma pequena introdução da ArtRave, um universo criado para revolucionar o mundo da pop, com Lady Gaga a surgir com asas douradas e com a bola do artista Jeff Koons – criador da imagem do último disco – incrustada num body brilhante. Artpop ecoava na sala. E Gaga confessava-se contente por estar em Portugal.
As interpretações de G.U.Y. e Donatella, pouco depois, continuaram a direcionar os presentes para o universo “ARTPOP”, arrancando-lhes saltos e passos de dança ousados, com Gaga a não descuidar, nem por momentos, a interação com o público. Antes de começar a cantar Venus, fazendo a sua própria interpretação da deusa Afrodite, as várias plataformas transformaram-se num jardim, com várias árvores insufláveis a aparecerem, subitamente. As permanentes alterações cénicas e de guarda-roupa são, aliás, outras duas características que tornam um concerto de Lady Gaga num espetáculo surpreendente. Não há margem para dúvidas: em palco, há uma narrativa a ser contada.
Quem estivesse ali à espera, unicamente, dos grandes êxitos, deveria abandonar a sala de imediato, referiu Gaga, antes de se lançar, com a bandeira de Portugal no microfone, a MANiCURE. Contudo, os sucessos da cantora não tardaram a surgir, com a artista, agora de indumentária branca, a atirar-se, para gáudio dos presentes, a Just Dance, Poker Face ou Telephone, com as coreografias, imortalizadas nos telediscos, a condizer.
Antes de Paparazzi invadir a sala, uma pausa, que permitiu ao público ficar a conhecer o tema Partynauseous, criado, originalmente, para integrar o mais recente álbum do rapper Kendrick Lamar, “good kid, m.A.A.d city”, mas que, devido a diferenças criativas, nunca chegou a ver a luz do dia. A violência das batidas hip-hop salpicadas pela eletrónica revelaram-se um bom preparativo para o que se seguiria.
Para cantar Paparazzi, tema que muito ajudou ao seu reconhecimento mundial, Lady Gaga envergou um vestido rosa, com bolas negras e tentáculos de polvo, a relembrar a bruxa Ursula, do universo Disney. Tentáculos que acabaram por desaparecer, ao sentar-se num poltrona em forma de mão, a partir de onde cantou Do What You Want, do último disco. Seguiu-se uma caminhada em direção ao piano, situado à direita do palco, para um dos momentos mais calmos e íntimos de todo o concerto, ao som de Dope, You and I e de uma versão acústica de Born This Way. Tempo para salientar, uma vez mais, a inspiração e força que os seus little monsters lhe transmitem e para ler uma carta de uma fã portuguesa, de nome Laura, entretanto chamada ao palco e convidada para fazer companhia a Gaga, ao piano.
A viagem a “ARTPOP” continuou com uma visita a temas como The Edge of Glory e Judas, antes da entrada num território mais atrevido e sexualizado, com Aura, canção que inagura o último disco, a fazer-se seguir por Sexxx Dreams, cantada a partir de uma poltrona vermelha, rodeada por dançarinos, e porMary Jane Holland.
Ainda houve tempo para Gaga interpretar o clássico Bang Bang (My Baby Shot Me Down), incluído na edição especial do disco lançado em conjunto com Tony Bennett. A dedicatória, mais do que merecida, foi para o cantor, que, de acordo com várias declarações da cantora, a terá salvado de um período mais negro, decorrido após o lançamento menos bem sucedido de “ARTPOP”.
A interação com o público foi constante em todo o espetáculo. A certa altura, Gaga pede uma bebida à audiência, tendo ido parar-lhe às mãos uma Super Bock – “um produto de Portugal”, como pronunciou com destreza. Após uma troca de roupa em pleno palco, altura de resgatar Bad Romance, Applause e Swine, para depois, e de regresso ao piano, fazerGypsy ecoar.
A menor afluência de público não impediu, portanto, a realização de um espetáculo pop certeiro: canções populares, com novos arranjos aqui e ali, adereços atraentes, provocantes e impunentes, recheados de cor e de vida, e um palco que privilegia o contacto com os fãs, que se exaltam a cada passo dado na sua direção. Acima de tudo, uma prova de inteligência e experiência , por parte da cantora e dos profissionais que a rodeiam, num mundo da música imprevisível, que muda a cada segundo.
Texto: David Pimenta
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