Depois de um concerto algo apagado e pouco condimentado por parte dos Mellow Mood, os Easy Stars All-Stars subiram ao palco e proporcionaram um dos melhores espetáculos da noite (e também do festival). O coletivo que um dia se atreveu a pegar em duas relíquias inquestionáveis e intocáveis da história da música e as transformou em experiências nos campos do dub, originando os discos “Radiodread” e “Dub Side of The Moon”, demonstrou que tem os pés bem assentes no palco e que tem a experiência ao vivo bem cimentada.

É precisamente no ano em que a obra de arte “Dark Side of The Moon” comemora o seu quadragésimo aniversário, que pudemos ver canções como “Breathe”, “Time” e “Money” serem homenageadas pelo coletivo nova-iorquino. Não faltaram ainda ao alinhamento versões dos temas “Climbing Up The Wall” e “Karma Police”, dos Radiohead, e “I Wanna be Startin’ Somethin’” e “Thriller”, de Michael Jackson.

Findo o concerto dos Easy Stars All-Stars, foi a vez do conterrâneo Tarrus Riley trazer mais um conjunto de notas sincopadas ao contexto da noite. O músico veio para incendiar corações e fez-se acompanhar da melhor seleção musical para tal. Seria “Loves Contagious” a primeira de todas a arrancar os mais intensos coros, maioritariamente femininos, e a deixar no ar um feitiço que se manteve até ao final da prestação. De seguida, para somar a este primeiro turbilhão de sensações, vieram “Superman”, “Sorry is a Sorry Word”, “Dream Woman”, “Stay With You” e ainda uma passagem por “Human Nature”, de Michael Jackson, enriquecendo o novelo de amores e desamores que são as atuações de Tarrus Riley.

À semelhança do que já aconteceu noutras edições, as pontes entre concertos foram feitas com exibições de skate na rampa da Element. Vários foram os praticantes que aproveitaram os tempos mortos entre as bandas para mostrarem o que de melhor se faz em solo português. Entre pequenas competições e demonstrações, houve espaço ainda para a aprendizagem da modalidade ao lado de alguns dos mais distintos profissionais da área.

Para finalizar a primeira noite, os Morgan Heritage – que trazem no sangue a herança de Denroy Morgan, uma das maiores lendas do reggae jamaicano – subiram ao palco para demonstrarem que há neles toda uma ligação à ilha do mar das Caraíbas e ao estilo musical que Bob Marley levou até aos quatro cantos do mundo. Os primeiros instantes do concerto traduziram-se em pura euforia por parte do público e foi com “The Return”, tema do mais recente álbum, que a ligação entre os músicos e a plateia se estreitou.

De seguida, “Don’t Haffi Dread”, canção que nos diz que ser rastaman não se limita a uma mera questão de visual, fez as delícias daqueles que defendem que há toda uma questão ideológica e cultural por detrás de uma simples questão de moda. E se a música anterior se manifestou como um dos princípios básicos do rastafarianismo, então “Jah Comes First” foi, sem margem de dúvidas, a sequela deste ensinamento.

De seguida “Jah Works” e “Hail Rastafari” homenagearam novamente Haile Selassie, e “A Man’s Still a Man” apelou à igualdade, independentemente da raça ou estatuto social. Menções honrosas não faltaram às raízes do reggae e a Toots And The Maytails, Bob Marley, Peter Tosh e Bunny Wailer; e ao novo sangue de artistas como Luciano, Anthony B., Sizzla e Buju Banton. O público gostou, aplaudiu e viu toda esta energia positiva culminar em “Tell Me How Come”, uma das canções que melhor define os Morgan Heritage e que os aproxima das massas seguidoras de reggae.

O segundo dia de festival trouxe mais pessoas à Ericeira que o primeiro. E foi numa mistura de hip hop e blues que G Love, em formato one man show - devidamente equipado com viola acústica e harmónica -, juntou os sons do Mississippi à cultura de rimas e batidas que teve como berço o bairro do Bronx, em Nova Iorque. Sentados no asfalto ainda quente do parque de estacionamento do complexo de campismo da Ericeira (local onde foi montado o palco para o evento), o público absorveu uma das sonoridades mais ténues que passaram pelo palco do Sumol Summer Fest, antes dos Rebelution terem dado um dos concertos menos interessantes do segundo dia e dos Dub Inc terem arrecadado o galardãopara amelhor performance do festival.

Já é mais que sabido, até porque não são nenhuns novatos na matéria, que os Dub Inc são das bandas nos meandros do reggae e do dub que conseguem proporcionar dos melhores espetáculos ao vivo. Talvez seja a forma como cruzam diferentes latitudes e longitudes – que podem ir da Jamaica à Argélia, passando por França – a receita do sucesso do coletivo de Saint-Étienne.

Para além de temas novos que certamente estarão inclusos no próximo álbum, os Dub Inc interpretaram algumas da canções habituais que adornam e enriquecem os seus alinhamentos. Entre outros, foi possível ouvir o ritmo imperdível e inconfundível de “Murderer”, a consciencialização social de “Métissage” e “Tout ce Qu’ils Veulent”, e a descarga de energia de “Jump Up Again”, que, como já aconteceu noutras situações, colocou o recinto todo aos saltos. Mas, como não poderia deixar de ser, foi o tema “Rudeboy” e a sua passagem pelas sonoridades ska que arrancou do público a maior reação eufórica dos dois dias.

Por último, e – supostamente – para rematar em grande o festival, era chegada a hora de Alborosie subir ao palco. Depois dos Dub Inc terem extasiado por completo o público do Sumol Summer Fest, cabia ao músico italiano a missão de dar continuidade a essa explosão energética. Porém,Alborosie ficou aquém das espectativas – que eram bastante altas – , não conseguindo que os motores da audiência continuassem em alta rotação e quebrou o ambiente.

Para relembrar fica um concerto onde só brilharam os apelos à legalização e ao consumo de marijuana de temas como “Herbalist”, “Waan The Herb” e “No Cocaine”; e as odes ao reggae e à cultura rastafári em “Kingston Town” e “Rastafari Anthem”. Há em Alborosie um claro domínio do flow e da cadência rítmica nas suas estrofes, no entanto falta-lhe alguma dinâmica nas atuações ao vivo e faltou, no concerto da última noite do Sumol Summer Fest, dar continuidade ao rastilho ateado, momentos antes, pelos seus colegas europeus. Não era tarefa fácil, mas também não se esperava outra coisa de alguém que já conta com um currículo notável nos campos do reggae.

Assim se desenrolou mais um Sumol Summer Fest, que mais uma vez deu o arranqueaos festivais de verãoem PortugalAs duas noites deste ano ficaram marcadas pela extrema competência dos Easy Stars All-Stars, as epopeias amorosas de Tarrus Riley, o elo familiar que une e dá vida aos Morgan Heritage, a consolidação do exercício ao vivo dos Dub Inc, e a promessa não cumprida de Alborosie.

Manuel Rodrigues

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