A fundadora da Araucária, Blanca Martín-Calero, explicou à agência Lusa que a obra reúne 150 fotografias, tiradas entre 1963 e 1975, e que integram um espólio de mais de 150 mil imagens do fotógrafo que retratou a vivência na costa norte da ilha de São Miguel durante cerca de 30 anos.

“Foi um processo muito gratificante porque os herdeiros são pessoas que têm muito amor pelo trabalho dele”, assinala a editora.

“Tudo começou” quando ficou “impressionada” com uma fotografia de Laudalino da Ponte Pacheco numa exposição do Museu Carlos Machado, em Ponta Delgada.

“Decidimos ter duas publicações. Uma com fotografias a preto e branco de 1963 a 1975 e, depois, vamos trabalhar noutro volume de 1975 a 1995 que será com fotografias a cores, mas o trabalho de catalogação e restauração ainda está a decorrer”, aponta.

A seleção “dolorosa” das imagens foi feita pela editora, pela professora de fotografia da Universidade Nova de Lisboa Margarida Medeiros e pelo designer José Albergaria, que pretendiam um livro para “ser manuseado” e que não fosse “muito grande e muito pesado”.

“As pessoas estão a gostar muito e a achar que era preciso divulgar esse trabalho. Isso é também muito bonito”, afirma.

Para a editora, o livro é “tão interessante” porque permite “diferentes leituras”: se, por um lado, retrata uma “época, com cerimónias e espaços”, que “já não existe”; por outro, é um “livro de pessoas porque as pessoas são o foco central do trabalho do Laudalino".

Além daqueles aspetos, Blanca Martín-Calero destaca a qualidade fotográfica, uma vez que o autor tinha “noções de luz e de enquadramento”.

“Ele não é um fotógrafo de fora que chega e tira fotografias. É uma pessoa que vivia lá, que conhecia as pessoas. O olhar dele é um olhar próximo desse mundo. De um fotógrafo participante”, acrescenta.

Laudalino da Ponte Pacheco (1921-1998), natural da Maia, trabalhador da Fábrica de Tabaco daquela freguesia, foi um “fotógrafo singular”, que retratou as tradições e a vida rural da costa norte da ilha, segundo se lê na contracapa da obra que conta com textos de Maria Emanuel Albergaria, Margarida Medeiros e João Leal.

“Há coisas que acontecem e nos passam um bocado ao lado. Há coisas que não de se dá relevância e é importante dar visibilidade e dar essa luz com qualidade”, declara Blanca-Martin Calero, natural de Valladolid (Espanha), que em 2003 veio para São Miguel “por amor”, após ter conhecido, durante um Erasmus em Coimbra, o ex-namorado açoriano.

Fundou a Araucária (uma árvore típica da paisagem açoriana) num “momento de mudança pessoal”, depois de ter deixado de dar aulas na Universidade dos Açores, onde lecionou durante 13 anos.

A editora, assente em “pequenas” tiragens e que lançou a primeira obra no final de 2020 (o livro infantil Miguel dos Botões), “diferencia-se pelo cuidado formal e nos conteúdos”.

“Há realmente um mercado açoriano com muitas editoras com trabalho feito e parece que este mercado interno é suficiente para manter essas edições. A nossa ideia não é essa. A nossa ideia é assumir as especificidades, mas mostrá-las ao mundo. Podermos transcender o regional”, realça.

“Para breve”, está o lançamento da coleção Azorica, que vai “juntar ciência e arte”, com duas obras, uma sobre as nuvens e outra sobre vulcões.

“Quando pensamos na coleção Azorica, o que pretendemos é precisamente dar esta visão de cá, do que é feito na região, mas com uma pretensão não regional. Isso para mim é muito importante”, conclui.