O processo de criação de “Requiem for Empathy”, a ser editado na sexta-feira, ajudou Luís Clara Gomes “a lidar com uma série de perdas, que culminou com uma perda enorme”, do avô, que sempre teve uma “presença muito grande” na vida do músico, produtor e DJ.
Em entrevista à Lusa, o músico confessou que não gosta de explicar o que as canções representam, porque precisa “que as coisas sejam subjetivas o suficiente” para sentir que o que cria “pode fazer bem a alguém”. “E quando personificamos muito, a Arte em geral perde essa capacidade, de alguma forma”, disse.
No entanto, partilhou que o que se passou na altura em que estava a criar o álbum levou-o “a questionar de que forma é que isto” se encaixava no que “estava a fazer para trás”.
“Sempre fiz música muito expansiva, muito alegre, muito a cores, e aquilo que estava a sentir era diferente e no final acabei por decidir que isto fazia parte do meu corpo de trabalho, porque sempre fui honesto nas coisas que estava a fazer e isto era só um passo seguinte nessa honestidade”, contou.
Acabou por ser “um exercício de pensar se a catarse e a terapia tinham lugar neste espaço” da música de dança.
“Sempre foi um sítio que eu procurei para extravasar, e como diz o [músico, produtor e DJ] James Murphy [dos LCD Soundsystem] ‘dance your troubles away’, e encontrar pessoas que se calhar pensam da mesma forma. E por isso sim, achei que fazia sentido”, disse.
Luís Clara Gomes acredita “no poder transformador da dança” e que se consegue “fazer revoluções na pista de dança”. “A História diz-nos que isso aconteceu nas mais variadas eras. Revoluções que aconteceram em primeiro lugar nestes nichos, nestes pequenos espaços seguros, que depois transbordaram para a sociedade em geral”, recordou.
“Requiem for Empathy”, como tantos outros álbuns, esteve parado um ano. Em março do ano passado, Moullinex tinha terminado o trabalho que iniciara dois anos antes.
Nessa altura, o título já estava escolhido e acabou por ser “uma espécie de profecia auto-cumprida que aconteceu”.
“Condensei este meu amor e paixão pela pista de dança no sentimento mais puro possível, e esse era o da empatia. Num mundo em que sentia uma polarização cada vez maior das pessoas, a empatia deixou de ser uma prioridade como pensamento global e decidi fazer a minha espécie de elogio fúnebre. Mal eu sabia que a seguir vinha uma pandemia global que nos ia pôr a pensar justamente sobre a questão da empatia e do quão as nossas ações têm impacto sobre o bem comum”, afirmou.
Em 2020, Moullinex teve “muitos meses difíceis em termos criativos”.
“Resignei-me e aceitei que não estava a acontecer e decidi dirigir os meus esforços criativos para artes visuais e para me perder em labirintos de tecnologia aplicada às artes visuais, em 3D. Ocupei-me com tecnologia aplicada a contextos visuais, que se materializou numa residência no final ao ano com neurocientistas, psicólogos e artistas visuais, em que passámos uma semana a fazer experiências à volta deste tema da empatia”.
Mesmo em meses “difíceis em termos criativos”, Moullinex acabou por criar, em casa, um tema extra para o álbum - “Luz”, com a participação de GPU Panic, “que gravou em casa dele à distância”.
“Todo o disco acaba por ser um bocadinho terapêutico, mas aquele [tema] em particular foi mesmo uma resposta à ansiedade de tentar imaginar o regresso aos palcos e pistas de dança”, partilhou.
Sempre que cria temas novos, Moullinex imagina-os a serem tocados, seja em palco com banda, em DJ sets ou a serem ouvidos por alguém nas mais variadas situações.
“[Com a pandemia] estava a custar-me muito muitos dos lugares óbvios onde imaginava a minha música a ser tocada não existirem. A ‘Luz’ foi uma espécie de mantra que repeti para mim próprio para me acalmar e transformei num tema. Foi muito de resposta ao que estava a sentir no momento”, contou.
Além de GPU Panic, Moullinex conta em “Requiem for Empathy” com outros convidados, tudo pessoas com quem tem “afinidade pessoal”.
“As escolhas foram sobretudo emocionais, são pessoas que admiro”, contou sobre os cantores a quem deixou a opção de escolherem cantar na língua em que “se sentissem mais à vontade para serem vulneráveis”.
Daí haver temas cantados em changana, de Moçambique, por Selma Uamusse, crioulo de Cabo Verde, por Sara Tavares, castelhano “com sotaque e nuances dominicanos”, de Ekstra Bonus, e inglês, de GPU Panic e Afonso Cabral.
Os concertos de apresentação de “Requiem for Empathy” estão marcados para 4 de junho, na Cultugest em Lisboa, e 9 de junho, na Casa da Música no Porto.
Comentários