A caminho dos
Óscares 2025
“The Seed of the Sacred Fig”, um thriller filmado secretamente sobre uma família dilacerada pela política brutal e repressiva do Irão, recebeu ótimas críticas e vários prémios em festivais, incluindo o de Cannes.
Cada país pode inscrever apenas um filme para concorrer ao Óscar de Melhor Filme Internacional e, em países autoritários como o Irão, essa opção é deixada para organizações controladas pelo Estado.
“É claro que é inimaginável que a República Islâmica envie um filme como este para os Óscares”, disse Rasoulof.
“De facto, se o regime pudesse apresentá-lo, não haveria necessidade de fazer este filme em primeiro lugar”.
Assim, em vez do Irão, a Alemanha escolheu a obra para concorrer ao cobiçado Óscar de Melhor Filme Internacional.
A Alemanha tornou-se a pátria adotiva do exilado Rasoulof. O filme foi produzido por empresas alemãs e francesas.
“The Seed of the Sacred Fig” tem boas hipóteses de conseguir uma nomeação na cerimónia de Hollywood e ganhar visibilidade mundial.
“Estou fascinado com o facto de a Alemanha ter percebido o potencial internacional do filme e tê-lo abraçado. (...) É como uma luz brilhante, um sinal para todos os cineastas que trabalham sob opressão no mundo”, disse o diretor à AFP em Los Angeles este mês, durante a promoção do filme.
“(Mas) é agridoce”, continuou ele. “Tenho sentimentos contraditórios".
“Pressão”
O filme decorre durante os protestos “Mulheres, Vida, Liberdade” que ocorreram há dois anos no Irão.
Essas manifestações foram desencadeadas pela morte de uma jovem sob custódia depois de ter sido presa pela “polícia da moralidade” por alegadamente violar o rigoroso código de vestimenta do regime para mulheres.
Centenas de pessoas foram mortas durante a repressão das forças de segurança, de acordo com grupos de direitos humanos.
O filme acompanha Iman, um juiz ambicioso que trabalha para o governo, a sua mulher, Nahjmeh, e as suas duas filhas curiosas e rebeldes.
Inicialmente, Iman sente-se dividido por ter de assinar mandados de morte sem provas. Mas a pressão do regime aumenta e corrói-o, criando uma fresta na família, especialmente depois de a sua arma desaparecer de casa.
Rasoulof mal conseguiu chegar à estreia do filme no Festival de Cinema de Cannes, em maio, depois de deixar o Irão a pé, passando por perigosas passagens nas montanhas, alguns dias antes.
O cineasta, que já esteve preso, havia acabado de ser condenado a oito anos de prisão e açoitamento por denunciar a “corrupção” e a “incompetência” das autoridades.
Em Cannes, mostrou fotos das duas personagens principais do filme que estão presas no Irão.
Uma delas é Soheila Golestani, que interpreta Nahjmeh, quecontinua no Irão e enfrenta “o máximo de pressão possível”, já que os processos contra os cineastas se aceleraram nas últimas semanas, disse Rasoulof.
"Cineasta exilado"
A aposta oficial do Irã este ano é “In The Arms Of The Tree”. A meios de comunicação estatal descrevem o filme como um drama que mostra “a beleza deste país” e destaca “a autenticidade da família iraniana”.
Rasoulof diz que tem pouco interesse em assistir a um filme “feito de acordo com os parâmetros ditados pela censura iraniana”.
“Eles tendem a não representar a realidade. Se os virmos, sentimos que é um insulto à nossa inteligência”, disse ele.
No seu último filme, Rasoulof inspirou-se nas influências da Hollywood clássica, especialmente com um final intenso, emocionante e de arrepiar.
“Fui influenciado por dois filmes: 'Straw Dogs', de Sam Peckinpah, e 'The Shining', de Stanley Kubrick”, disse ele. “Gostei de brincar com os géneros e misturá-los de novas formas".
Entre os seus próximos projetos está uma animação que contará a história de Abbas Nalbandian, um dramaturgo radical que “viveu experiências transcendentais em torno da Revolução (iraniana)”.
A ideia de uma animação surgiu por necessidade, há quatro ou cinco anos. “Achei que não conseguiria filmar nada nas ruas”, lembrou Rasoulof. “Estava a procurar uma forma de dar a volta por cima.”
Mas agora o realizador quer concluir o projeto, mesmo estando no exílio, uma realidade que admite ainda não ter assimilado totalmente. “É muito difícil aceitar que já se passaram seis meses (...) que sou um cineasta exilado”, disse. “Sinto muita falta do Irão".
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