O sindicato que representa os atores de Hollywood disse na quinta-feira que as negociações difíceis com os estúdios para evitar uma grande paralisação da indústria terminaram sem acordo, abrindo caminho para uma votação sobre a primeira greve de atores em mais de quatro décadas.

O Screen Actors Guild (SAG-AFTRA), que representa 160 mil artistas, incluindo estrelas de primeira linha, disse que as negociações de última hora não conseguiram resolver as suas reivindicações relacionadas com os salários cada vez menores e a ameaça representada pela inteligência artificial (IA).

Os negociadores do sindicato recomendaram por unanimidade uma greve ao seu comité nacional, que deverá votar sobre essa decisão na quinta-feira de manhã em Los Angeles (fim da tarde em Lisboa), diz um comunicado.

Uma "greve dupla" de atores e argumentistas, não vista em Hollywood desde 1960, paralisaria quase todas as produções de cinema e televisão dos EUA.

As séries populares que devem regressar à televisão este ano enfrentariam longos atrasos. E, se as greves continuarem, futuras grandes produções também serão adiadas.

Os atores estão a exigir melhores salários e proteções contra o uso futuro de IA na televisão e nos filmes.

"Estamos profundamente desiludidos com a decisão da SAG-AFTRA de abandonar as negociações. Esta é a escolha da União, não a nossa", disse também em comunicado já esta quinta-feira após se ter esgotado o último prazo para as negociações com a Aliança de Produtores de Cinema e Televisão (AMPTP), a organização que representa os grandes estúdios e plataformas de Hollywood, como Disney, NBCUniversal, Paramount, Sony, Warner Bros. Discovery, Netflix, Amazon e Apple.

Os estúdios convocaram mediadores federais para ajudar a resolver o impasse - uma ação de última hora descrita pelo SAG-AFTRA como um "estratagema cínico".

O SAG-AFTRA representa estrelas da primeira linha, como Meryl Streep, Jennifer Lawrence, Glenn Close. A 6 de junho, 97.91% dos membros votaram a favor da autorização para entrar em greve após o fim do atual contrato com a AMPTP se não se estivesse perto de chegar a acordo.

Antestreias e festas

Uma greve impediria imediatamente que as estrelas promovessem alguns dos maiores lançamentos do ano, bem no auge da temporada de grandes sucessos de bilheteira da indústria cinematográfica.

Em Londres, a estreia na noite de quarta-feira de "Oppenheimer", de Christopher Nolan, foi antecipada uma hora, para que o elenco, incluindo Robert Downey Jr., Matt Damon e Emily Blunt, pudesse comparecer sem violar as regras sindicais, informou a Variety.

Mas uma greve atrapalharia a antestreia do tão esperado filme nos EUA, marcada para segunda-feira em Nova Iorque, bem como o lançamento do novo filme "Mansão Assombrada" na Disneyland, que pode ser reduzido a um "evento privado para fãs".

E a enorme reunião anual de cultura pop da Comic-Con em San Diego na próxima semana pode ser despojada das suas estrelas.

Até mesmo a cerimónia dos Emmy, a versão televisiva dos Óscares, prevista para 18 de setembro, está a ponderar um adiamento para novembro ou mesmo para o ano que vem.

"Esperamos que as negociações em andamento do sindicato cheguem a uma resolução justa e rápida", disse o presidente da Television Academy, Frank Scherma, quando as nomeações para os Emmys foram anunciadas na quarta-feira.

"Resolução rápida"

Embora a greve dos argumentistas já tenha reduzido drasticamente o número de filmes e programas em produção, uma paralisação dos atores fecharia quase tudo.

Alguns 'reality shows', animações e 'talk shows' podem continuar.

Mais cedo na quarta-feira, os sindicatos de Hollywood que representam realizadores, trabalhadores dos bastidores e argumentistas emitiram uma declaração de "apoio e solidariedade inabaláveis" com os atores.

“Embora os estúdios tenham um valor coletivo astronómico, muitos mil milhões de espectadores em todo o mundo e lucros altíssimos, esta luta não é sobre atores contra os estúdios”, afirmaram.

Trabalhadores "de todos os ofícios e departamentos" juntam-se "para impedir que as grandes corporações corroam as condições que lutámos durante décadas para conseguir", notaram.

Compensações e IA

Como os argumentistas, que já passaram 11 semanas nos piquetes de greve, os atores exigem salários mais elevados para combater a inflação e garantias para os seus meios de subsistência futuros.

Além dos salários quando estão a trabalhar, os atores recebem pagamentos chamados de "resíduos" sempre que um filme ou programa em que entraram é exibido nos canais terrestres ou na TV a cabo - particularmente útil quando os artistas estão entre projetos.

Hoje, porém, plataformas de streaming como Netflix e Disney+ não divulgam os números de exibição dos seus programas e oferecem a mesma taxa fixa para tudo o que está no seu catálogo, independentemente da sua popularidade.

Para dificultar ainda mais o panorama, há a questão da inteligência artificial. Tanto os atores como os argumentistas querem garantias para regular o seu uso futuro, mas os estúdios até agora recusaram-se a ceder.