O título não engana: no novo filme de Mulher-Maravilha damos um salto até aos anos 80, com tudo o que isso significa como pano de fundo (as roupas, a música, os hábitos). É um salto de décadas, já que no primeiro filme tínhamos ficado em 1918.
Tanto tempo depois, a vida seguiu o seu curso natural e Diana Prince está sozinha. Perdeu o seu amor (Steve Trevor, interpretado por Chris Pine) e os seus companheiros de equipa. Vive discretamente, sem criar laços com ninguém, trabalha no Smithsonian e coloca a tiara para tentar ajudar onde pode. Dois vilões vão dar-lhe uma nova missão e trazer até si parte do passado que perdeu.
"Mulher-Maravilha 1984" traz-nos de volta Gal Gadot como a heróina da DC, depois do sucesso do primeiro filme em 2017, que rendeu
O SAPO Mag ouviu os atores e a cineasta e argumentista em exclusivo para Portugal, na conferência de imprensa virtual de apresentação. Eles em Los Angeles, nós em Lisboa, à distância de um ecrã, como 2020 nos habituou a fazer.
"É fantástico finalmente partilhar algo com o mundo e ter algo para partilhar com o mundo nesta altura", desabafa Patty Jenkins. "Mulher-Maravilha 1984" foi um dos poucos blockbusters que mantiveram a sua estreia no cinema em 2020, apesar de nos EUA estrear também em simultâneo em streaming, através da HBO Max. Em Portugal chegará às salas de cinema esta quarta-feira, 16 de dezembro.
Se o primeiro filme "criou" a personagem, este nasce de uma vontade de a desenvolver, como nos explicou a realizadora e co-argumentista: "ela só é a Mulher Maravilha na última cena do primeiro filme. Dei por mim com muita vontade de fazer um filme sobre a Mulher-Maravilha, agora uma Mulher-Maravilha totalmente desenvolvida. Comecei a refletir sobre o que sentia em relação ao que estava a acontecer no mundo, sobre o que a Mulher-Maravilha gostaria de dizer ao mundo, e a história surgiu disso".
"Falámos muito sobre a história da Diana e de como a sua vida tinha sido desde que a vimos pela última vez em 1918 até aos anos 80. Ela perdeu todos os membros da sua equipa, tem estado muito sozinha e não quer envolver-se e fazer novos amigos, porque eles vão perceber que ela não envelhece, vão morrer e ela tem que os deixar partir. Por isso ela isolou-se do mundo e o seu objetivo é ajudar, melhorar, guiar a Humanidade e tentar fazer o bem", explica a atriz Gal Gadot sobre a sua personagem no novo filme.
"Ela está a tentar ensinar todos os que encontra a serem melhores e, com isso, tenta ajudar a Humanidade a ser melhor. Acho que quis explorar a relação da Diana com a Humanidade. No último filme ela descobriu a Humanidade, agora mostramos como é que ela vive nela. E ela também não é perfeita. Com os seus próprios conflitos e o seu percurso para fazer a coisa certa - que é tão universal para todos nós – e ser uma heroína, não é uma coisa fácil", sublinha Patty Jenkins.
"Mulher-Maravilha 1984" foi rodado em Washington, depois na Virginia, de seguida no Reino Unido e também em Espanha, nas ilhas Canárias. "A nossa pegada mundial aumentou significativamente", explica o produtor Charles Roven.
Para Gal Gadot, a maratona valeu a pena: "foi o filme mais difícil que já fiz mas valeu a pena especialmente porque, como o primeiro filme tinha sido tão bem acolhido, não íamos escolher ir por atalhos, queríamos elevar a fasquia e dar tudo o que tínhamos porque sabíamos que as pessoas tinham muito carinho pela personagem".
Veja o trailer do filme:
Dois vilões de peso, atípicos
Se há uma coisa que a última década de cinema nos ensinou é que nem sempre os vilões nos filmes de super-heróis estão à altura dos protagonistas desses filmes. Na sequela de "Mulher-Maravilha" a tentativa foi combater a imagem do vilão típico.
Para os interpretar, Patty Jenkins foi buscar Pedro Pascal ("A Guerra dos Tronos", "Narcos" e "The Mandalorian") e Kristen Wiig ("A Melhor Despedida de Solteira", "Caça-Fantasmas"). Ele é Max Lord, um homem de ambições desmedidas que se agarra ao poder de um artefacto para conseguir o que quer e com isso lança um evento quase apocalíptico à escala mundial; ela é primeiro a tímida e desajeitada Barbara Minerva e depois a poderosa e implacável Cheetah, figura surgida na Banda Desenhada em 1943.
Apesar de ter vários papéis dramáticos no seu currículo, Kristen Wiig está mais habituada aos papéis de comédia e não pensou ver-se a interpretar uma vilã num filme de grande orçamento. "Não costumam convidar-me para fazer este tipo de papéis, para ser honesta, e fiquei chocada, feliz e, claro, senti maior pressão quando embarquei no projeto e quando falei com a Patty sobre isso. Eu sou uma geek de super-heróis, vejo todos os filmes no cinema, fiquei obcecada pelo primeiro filme. Saber que ia entrar neste filme e ser uma vilã, foi uma experiência de vida incrível para mim", confessou a atriz.
"Nunca tinha interpretado uma personagem assim e conseguia visualizar melhor aquilo que não queria fazer do que aquilo que queria que ela fosse, mas senti-me muito apoiada e foi uma experiência assustadora mas fantástica para mim", acrescentou.
Pedro Pascal sabia que o seu Max Lord não ia ser um vilão a preto e branco e aponta uma responsável para isso: "eu chamo-lhe a ‘experiência Patty Jenkins’ quando não conseguimos safar-nos com algo que é típico. Tem de ser completo, ter todos os riscos, os perigos e também o lado humano. Não importa o quão sombria é a personagem, é fazer a experiência o mais honesta possível. Não fiquei surpreendido com isso isso por todos os filmes dela que tinha visto antes e pelas interpretações que estão nesses filmes, mas não sabia se conseguiria lá chegar". "Devo tudo à minha realizadora", agradece o ator.
Kristen Wiig descreve uma construção de personagem semelhante. O importante era não ser o retrato tradicional de vilão. "Não queríamos que fosse um retrato típico de uma rapariga tímida que se tornou numa vilã, queríamos mostrar o que é que ela tem para ser tão solitária e invisível e o que ela realmente quer", salientou a atriz.
Steve Trevor, um regresso do passado
Para todos os que viram o trailer de "Mulher-Maravilha 1984", não será grande surpresa dizer que Chris Pine volta à personagem de Steve Trevor, o piloto que Diana Prince conheceu no primeiro filme e por quem se apaixonou. Todos estes anos depois, ele morreu e ela continua viva e com a mesma idade, e com uma saudade irremediável.
Deixamos os detalhes sobre como ele vai parar aos anos 80 para a sessão no cinema, mas adiantamos que há uma cena em que Trevor, tentando ambientar-se aos estranhos costumes da década, tenta encontrar a roupa ideal para uma primeira saída no tempo onde foi parar. "Houve muita coisa que foi deitada fora. Fiquei loucamente apaixonado por uma bolsa de cintura de ganga que acabou por não entrar no filme", brinca Chris Pine.
"Para mim a ideia mais interessante de explorar foi a de ser o homem a interpretar o peixe fora de água, que geralmente é interpretado por uma mulher. Brincámos com esse tema no primeiro filme e voltar e fazê-lo de novo foi muito divertido. Foi mais difícil do que pensava, porque o maior desafio para um ator é fingir que é como uma criança no mundo, a ver tudo pela primeira vez", disse o ator.
"O Steve é de alguma forma, e especialmente no primeiro filme, o espectador. É ele que vê a Mulher-Maravilha a voar com o laço da verdade, a fazer coisas incríveis, e ele começa a acreditar, tal como o espectador, e a ver como é ter compaixão e amor num mundo onde nem sempre nos pedem para fazer isso", acrescentou.
O poder à mulher (maravilha)
Uma protagonista, uma vilã, uma mulher na cadeira de realizadora e a assinar o argumento. Se no primeiro filme, "Mulher-Maravilha" foi elogiado por virar os holofotes para as mulheres, dentro e fora do ecrã, no segundo filme, isso é ainda mais visível.
Logo na cena de abertura, uma competição entre Amazonas na ilha de Temiscira, mostra a força de um conjunto de mulheres e a ambição da então pequena Diana Prince.
A própria Gal Gadot confessa que não antecipou o impacto que esse lado de empoderamento feminino dos filmes teria em si. "Eu não tive a sorte de ver personagens como a Mulher-Maravilha em criança. Quando vi a cena de abertura deste filme tive uma reação que não esperava, fiquei muito emocionada", disse.
"Pela primeira vez não me senti como a Gal, a mulher e a atriz. Senti-me como a Gal, a menina de oito anos, a ver outra menina de oito anos a fazer uma coisa do outro mundo, a ser tão boa nisso e a fazê-la à sua maneira. Tocou-me profundamente e depois apercebi-me de qual é o poder destes filmes: quando vemos algo, achamos que podemos sê-lo e depois tornamo-nos nisso", acrescentou.
"Eu não tive a oportunidade de ver essas personagens femininas fortes e agora ver como afecta as minhas filhas, mas também rapazes e homens e todo o tipo de pessoas, é muito poderoso, muito forte e estou muita grata por ter tido a oportunidade de participar disso", rematou a atriz.
Depois de uma rodagem longa e exaustiva, e de, porventura, o ano mais difícil de sempre para o cinema e a maioria dos grandes blockbusters a serem atirados para 2021, "Mulher-Maravilha 1984", com uma mensagem esperançosa, resiste e chega ao grande ecrã, mesmo a encerrar o ano.
Para Gal Gadot, as relações que se criam numa experiência como esta transparecem para o filme: "rodámos o filme por cerca de oito meses e foi intenso, longo e fisicamente esgotante. Acho que o facto de nos termos apoiado uns aos outros foi crucial. Fizemo-nos rir, abraçámo-nos quando um de nós chorou e mesmo aos fins de semana queríamos juntar-nos de novo. Isso é o melhor que levo deste filme e acho que uma das chaves para estes filmes funcionarem é o facto de gostarmos verdadeiramente uns dos outros".
"Mulher-Maravilha 1984" está em exibição nos cinemas portugueses a partir desta quarta-feira, dia 16 de dezembro.
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