A HISTÓRIA: Neo é um criador de jogos na Califórnia. O seu passado parece enterrado, exceto por alguns pesadelos repetitivos.

"Matrix Resurrections": nos cinemas a partir de 22 de dezembro.


Crítica: Hugo Gomes

No meio de uma reunião “brainstorm” para determinar os novos trilhos do legado “Matrix”, alguém retoricamente pergunta: “Que palavra hoje define ‘Matrix’?” A resposta surge como contraditório, visto não serem uma, mas duas palavras: “bullet time”.

“Matrix Resurrections", o novo acordar de uma saga milionária do estúdio Warner Bros., é um mero e progressista brinquedo visual sobre uma referência estética que redefiniu uma linha de montagem cinematográfica nas vésperas do século XXI. Portanto, se o vamos ver como uma continuação dos portentos técnicos ou desafiadores do cinema de ação, então esta sequela ou "reboot" órfã com Keanu Reeves e Carrie-Anne Moss como Neo e Trinity de uma das suas realizadoras (fica Lana, vai-se Lily Wachowski) é uma tremenda desilusão.

Mas "Matrix Resurrections" brinca com a relevância cultural e até mesmo teológica que contaminou o mundo atual com o primeiro filme de 1999, um caso de sucesso que bebeu das mais diferentes fontes e mesclou uma originalidade 'frankensteiniana'. E funciona, pelo menos até ao seu segundo ato, como um exercício metalinguístico deste fenómeno, um ensaio de auto-reflexão daquilo que o Matrix representa e continua a representar numa sociedade moderna (tendo mesmo encontrado alguns pontos comuns com a atual pandemia).

Porém, o frenesim acaba por se dissipar, revelando o calcanhar de Aquiles de muito cinema "pós-Matrix": a dependência do sentimentalismo como Deus Ex Machina. Ainda que "Matrix Resurrections" brinque com essa dualidade como um advogado do Diabo, cometendo as mesmas tropeções e, de seguida, troçando desses passos, este efeito Lazarus com Neo e Trinity nada acrescenta à mitologia e até mesmo ao nosso cinema atual.

O 'cyberpunk' minado de dicotomias entre luz e escuridão, bem e mal, prisão e liberdade, conformismo e risco, carne e máquina, foi um filme fora do seu tempo em 1999, agora substituído por uma colorida, artificial (se bem que este adjetivo soa irónico numa saga que sempre aprimorou o seu lado digitalizado) e esgotada estrutura sem novas ideias e cúmplice da associação primária ao "bullet time". "Matrix Resurrections" é uma reencarnação desengonçada e abstração redutora do que realmente é (era) "Matrix".

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