Emprestou a sua voz num momento “I’m Still Standing” na animação “Cantar”, salvou o próprio Elton John na sequela de “Kingsman” e agora é o intérprete de "Candle in the Wind" e "Can You Feel the Love Tonight" numa "biopic" a condizer. Sim, Taron Egerton nasceu para este papel. Estava destinado para isso.

Mas se o jovem ator tem aqui a sua oportunidade de brilhar numa cinebiografia musical ao jeito de que a Academia gosta de premiar, "Rocketman" é um projeto que tenta amenizar os erros demonstrados no sucesso de “Bohemian Rhapsody”. As comparações são incontornáveis, até porque Dexter Fletcher foi deixado à sua mercê nos retalhos de vida de Freddy Mercury e dos Queen após o afastamento de Bryan Singer, envolvido em polémicas de pedofilia e assédio.

O resultado foi um "frankenstein" narrativo, costurado de forma justificada para conceber a enésima esquematização narrativa, que mereceu quatro Óscares. Nesse aspecto de guião, “Rocketman” não foge da proposta de “Bohemian Rhapsody” , só que ao invés do esboço por tópicos do renegado de Singer, esta suposta emancipação de Fletcher tenta abraçar o universo reconhecível de Elton John para servir de atalho para o previsível dos previsíveis.

Pois bem, se ficamos com a sensação que as biografias musicais no cinema soam a fotocópias umas das outras, ressoando nos temas comuns como autodestruição, disfuncionalidade familiar e inconformidades amorosas, em “Rocketman” o dispositivo que entrelaça todos estes "lugares-comuns" advém de um contexto de “persona” desintegrada.

Passo a explicar: no preciso primeiro minuto em que vemos Taron Egerton encarnando a sua personagem, ele está a interpretar a personagem da personagem, o alter-ego artístico. Até porque Elton John é somente uma máscara que vai sendo desconstruída quando o protagonista arranca com a sua narração.

Aí experimentamos um "flashback" prolongado que captura o onirismo do artista e as suas fantasias musicais, com o objetivo de chegarmos ao seu intimismo. Até porque “Rocketman” é assumidamente um musical, ao invés de um drama que remexe na música dos outros.

Esta é a sua melhor arma e, ao mesmo tempo, a sua grande fraqueza: se, por um lado, é o musical que se assume como uma viragem criativa no retrato desta vida, é também a sua inserção que salienta a intenção de esquematização, sem nunca esquecer ao mesmo tempo a sua atitude de "best hits". E quanto à proposta de aproximação ao “verdadeiro” Elton, a musicalidade apenas insufla uma intenção do mesmo.

Taron Egerton é corajoso o suficiente para ir além da "máscara" que ficou encarregue de usar, concentrando os tiques do músico e ao mesmo tempo criando um paralelismo com o mesmo (possivelmente uma “persona” alternativa). Infelizmente, não será o salvador de um filme artificial que usufrua essa sua artificialidade como arma recorrente.

Mais aprimorado que o seu primo “Bohemian Rhapsody”, este "Rocketman" vem apenas perpetuar a marcha das fórmulas vencidas que pisca o olho à temporada de prémios.

"Rocketman": nos cinemas a 30 de maio.

Crítica: Hugo Gomes

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