"Vocês sabem mesmo dar uma festa. Obrigado por nos convidarem para fazermos parte dela", confidenciou Eddie Vedder aos milhares de espectadores que o acolheram - de forma invejavelmente calorosa - no Passeio Marítimo de Algés, naquele que foi o terceiro e último dia do Alive!10 (e o único já esgotado há semanas).

Poucos minutos depois, o vocalista dos Pearl Jam sairia do Palco Optimus com a bandeira de Portugal, envolto numa prolongada ovação (eapósfalar em português algumas vezes). E o que para muitos será um dos maiores clichés do rock surgiu como consequência natural de um concerto que, talvez mais do que qualquer outro do festival (com a eventual excepção do dos Gossip), foi um fortíssimo testemunho de comunhão entre banda e público.

E este foi, também, o último concerto do grupo de Seattle por cá. "Não o último de sempre, mas o último em muito tempo", sublinhou Vedder numa das suas escassas afirmações que não recebeu sorrisos e aplausos como resposta.

Com cerca de duas horas de duração, o concerto viajou pela discografia da banda e teve paragem obrigatória nos anos 90, já revisitados na noite anterior pelos Skunk Anansie ou Deftones. Mas não só os Pearl Jam têm melhores canções como conseguiram dar uma energia singular à noite.

Os primeiros versos de "Better Man", por exemplo, foram cantados por milhares de espectadores em uníssono, num momento de eleição para máquinas fotográficas e telemóveis. E nem é preciso ser fã do grupo para encontrar em "Smile" um momento arrepiante, com Vedder em estado de graça enquanto cantou e tocou harmónica.

Mais enérgico, o muito apropriado "Alive" trouxe um dos últimos episódios de euforia a uma noite que, seguramente, muitos incluirão entre as mais memoráveis deste Verão.

Depois do passado, o futuro

A festa que Eddie Vedder mencionou não ocorreu tanto no seu concerto - mais próximo de um ritual - mas no seguinte, o derradeiro do Palco Optimus. A nostalgia grunge deu lugar às canções longas e retrofuturistas dos LCD Soundsystem, que trouxeram ao Alive!10 o recente "This is Happening", o seu terceiro disco.

O mentor do projecto, James Murphy, incensado pela crítica e nome incontornável do dance punk, nem sempre conseguiu ter o público na mão. Grande parte deste saiu, aliás, logo após o concerto dos Pearl Jam, e muitos dos que ficaram não chegaram a aderir logoao convite dançável dos nova-iorquinos.

De qualquer forma, tudo o que sucedesse à banda de Seattle estaria condenado a perder na comparação e os LCD Soundystem estiveram muito longe do fracasso. Apenas se sentiu falta de mais momentos ao nível do desconcertante "Tribulations" (um excelente exemplo de electrónica frenética) ou do incisivo "Yeah", que fechou a actuação ao fim de uma hora e precisamente na fase em que se encontrava no ponto. Pode ser que, no tal regresso que Murphy deixou no ar, haja tempo para mais (sobretudo para algumas das melhores canções do grupo, caso de "Someone Great", "North American Scum" ou "You Wanted a Hit").

Rock com garra no Palco Optimus

Com mais faísca, os Dropkick Murphys e os muito esperados Gogol Bordello fizeram outras festas, horas antes, com punk mestiço de forte sabor celta (no primeiro caso) ou cigano/balcânico (no segundo).
E a abrir o Palco Optimus, ao fim da tarde, os Gomez tiveram nota claramente positiva num regresso muito celebrado - até por quem não conhecia o simpático quinteto, e pareceram ser muitos. Mas os britânicos, uma das promessas indie de outros tempos, trataram de se apresentar com alguns cartões de visita certeiros: o dinâmico e despachado "Shot Shot" ou o saltitante "Whipping Picadilly". É pena que o seu novo disco, "A New Tide", fique aquém do que mostraram em "Bring It On" (1998) ou "In Our Gun" (2002). Em compensação foram muito hábeis a contagiar uma multidão emevidente compasso de espera.

Os dissabores do Clubbing

Também em forma, mas com menos sorte, os Micro Audio Waves tocaram para um Palco Optimus Clubbing onde apenas poucas dezenas marcaram presença. A actuar num horário ingrato - o que coincidiu com o concerto dos Pearl Jam -, o grupo de Cláudia Efe, Flak e C. Morg teria sido gigante se tivesse arrancado umas duas ou três horas mais tarde. Assim, deixou uma óptima atitude e ainda melhores canções (com pop electrónica de bela colheita) que não tiveram o efeito merecido. Foi o melhor concerto que (quase) ninguém viu.

Também no Palco Optimus, e igualmente com alguns entraves, The Legendary Tigerman actuou, pela primeira vez, com todas as convidadas do seu último disco, o muito aconselhável "Femina". Ou melhor, quase todas, já que Asia Argento não compareceu uma vez que ficou retida em Florença. Mas o maior problema nem foi esse, antes o som intrusivo do concerto dos Gogol Bordello, que tocaram a poucos metros. "Se vivêssemos num mundo perfeito surgia uma cápsula de silêncio e engolia aquele palco", desabafou Paulo Furtado. Ainda assim, aqui o Palco Optimus não contou com falta de público - antes pelo contrário, o homem-tigre e as suas sereias tiveram casa cheia na apresentação do seu rock ora lânguido ora explosivo.

A caminhada de Peaches no Palco Super Bock

Além de cantar com Tigerman, logo no início do concerto, Peaches esteve no Alive!10 para um espectáculo em nome próprio. E sim, muitas vezes foi mais um espectáculo do que um concerto, com a canadiana a dar razão à sua fama de figura provocadora, espevitada e irreverente.
Os trajes minimalistas foram condizentes com a vertente da sua electrónica, mesmo que um concerto não tenha recusado abordagens mais assentes nas guitarras. Mas o que marcou mesmo foram os comentários e atitudes da cantora e performer, em especial quando se atreveu a tentar a proeza de andar sobre as mãos do público. E conseguiu, domando rapidamente os espectadores. "Jesus andou na água, a Peaches anda em vocês", salientou, abrindo em alta uma das actuações mais concorridas e imprevisíveis do Palco Super Bock.

Pelo mesmo espaço passou também a electrónica pulsante dos Simian Mobile Disco, numa actuação tornada rave, ou a abordagem ainda mais maximal, mecânica e vira-miolo de Boys Noize (que se divertiu com temas dos seus dois discos ou a esquartejar canções dos Depeche Mode ou Daft Punk até às 4 da manhã). Antes, o Palco Super Bock ficou entregue ao rock dos Girls, The Big Pink, Sean Riley and the Slowriders ou, em modo mais etéreo, aos Miike Snow.

E para o ano está já confirmada uma nova enchente de música ecléctica no Passeio Marítimo de Algés. A Everything is New anunciou, em conferência de imprensa, que o Optimus Alive! regressa dias 7, 8 e 9 de Julho. Na edição que agora terminou, passaram pelo recinto 112 mil pessoas ao longo de três dias. Espera-se que o cartaz continue a trazer nomes capazes de manter este entusiasmo.

Texto @Gonçalo Sá

Fotos @Vera Moutinho (excepto as dos Pearl Jam, da autoria de Ruben Viegas)