"Vieram-me as lágrimas aos olhos", contou o antigo ministro à agência Lusa. A visita àquele famoso hotel de Xangai, na sexta-feira à noite, fazia parte da viagem de onze dias à China organizada pelo Centro Nacional de Cultura, de Lisboa, com o título "Os Portugueses ao Encontro da sua Historia".

Construído em 1929 na marginal neoclássica de Xangai, o Peace Hotel, ou Cathay, como então se chamava, é um dos ícones da arquitetura ‘art-deco' da cidade. O nome mudou, mas uma "Old Jazz Band" continua a tocar no bar do hotel. "A sala estava cheia, com muitas pessoas à porta, à espera de lugar", disse Roberto Carneiro.

O antigo ministro levava a partitura de um clássico da década de 1950 - "Misty", de Errol Garner - que era também o tema com que Art Carneiro costumava fechar as suas atuações.

A pedido de Roberto Carneiro, a orquestra tocou aquela peça e no final da sessão, o músico mais velho da "Old Band", um saxofonista com 90 anos, veio dizer-lhe que se lembrava do seu pai. "Disse-me que se lembrava do meu pai. Não se conheceram, mas lembrava-se de ter ouvido falar dele", contou Roberto Carneiro.

Art Carneiro, nome artístico de Artur José dos Santos Carneiro, nasceu em Xangai em 1905, filho de uma família portuguesa oriunda de Macau. Estudou engenharia e música, mas ao ingressar numa orquestra americana de jazz, em 1928, a sua vocação ficou definida. Xangai era então uma das cidades mais cosmopolitas do mundo, conhecida como "Paris do Oriente" e "Paraíso dos Aventureiros".

Art Carneiro tocava violino, trompete e mais de uma dezena de outros instrumentos. À frente da sua orquestra, a Art Carneiro Band, o músico português tocou no Jazz Bar do Cathay Hotel e noutro hotel mítico do Extremo Oriente, o Península, em Hong Kong.

Entretanto, o Japão ocupou o litoral da China e após a derrota japonesa, em 1945, a guerra civil chinesa, entre comunistas e nacionalistas, recomeçou.

Depois de uma passagem por Macau, Art Carneiro decide embarcar para Portugal, onde o futuro ministro Roberto Carneiro viria a nascer, em 1947.

Com Luís Villas-Boas e um pequeno grupo de entusiastas, Art Carneiro foi um dos fundadores do Hot Clube de Portugal, um dos mais antigos clubes de jazz europeus, no final da década de 1940.

Na altura, o jazz era "um conceito vago e abrangente que cobria a generalidade da folk-music de origem norte-americana", realça Roberto Carneiro, ministro português da Educação entre 1987 e 1991 e atual presidente do Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa da Universidade Católica Portuguesa.

Art Carneiro morreu em 1963, com apenas 58 anos, mas em Xangai ainda se lembram dele.

A viagem à China do Centro Nacional de Cultura, iniciada dia 1 de setembro em Pequim, termina na quarta-feira em Macau.

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