Ninguém tem dúvidas quando se trata de atribuir aos Tarantula os títulos de banda mais antiga ou mais influente do heavy metal nacional. Com mais de trinta anos de carreira, os Tarantula derrubaram barreiras num país, então, muito isolado culturalmente e com pouco acesso ao que se fazia lá fora. Mostraram que era possível fazer bem, mesmo com poucos recursos e, ao longo dos anos, influenciaram, apoiaram e abriram as portas dos seus Rec’n Roll Studios e escola de música, em Valadares, a várias gerações de músicos/amigos, transformando o espaço num verdadeiro “quartel general” do metal/hard rock nacional. É, por isso, impossível falar da história deste género no nosso país sem mencionar o coletivo Tarantula ou quem lhe dá vida: os irmãos Paulo (guitarra) e Luís Barros (bateria), Jorge Marques (voz) e José Aguiar (baixo). Inspiraram muita gente, deram a mão a outros tantos e foram os primeiros a ir além-fronteiras com o bastião do reino da Lusitânia, afirmando-se no mercado europeu.

É, precisamente, pelo imenso historial que carregam, que se torna ainda mais gratificante falar dos Tarantula versão 2014. Ao contrário do que, infelizmente, acontece em muitos casos, estamos perante uma banda que não se encostou ao nome, limitando-se a viver de velhas glórias e sucessos do passado. Com uma discografia invejável, os Tarantula continuam em movimento, procurando sempre evoluir, atualizar, acrescentar valor, sem perderem de vista a qualidade e a linha orientadora, definida há muito.

Naquela que foi, certamente, uma das noites mais frias do ano, até ao momento, o Montijo, na margem sul do Tejo, aqueceu com a visita dos Tarantula, que prepararam um alinhamento muito diversificado e pronto para agradar quer aos fãs de sempre, quer ao público mais jovem que esteve presente e que começa, agora, a contactar com o quarteto. O metal bar Bota Baixo foi o espaço anfitrião, onde os Tarantula compensaram o palco exíguo com muita comunicação com o público e uma exibição de grande classe.

O álbum “Spiral of Fear”, de 2010, abriu o alinhamento, com o tema homónimo, a que se seguiram “Open Your Eyes”, “Dark Age” e “Afterlife”. Os álbuns anteriores, “Metalmorphosis” (2005) e “Dream Maker” (2000), editados pela alemã AFM Records, estiveram, também, em destaque, e demonstraram toda a versatilidade da banda, que navega entre o hard rock, o metal clássico e as nuances mais power metal e progressivas. Como pano de fundo, o virtuosismo inegável de cada um dos músicos – o baterista Luís Barros não pôde estar presente por motivos profissionais, mas foi muito bem substituído por Pedro Moreira – e uma profunda reflexão social e espiritual sobre o momento atual da Humanidade e para onde caminhamos.

Também não faltaram as habituais covers, com lugar cativo no repertório dos Tarantula, que puseram o público a acompanhar a plenos pulmões – “All Right Now”, dos Free, e “Smoke on the Water”, dos Deep Purple, a mítica banda britânica com quem os Tarantula já tiveram oportunidade de partilhar o palco por diversas vezes.

Hora e meia de grande classe e humildade, que justificam, se tal fosse necessário, a longevidade e o estatuto da banda, que continua com muito para dar e terá novidades num futuro próximo.

O concerto foi aproveitado para promover, também, a reedição em black vinyl e picture disc do clássico “Kingdom of Lusitania”, o segundo longa duração da banda, editado em 1990 e obrigatório para colecionadores e apreciadores de metal nacional.

A noite abriu com os montijenses Venus Flames, quarteto que se movimenta entre influências trash metal dos anos 80, sendo inegáveis as referências a Metallica. Com uma considerável base local de fãs e um invulgar intervalo etário entre os elementos, a banda tem, ainda, muito espaço para crescer e amadurecer, mas o entusiasmo e a entrega são de sublinhar.

Louvável é, também, o esforço dos poucos bares de música ao vivo que continuam empenhados em proporcionar espetáculos e criar oportunidades para que os projetos nacionais possam ganhar experiência de palco e mostrar o seu trabalho, em particular na área do metal. A falta de espaços para música ao vivo é uma grave lacuna em Portugal, que prejudica, em muito, o panorama musical nacional e a construção de mercado e de massa crítica, deixando o público mais jovem sem opções mais abrangentes, à mercê do karaoke e DJ’s, e da ditadura das playlists das rádios generalistas.

Alinhamento Tarantula:

- Spiral of Fear
- Open Your Eyes
- Dark Age
- Afterlife
- Nature of Sin
- You Can Always Touch the Sky
- Changes Coming
- We Go With the Flow
- All Right Now (cover)
- Freedom’s Call
- Not the End
- Dream Maker
- Face the Mirror

Encore:

- Smoke on the Water (cover)

Texto: Liliana Nascimento