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“Esta noite fizemos história”, referiu Valete várias vezes durante a sua atuação, esta sexta-feira, naquele que foi, talvez, o concerto mais marcante do hip-hop português nos últimos anos. O rapper quase encheu o Campo Pequeno, em Lisboa, e trouxe consigo alguns dos melhores nomes do estilo em Portugal. Foi uma boa noite para se sentir o pulso do rap feito em terras lusas e as notícias são animadoras: o género está bem vivo. “Choveu o dia todo e faz muito frio, mesmo assim vocês vieram”, disse o mestre de cerimónias, Valete, ao ver a sala muito bem composta, quase lotada. O músico contou que um jornalista lhe sugeriu que tocasse no Musicbox (um espaço bem mais pequeno) e não na Praça de Touros de Lisboa, “mas eles não sabem quantos nós somos”, gritou Keidje Lima (nome de nascimento do rapper) ao microfone, levando os milhares presentes à euforia. Valete apresentou um set extenso, mas bastante coeso, mostrando que já tem arsenal suficiente para os grandes palcos. A noite começou com “Subúrbios”, do seu segundo disco (“Serviço Público”, de 2006). Valete esteve acompanhado em palco por dois DJs (X-acto e Glue) e pelos seus companheiros de sempre, Bónus e Adamastor, a darem as back lines (apoio vocal nas rimas). O MC entrou exigente e não se coibiu de interromper o primeiro tema a meio por achar que não tinha garra - “quero mais energia nesta merda”, pediu -, para logo a seguir começar a dar tudo o que tinha durante cerca de duas horas. E foi com garra que agarrou a partir daí o público, que veio com o trabalho de casa feito, pois tema atrás de tema cantava e ajudava à festa. Depois de “Subúrbios” seguiu-se “Serial Killer”, um verdadeiro sucesso nas ruas, talvez uma das músicas mais conhecidas de Valete, que nunca teve muita rodagem nas rádios mas que ainda assim colocou toda a plateia a cantar as estrofes e o refrão. Foram muitos os momentos emocionantes vividos no Campo Pequeno, como quando Nuno Lopes Cantou com Valete “Vou-me Embora”, ou em “Mulheres da Minha Vida”, com Orlando Santos no refrão, sem esquecer a “Melhor Rima de Sempre”, em que o rapper canta os altos e baixos da sua carreira, fazendo referência também àqueles que o têm incentivado a continuar. Valete não se limitou aos sucessos passados como “Canal 115”, “Revelação” ou a Mulher que Deus Amou”, apresentou também “Labaredas” uma canção que fará parte do seu próximo álbum, “Homo Líbero”. Neste último tema, que cantou duas vezes, teve como convidado Samora. “Isto é música séria, agora percebem porque o Homo Líbero está a demorar tanto tempo”, disse o rapper justificando o atraso do novo disco. Estiveram também presentes Jimmy P., no tema “Os Melhores Anos” e Sam the Kid, que cantou três temas com Valete - “Presta Atenção”, “Poetas de Karaoke” e “Sopranos”, que também contou com a participação de Regula e Xeg. Valete conseguiu juntar no Campo Pequeno espectadores de todas as idades, dos mais variados estratos sociais e de várias etnias, todos ligados pela música de um artistas que viveu, durante muitos anos, por detrás das suas palavras, mas que em bom tempo resolveu dar também a cara. Foi um concerto marcado pelas rimas, pelas palavras de incentivo e contestação. Mais do que nunca, Valete é um MC consciente: consciente do peso que a sua palavra tem, consciente de que as suas ideias podem fazer a diferença e consciente de que a revolução precisa de um rosto. No final, o cansaço (devido às quatro horas de um espetáculo que contou com a abertura dos Beatbombers, Xeg e Regula) e a satisfação estavam manifestos nos rostos dos fãs. Foi uma aposta ganha não só por Valete, mas por todos os que participaram nesta grande festa do hip-hop luso. Texto @Edson Vital/ Fotos @Inês Alves<

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