Com estreia marcada para o dia 17 no Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa, a peça é protagonizada pelos atores João Nunes Monteiro e Marta Cerqueira, no papel de duas crianças entretidas com os seus brinquedos e separadas por uma linha vermelha.
Na peça, construída praticamente sem texto, as duas personagens entretêm-se com brinquedos que, de uma forma normativa, estão associados a estereótipos masculinos ou femininos: Ele brinca com luvas de boxe, carrinhos, bola de futebol, enquanto ela com um serviço de loiça cor-de-rosa, com um boneco bebé, com sapatilhas de ballet.
Há um momento, porém, em que interagem, começam a experimentar brinquedos um do outro - invadindo o espaço um do outro - e constroem uma pista com uma ponte que ultrapassa e transgride a linha vermelha que os divide.
Foi nesta construção simples em palco, recorrendo simbolicamente aos brinquedos, que a encenadora Catarina Requeijo assentou a ideia de abordar questões sobre género, a pensar num público muito inicial, entre os três e os seis anos.
"Se por um lado é difícil falar destas questões com estas idades, também é nestas idades que podes criar abertura para pensar de outra maneira", disse Catarina Requeijo em entrevista à agência Lusa.
Há duas décadas a trabalhar em teatro para a infância, Catarina Requeijo explicou que fez pesquisa em contexto escolar para perceber melhor o comportamento das crianças enquanto brincam. Do trabalho de campo verificou que, inconscientemente, ainda se prolongam estereótipos. Nas escolas e em ambiente familiar.
"Onde eu acho que as coisas estão mais profundamente enraizadas no pensamento das crianças, e que eu acho que foi mais difícil desmontar, é nos papéis familiares do homem e da mulher. Aí há muito pouca abertura. São as mães que cuidam, são as mães que tomam conta dos bebés. Os pais podem ajudar, se for muito preciso ou se a mãe estiver doente. E acho que em relação a isso há um trabalho grande a fazer", afirmou.
A linha vermelha que divide o palco prolonga-se na plateia. Ao chegar à sala, o público é convidado a sentar-se de forma separada, exatamente como acontece na peça: Meninos para um lado e meninas para o outro, precisamente para lhes provocar questões sobre o assunto.
"Gostávamos que estas crianças saíssem daqui - e sobretudo os adultos que as acompanham -, a pensar que tudo é possível. Que pode haver meninos que gostam de vestidos e meninas que gostam de subir às árvores", sublinhou a encenadora.
A dias da estreia, a atualidade política intrometeu-se na dramaturgia, dada a pertinência do tema. A peça começa com a audição uma frase que a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos do Brasil, Damares Alves, proferiu no passado dia 3: "É uma nova era no Brasil: menino veste azul e menina veste rosa".
Para Catarina Requeijo, a frase - e toda a ideologia associada - justifica a existência deste espetáculo, que é "necessariamente político, não no sentido de partidário, mas é político, é um posicionamento político".
A encenadora acredita que esta é uma das primeiras encenações de teatro em Portugal sobre igualdade de género direcionada para um público tão novo, numa peça onde se promove a ideia de que "rapazes e raparigas podem ser aquilo que quiserem".
"É pró menino e prá menina" estará em cena em Lisboa até ao dia 23, estando previstas oficinas sobre o tema destinadas especificamente para educadores de infância.
Depois de Lisboa, a peça circulará pelo país, estando confirmadas representações em Ovar, Loulé, Guimarães, Almada e concelhos do Vale do Tejo.
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