Ao vivo, o novo disco de Samuel Úria foi, na maior parte das vezes, mais veloz e mais divertido. A noite de apresentação de "O Grande Medo do Pequeno Mundo" no TMN ao Vivo fez-se com muitos amigos, convidados, como Márcia e Tiago Bettencourt, e sala cheia.

"Prelúdio", a primeira faixa do disco, abriu também a noite, com toda a solenidade que um violino - de Miriam Macaia - empresta. Samuel Úria sobe ao palco com um blazer «quitado pela mãe», que viu o concerto na primeira fila, a fazer lembrar a figura de toureiro que dá a capa ao álbum. De resto, nada de formal em todo o concerto, que foi um agradável corrupio de entrada e saída de artistas e instrumentos, para tornar cada música o mais fiel possível à gravação em estúdio.

Só "Essa Voz", logo a segunda, e "Forasteiro" (lá mais para a frente) tiveram outro tratamento. São duas das mais alegres e no TMN ao vivo foram tocadas a um ritmo bem mais rápido, que lhes assentou perfeitamente. A vivacidade do Samuel Úria a cantar as rimas destas duas canções (as letras sem instrumental já são musicais) não deixou dúvidas sobre quanto gosta delas.

Para introduzir os convidados, distribuir agradecimentos ou simplesmente apresentar a canção seguinte, Samuel Úria foi invariavelmente cómico, com tiradas irónicas que nos puseram a sorrir genuinamente. Em pouco mais de hora e meia de espetáculo, conseguiu vestir com distinção as peles de trovador introspetivo, contador de histórias, estrela rock e artista de stand-up comedy. Pudera: sabe medir como poucos o valor de cada palavra e emprega-as, ora na música ora nas piadas, com pleno sentido de oportunidade.

Foi assim quando apresentou Jorge Rivotti, «musicalmente mais talentoso que Sean Connery», e Tiago Bettencourt, que só foi convidado por «cortesia». O primeiro cantou "Deserto", tal como no disco, enquanto abraçava triunfalmente o anfitrião; Tiago Bettencourt acompanhou Úria em "Lamentação" (do álbum "Nem lhe Tocava", de 2009) e cantou a sua "Eu esperei", que arrancou muitos aplausos pelas palavras finais a pedirem para Portugal «acordar». Durante o tema Samuel Úria mostrou toda a capacidade da sua caixa torácica, a prolongar um versos como se fosse um relatador de futebol a festejar um golo do Benfica. Risos e admiração.

A agitação no palco não aconteceu só pela chegada de convidados. Samuel Úria experimentou várias guitarras e um banjo, Silas Ferreira (d'Os Pontos Negros) desdobrou-se entre o órgão e o oboé e, do lado da entrada, treze pessoas constituíram um coro que soube ter o devido destaque em temas como "Espalha Brasas" («Não deixem que as pedras passem a falar por vocês», avisa o artista) e a missal "Água de Colónia da Babilónia". Com tanta gente empenhada e a aconchegar o palco, era difícil correr mal.

Na versão de "trovador introspectivo" não ficou atrás. Com toda a delicadeza, e competente na missão de fazer esquecer Manuel Cruz, que o acompanha no disco, provocou o brilhozinho nos olhos da plateia com "Lenço Enxuto". Baixam as luzes e chega "Armelim de Jesus", com o nome do seu avô e escrita para ele, a competir lado a lado pelo prémio para o momento mais sentimental da noite.

São o «mais especial» casal musical. «Se não o de agora, pelo menos o de sempre», graceja Samuel Úria. Márcia chega acompanhada do seu marido, Filipe da Cunha Monteiro, que ornamentou "Eu seguro" com o lap steel. Era uma das mais aguardadas e claro que foi uma maravilha. É a amizade, com "sustento forte" e "intento puro", o segredo desta colaboração tão inspirada, onde as duas vozes, cruzadas, soam ainda mais doces. Entre um sorriso e outro, de amigos babados, tempo ainda para "O mais humano sentimento são", de Márcia.

O final do concerto foi radicalmente diferente, com a chegada do muito extrovertido Tiago Cavaco (da Flor Caveira), Alex D'Alva Teixeira e músicas mais antigas. Entretanto já tínhamos matado saudades de "Não Arrastes o Meu Caixão" e "Teimoso", e ainda ouvimos "Império", "Rua da Fonte Nova 171", "Barbarella e Barbarala", a ladainha de "O Diabo" com uma roupagem funk e a explosiva "Tigre Dentes de Sabre", que levou ao êxtase total (leia-se: Jónatas Pires a ajoelha-se de olhos fechados a tocar órgão e Samuel Úria salta de guitarra ao peito).

Foi uma noite memorável. À altura do disco e do artista, sem surpresa.

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