"The Knick" é o primeiro projecto após a reforma antecipada de Steven Soderbergh, uma série de prestígio concebida para a Cinemax, um canal de vanguarda da HBO. A título de exemplo, "Contra-Ataque" e "Banshee", provavelmente as melhores séries de ação do momento, são originárias desse canal.
Com uma performance «vintage», Clive Owen interpreta um cirurgião torturado pelas suas escolhas de vida num hospital na baixa de Manhattan na viragem do século XX. Os hábitos extra-curriculares deste anti-herói passam pelo salão de ópio, bordéis e cocaína, mas apesar deste poço de defeitos, o doutor Dr. John W. Thackery é extraordinário com um bisturi nas mãos.
O Knickerbocker é um hospital com a corda na garganta que sobrevive graças aos seus patronos e à resiliência dos seus paramédicos “pré-históricos”, irlandeses que roubam os doentes, se necessário à paulada, de outras carruagens ambulâncias de Nova Iorque. Neste lugar a cura é mais perigosa do que a doença, isto se alguém sobreviver à cirurgia.
O hospital é dirigido por uma administradora com ideias de inclusão racial num lugar onde o «staff» é branco e as mulheres existem para auxiliar e não serem ouvidas. As operações são dignas de um episódio de "The Walking Dead", encenadas num anfiteatro que assume um cariz de espectáculo ao vivo entre a vida e a morte, com o doutor a prolongar o inevitável na existência humana.
Steven Soderbergh, que também filmou a ação, capta todos os aspectos da medicina em 1900: o lado analítico, físico e cerebral num hospital que trata imigrantes numa constante luta entre o progresso e a burocracia. O ambiente no interior do hospital é asséptico, a cidade de Nova Iorque é cinzenta, suja e caótica, a direção de arte e a pesquisa histórica dos argumentistas Jack Amiel, Michael Begler e Steven Katz sente-se em cada plano. E num objeto que aborda temas futurístas com os avanços da medicina, a música de Cliff Martinez, que colaborou em oito filmes de Soderbergh, enfatiza toda a atmosfera surreal com os sons de sintetizadores que tornam a história e o cenário ainda mais deslocados da realidade vigente.
"The Knick" é visceral nas suas emoções e, especialmente, na sua estética visual, que não esconde nada do espectador, sendo pouco aconselhável a estômagos mais sensíveis. E é altamente aconselhável a quem aprecia a arte do pequeno ecrã. Uma das melhores séries de 2014.
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