"Uma enorme dor por Pino Solanas. Faleceu enquanto cumpria as suas obrigações como embaixador da Argentina na Unesco", disse o ministério no Twitter. "Será lembrado pela sua arte, pelo seu compromisso político e pela sua ética sempre ao serviço de um país melhor", acrescentou.
Solanas tinha anunciado no Twitter, no dia 16 de outubro, que ele e sua esposa, Ángela Correa, tinham contraído COVID-19 na capital francesa, onde se encontra a sede da Unesco, e que ele estava internado em observação. Na imagem que acompanhava a mensagem, o cineasta aparecia num leito de hospital e com máscara.
Cinco dias depois, o realizador premiado afirmou que o seu estado era "delicado", mas que ainda "resistia". Foi a sua última mensagem na rede social.
Solanas foi um cineasta comprometido, revolucionário e prolífico e também um político apaixonado e perseverante.
Em 1992 foi eleito senador pela cidade de Buenos Aires e um ano depois foi deputado pela Frente Grande. Também foi candidato à presidência em 2007 pelo movimento Projeto Sul, progressista, ambientalista e de centro-esquerda, em aliança com o Partido Socialista Autêntico. Em junho de 2019, anunciou que faria parte da Frente de Todos e endossou a campanha presidencial de Alberto Fernández e Cristina Fernández.
Nascido a 16 de fevereiro de 1936 em Buenos Aires, Solanas estreou-se no cinema em 1962, com a curta "Seguir andando". Em 1967 dirigiu o documentário "La Hora de los Hornos", trilogia co-dirigida com Octavio Getino, com duração de mais de quatro horas, que se tornou um símbolo do cinema politicamente comprometido, de denúncia e resistência à ditadura.
Solanas dirigiu também, entre outros, "Perón: Actualización política y doctrinaria para la toma del poder", entrevista com Juan Domingo Perón, que se tornou um documento reverenciado pelos jovens peronistas da época.
O seu documentário "Memoria del saqueo", sobre a precária condição social e económica da Argentina, foi apresentado no Festival de Cinema de Berlim em 2004, o mesmo ano em que Solanas recebeu o Urso de Ouro honorário como reconhecimento pela sua carreira.
"El exilio de Gardel (Tangos)", de 1985, foi premiado no Festival de Veneza, e Solanas recebeu o prémio de melhor realizador no festival de Cannes pela sua longa-metragem "Sur", em 1988.
O falecido realizador é co-autor do manifesto "Hacia un Tercer Cine", movimento latino-americano que surgiu na década de 1960 em oposição a uma linguagem cinematográfica dominante, comercial e ditada principalmente pelos Estados Unidos.
"A luta anti-imperialista dos povos do Terceiro Mundo, e dos seus equivalentes nas metrópoles, constitui hoje o eixo da revolução mundial. O Terceiro Cinema é para nós aquele que reconhece nessa luta a mais gigantesca manifestação cultural, científica e artística do nosso tempo, a grande possibilidade de construção por cada povo de uma personalidade libertada: a descolonização da cultura", afirmavam Solanas e Octavio Getino, co-signatários deste manifesto.
No início de outubro, Solanas encontrou-se com o papa Francisco no Vaticano, uma das suas últimas atividades públicas, para discutir projetos de luta "contra as mudanças climáticas e os direitos da Terra", segundo o próprio Solanas no Twitter.
A sua morte começou a suscitar mensagens sinceras de condolências nos círculos políticos e culturais. Muitos se lembraram do discurso que proferiu em 2018, como senador, quando um projeto de lei sobre o aborto foi rejeitado pela Câmara alta após uma histórica mobilização feminista nas ruas do país.
"Vamos acabar com a hipocrisia de uma classe dominante de que sabendo que as mais ricas podem fazer abortos seguros, deixam as menos ricas condenadas à infeção ou à morte", disse Solanas na altura.
"Bravo meninas, vocês elevaram a honra e a dignidade da mulher argentina. Se não sair hoje, no ano que vem vamos insistir. E se não sair no ano que vem, vamos insistir no outro. Ninguém vai conseguir parar a onda da nova geração", disse ele.
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