Os atores e argumentistas de Hollywood juntam forças nos piquetes a partir de sexta-feira, após o sindicato Screen Actors Guild (SAG-AFTRA) não ter chegado a acordo com a Aliança de Produtores de Cinema e Televisão (AMPTP), a organização que representa os grandes estúdios e plataformas de Hollywood, como Disney, NBCUniversal, Paramount, Sony, Warner Bros. Discovery, Netflix, Amazon e Apple.
Será a maior paralisação da indústria em 63 anos: é a primeira vez que os dois sindicatos entram em greve simultaneamente desde 1960, quando o ator (e futuro presidente dos EUA) Ronald Reagan liderou os protestos.
Uma das principais queixas dos atores diz respeito à queda nos pagamentos conhecida como "residuals".
As quantias substanciais que os artistas costumavam receber quando programas ou filmes de sucesso onde participaram passavam na televisão praticamente desapareceram porque as plataformas de streaming hoje recusam divulgar os seus números de audiência.
Em vez disso, as plataformas pagam a mesma taxa fixa para todos os programas disponíveis nas suas plataformas, o que pode significar um pequeno retorno para um sucesso global.
Para dificultar ainda mais o panorama, há a questão da inteligência artificial. Tanto os atores como os argumentistas querem garantias para regular o seu uso futuro, mas os estúdios até agora recusaram-se a ceder.
O que significa este "duplo golpe" para a Tinseltown e a "fábrica dos sonhos"?
As grandes estrelas vão entrar em greve?
Entre os 160 mil membros do SAG-AFTRA estão muitas das maiores estrelas do mundo.
A lista A de Hollywood, de Tom Cruise a Angelina Jolie e Johnny Depp, são membros sindicais com cartão de membro.
Estrelas como Meryl Streep, Jennifer Lawrence, Ben Stiller e Colin Farrell manifestaram-se publicamente a favor de uma greve.
Na quinta-feira ao fim da tarde, as estrelas de "Oppenheimer" abandonaram a antestreia em Londres alguns minutos antes do início da conferência de imprensa do Sindicato em Los Angeles.
O evento foi antecipado uma hora e pela passadeira vermelha para darem pequenas entrevistas passaram Cillian Murphy, Emily Blunt, Matt Damon, Robert Downey Jr., Florence Pugh, Josh Hartnett, Rami Malek, Kenneth Branagh, James D’Arcy, Tom Conti, Jefferson Hall, David Dastmalchian e Trond Fausa Aurvåg, mas já não acompanharam o realizador Christopher Nolan ao palco no interior da sala.
Mas vamos vê-los nos piquetes à frente dos estúdios?
"Haverá visibilidade das grandes estrelas", disse `France-Presse o advogado da indústria do entretenimento, Jonathan Handel.
"Mas esta greve não é para trazer mais dinheiro para as pessoas que já têm milhões", salientou.
As grandes estrelas não têm ganhos financeiros com a greve, porque os seus agentes negociam contratos individuais com estúdios que excedem em muito os mínimos sindicais que estavam a ser negociados.
Ainda assim, a presença deles pode "iluminar mais os estúdios, para chegar à mesa de negociações com um acordo justo", disse o ator Dominic Burgess.
Como as greves afetam filmes e programas?
As produções de Hollywood já desaceleraram significativamente desde que a greve dos argumentistas foi convocada a 2 de maio.
Programas com argumentistas finalizados, como "O Senhor dos Anéis: Os Anéis do Poder", puderam continuar a ser filmados este verão, embora sem nenhum argumentista no set.
Mas sem atores, as únicas produções norte-americanas que podem continuar são uma mão-cheia de telenovelas - que têm um contrato diferente - e 'reality shows' e programas de jogos.
Por esse motivo, a Fox revelou esta semana uma programação de outono cheia de séries sem argumento, como "Kitchen Nightmares" e "Lego Masters".
Os atores também deixam de poder promover os seus filmes e participar em eventos com eles relacionados, como antestreias e festas.
Em causa fica já a enorme reunião anual de cultura pop da Comic-Con em San Diego na próxima semana e o lançamento do novo filme "Mansão Assombrada" na Disneyland, que já se previa que seria reduzido a um "evento privado para fãs".
A cerimónia dos Emmy, a versão televisiva dos Óscares, prevista para 18 de setembro, também ponderava um adiamento para novembro ou mesmo para o ano que vem.
Os lançamentos de filmes são menos afetados no imediato, devido ao longo intervalo entre o final das filmagens e o início da exibição nos cinemas.
Mas quanto mais longa a greve, maior o impacto nos lançamentos dos filmes.
Os principais estúdios de Hollywood já reformularam os seus calendários de lançamento. Por exemplo, a Disney recentemente adiou vários filmes de super-heróis da Marvel, espalhando-os por um período de tempo mais longo.
O SAG-AFTRA sugeriu que poderia oferecer isenções para não afetar filmes menores e verdadeiramente independentes.
As produções estrangeiras serão afetadas?
O SAG-AFTRA é um sindicato de trabalho norte-americano, com sede em Los Angeles.
Mas isso não significa que o impacto da greve ficará confinado às fronteiras dos EUA.
"Quando os atores do SAG-AFTRA estão a trabalhar num filme que está a ser rodado na Europa, Austrália, Ásia ou onde quer que seja, eles terão que parar de trabalhar", explica o advogado Jonathan Handel.
A greve também impede os membros de promover filmes e séries, o que significa que estreias e importantes festivais de cinema de outono, como Veneza e Toronto, serão afetados, a menos que a greve termine.
No atual estado de coisas, "se um filme foi filmado com atores do SAG-AFTRA, os atores não podem promovê-lo no Festival de Cinema de Veneza" marcado para começar no fim de agosto, explica Handel.
Quanto tempo vai durar a greve?
Os argumentistas já estão nos piquetes há 11 semanas.
Mas, historicamente, as greves de Hollywood variam muito em duração - de vários meses a pouco mais de três horas.
Portanto, quanto tempo vai durar esta paralisação?
"Isso é com eles. Estamos disponíveis para conversar com eles esta noite!" disse uma otimista presidente SAG-AFTRA Fran Drescher, na conferência de imprensa de quinta-feira, referindo-se aos estúdios.
"Depende deles estarem disponíveis para conversar de uma forma normal que honre o que fazemos", acrescentou.
Handel previu que as greves durarão pelo menos até ao outono.
"Isto vai arrastar-se e não é facilmente resolvido, porque ambos os lados veem isto como existencial", disse ele.
"Há muita amargura entre os argumentistas e os estúdios, e os atores e os estúdios", salientou.
Qual é o impacto económico?
Da contabilidade ao 'catering' e aos transportes, muitas empresas estão ligadas à indústria do entretenimento.
Isto torna o impacto financeiro de uma greve em Hollywood difícil de calcular, mas incontestavelmente enorme.
"Há 15 anos, quando os argumentistas estavam em greve - foi uma greve de 100 dias - e a estimativa era de pouco mais de dois mil milhões de dólares. Isso significa 20 milhões por dia", disse Handel.
Ajustado pela inflação, representa quase 30 milhões de dólares por dia perdidos só na Califórnia, notou.
"Acreditem em mim, o nosso coração sangra por termos que tomar esta decisão", disse Fran Drescher na conferência de imprensa.
"Mas não podemos deixar de conseguir o que estes membros merecem, porque só vai piorar. Foi aqui que traçamos a linha na areia e é uma coisa terrível de se fazer. Mas fomos forçados a isso", explicou a líder sindical e a recordada estrela e co-criadora da comédia dos anos 1990 "The Nanny".
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