Fiel à sua tendência para fazer declarações polémicas, o realizador dinamarquês
Lars Von Trier agitou o Festival de Cinema de Cannes ao afirmar esta quarta-feira que compreendia e sentia «um pouco» de compaixão por Adolf Hitler, quando questionado sobre as suas raízes alemãs durante a conferência de apresentação de
«Melancholia», o seu último filme que está a concorrer à Palma de Ouro deste ano.

Falando à imprensa ao lado de
Kirsten Dunst, que protagoniza o filme, Von Trier declarou entender o líder nazi.

«Eu queria muito ser um judeu mas depois descobri que, na verdade, era nazi. Sabem, porque a minha família era alemã, Hartmann, o que também me dá um certo prazer», declarou, respondendo a uma pergunta sobre a origem alemã de sua família.

«Eu compreendo Hitler. Acho que ele fez algumas coisas erradas, sim, com certeza, mas eu consigo vê-lo sentado no seu bunker no final», afirmou o cineasta.

Quando
Kirsten Dunst, que também tem origem alemã, arregalou os olhos, claramente desconfortável com os comentários do realizador, e murmurou para
Charlotte Gainsbourg, com quem contracena em «Melancholia», um assustado «Oh, meu Deus, isso é terrível», Von Trier tentou acalmá-la: «mas há um propósito no fim disto».

«Estou apenas a dizer», tentou explicar Von Trier, «que acho que entendo este homem. Ele não é o que se poderia chamar de um tipo porreiro, mas sim, eu entendo muito a seu respeito, e sinto por ele um pouco de compaixão, sim. Mas vamos lá, não sou a favor da Segunda Guerra Mundial e não sou contra os judeus».

Sob o olhar incrédulo dos repórteres, aparentemente ainda não satisfeito, o cineasta concluiu a sua declaração com uma crítica a Israel e um elogio a
Albert Speer, arquitecto oficial do Terceiro Reich.

«É claro que gosto muito dos judeus mas não demais, porque Israel é uma ‘pedra no sapato’. Mesmo assim - como é que eu termino esta frase? - eu apenas gostaria de dizer, sobre a arte, que gosto muito de Speer», afirmou, destacando o «talento» do arquiteto nazi, condenado por crimes contra a humanidade.

«O.K., sou um nazi», disse Von Trier, encolhendo os ombros e deixando escapar um riso nervoso.

Em seguida, ele revelou que o seu próximo filme poderia ser «A Solução Final», termo usado pelos nazis para designar o Holocausto.

Segundo a revista especializada The Hollywood Reporter, von Trier transformou-se no «Mel Gibson de Cannes», em alusão às conhecidas posições anti-semitas e sexistas do actor nos últimos anos.

«Von Trier nunca foi muito P.C. (politicamente correto) e estas entrevistas coletivas de Cannes acabam sempre por se revelar um pouco teatrais, mas na conferência de 'Melancholia', ele levou a questão para um novo nível, atirando uma granada em qualquer senso de decoro público», destacou. «Se isto fosse a América, e não Cannes, teria sido um suicídio profissional», sentenciou.

Na terça-feira, Gibson faltou à conferência de imprensa em Cannes do seu novo filme, «The Beaver», alegando um compromisso anterior em Los Angeles, porém mais tarde apareceu no tapete vermelho com a sua realizadora, Jodie Foster.

SAPO/AFP