A HISTÓRIA: Após 20 anos de casamento, Maria decide ir embora e muda-se para o quarto 212 do hotel em frente à sua casa. Daí consegue escrutinar o seu apartamento, o seu marido, o seu casamento, e questiona-se se terá tomado a decisão certa.

"Quarto 212": nos cinemas a 4 de junho.


Crítica: Hugo Gomes

“Ele percorreu 400 quilómetros para chegar a ela. Ele vai atravessar o Canal. Eu, nem consigo atravessar a rua para te ter de volta.”: esta é uma frase de “Welcome – Bem-Vindo”, um filme de Philippe Lioret que passou discretamente nos nossos cinemas em 2009 e lidava com a questão dos migrantes. No centro, estavam os conflitos matrimoniais de uma personagem nativa (Vincent Lindon), que demonstrava admiração pelo rapaz refugiado que acolhera.

Porquê falar desta obra para seguir em frente com o mais recente trabalho de Christophe Honoré? Fácil: em “Quarto 212” é a “pequena” distância, mais relativa do que factual, que se torna no grande antagonista do seu debate interno.

Quando Richard (Benjamin Biolay) descobre que a mulher, Maria (Chiara Mastroiani), tem um caso com um homem bem mais jovem do que ele, o diálogo diplomático é traído com o afastamento. É que Maria sai de casa e atravessa a rua para ficar hospedada num hotel, um quarto com vista para a sua “vida passada”.

A um passo de separar, todo o passado de ambos, por um fenómeno inexplicável, adquire literalmente uma vida própria, confrontando estes dois amantes perdidos no tédio dos 20 anos de matrimónio. É como se o "Conto de Natal" de Charles Dickens encontrasse refúgio nas prosas burguesas de um cinema que tenta desvendar aquilo que as personagens sentem de uma forma intelectualizada.

Por esses toques, “Quarto 212” constrói-se através de um dispositivo fantástico que contagia o enredo e a sua verosimilhança em prol de uma introspeção de relações e tempos precisos. No fim de contas, a distância é novamente protagonista de um desconcerto de corações.

Os fantasmas dos amores longínquos (uma ponte feita pelo cada vez mais requisitado Vincent Lacoste), a vontade personificada com sósias de Charlez Aznavour e a luxuria materializada nos adúlteros corpos da tentação trazem outra camada a esse dispositivo.

Como fez no seu (ainda imbatível) "As Canções de Amor" (2007), Christophe Honoré está de volta ao destino radical como inconvencional noção de felicidade e ao "happy end". Por aqui encontramos os remanescentes do calor artificial desse romantismo parisiense. Um teste para nos fazer acreditar no cinema enquanto ode dos nossos afetos e relações. Ou seja, romantismo à francesa.

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