O produtor musical e compositor Quincy Jones morreu no domingo à noite, aos 91 anos, disse hoje o assessor do artista.
De acordo com o seu assessor, Arnold Robinson, Jones morreu na sua casa, no bairro de Bel Air, em Los Angeles, rodeado pela família.
“Esta noite, com o coração cheio, mas partido, devemos partilhar a notícia da morte do nosso pai e irmão Quincy Jones”, afirmou a família em comunicado.
“E embora esta seja uma perda incrível para a nossa família, celebramos a grande vida que viveu e sabemos que nunca haverá outro como ele”, referiu a nota.
Vencedor de 28 Grammys, Jones foi um dos primeiros executivos negros a prosperar em Hollywood e a acumular um extraordinário catálogo musical que inclui alguns dos momentos mais ricos da música norte-americana.
Entre um vasto legado, incluindo a colaboração com Frank Sinatra, Ray Charles e centenas de outros artistas, enquanto produtor, a sua carreira é indissociável de Michael Jackson nos três álbuns que são considerados o auge da carreira do cantor: "Off the Wall”, "Thriller" e "Bad".
No cinema, foi nomeado sete vezes para os Óscares, incluindo a primeira vez para um compositor negro na categoria de Melhor Canção pelo tema 'The Eyes Of Love', do filme "Um Homem em Leilão" (1967).
A lista de créditos inclui filmes como "O Agiota" (1964), o Óscar de Melhor Filme "No Calor da Noite" (1967), "A Sangue Frio" (1967), "Um Golpe em Itália" (1969), "Bob, Carol, Ted e Alice" (1969), "A Flor do Cacto" (1969), "A Sorte Viajou de Barco" (1970), "O Dossier Anderson" (1971), "Tiro de Escape" (1972), "O Feiticeiro" (1978), "Get Rich or Die Tryin' - Vencer ou Morrer" (2005) e as duas versões de "A Cor Púrpura" (1985 e 2023).
A 12 de junho, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas anunciou Jones como um dos contemplados com o Óscar honorário na 15.ª cerimónia dos Governors Awards, marcada para 17 de novembro em Los Angeles.
Uma lenda da música americana
Tocou com Ray Charles, dirigiu Frank Sinatra, produziu Michael Jackson e lançou Will Smith: Quincy Jones era uma lenda da música americana.
“Por favor, deixe o seu ego de parte!”: a aura de “Q” era tal que ele se podia permitir receber com estas palavras personalidades como Bob Dylan, Tina Turner ou Stevie Wonder.
Estávamos em 1985 e o produtor tinha a difícil tarefa de conseguir cerca de 30 estrelas para cantarem juntas no 'supergrupo' “USA for Africa”.
“We are the world”, uma canção de caridade para a luta contra a fome na Etiópia, tornar-se-ia uma das 45 mais vendidas da história, com mais de 20 milhões de cópias vendidas.
Quincy Jones estava então no auge de sua glória. Uma jornada imensa para o músico nascido na periferia de Chicago a 14 de março de 1933.
Era muito jovem quando a sua mãe, esquizofrénica, foi internada num asilo psiquiátrico. O seu pai, carpinteiro, divorciou-se e mudou-se para Seattle, onde constituiu nova família.
O jovem Quincy imaginou o destino de um gangster quando, aos 11 anos, tocou piano pela primeira vez. “Toquei apenas uma nota e isso mudou minha vida”, recordaria.
Continuando com o trombone e o trompete, começou a vasculhar os clubes locais. Aos 14 anos, conheceu Ray Charles, dois anos mais velho.
“Tínhamos que tocar toda a variedade da época, ritmo e blues [R&B], a música dos stripteases, polca... Depois, juntávamo-nos e tocávamos bebop a noite toda. Estava a tentar fazer tudo soar bebop e Ray disse 'Não, tens que aceitar a música pela sua alma profunda'. Foi uma bênção”, disse nas suas memórias.
Produção e música de filmes
Uma mente aberta foi o que também lhe ensinou a famosa pianista Nadia Boulanger quando se mudou para Paris em 1957.
Na França, o jazzista, que já havia tocado com Dizzy Gillespie, Duke Ellington e Count Basie, conheceu Stravinsky e Messiaen, e trabalhou com Henri Salvador, Jacques Brel e Charles Aznavour.
Mais tarde, colaboraria com Nana Mouskouri e também com João Gilberto, ou com o mestre do tango argentino Astor Piazzolla.
Enquanto o movimento pelos direitos civis estava em pleno andamento na América, Quincy Jones descobriu um novo reconhecimento na Europa.
“Na década de 1950, Paris era uma cidade fantástica para músicos negros americanos. Aqui, ao contrário dos EUA, encontrámos tolerância e curiosidade pelo nosso trabalho.”
Regressando ao seu país natal, em 1961 torna-se o primeiro afro-americano a alcançar um cargo de gestão na indústria discográfica, como vice-presidente da Mercury Records.
Três anos depois, compôs a música para o filme “O Agiota” (1965), de Sidney Lumet, novamente a primeira vez para um artista negro. Assinaria mais cerca de 30 outros trabalhos no cinema.
Paralelamente, continuou o seu trabalho como arranjador e maestro, nomeadamente ao lado de Frank Sinatra, de quem se tornou colaborador regular.
O astronauta Buzz Aldrin até levou o seu arranjo de “Fly me to the moon” para a primeira viagem à Lua.
O álbum mais vendido da história
Em 1978, teve um encontro crucial: Michael Jackson, que procurava emancipar-se do universo Motown.
Jones entrou definitivamente na lenda ao produzir os seus três melhores álbuns: “Off the wall” (1979), “Bad” (1987) e principalmente “Thriller” (1982), o álbum mais vendido da história, com mais de 100 milhões de cópias.
No entanto, o trompetista não esqueceu as suas raízes e em 1991, convenceu Miles Davis a revisitar os seus clássicos para um concerto histórico no festival de jazz de Montreux (Suíça), do qual era então diretor artístico.
Quincy Jones, que participou em mais de 400 discos, recebeu 28 prémios Grammy durante a sua vida.
Pau para toda obra, também produziu filmes ("A Cor Púrpura", de Spielberg, 1985), séries ("O Príncipe de Bel-Air", que lançou Will Smith em 1991), criou a "Vibe", revista de referência pelas culturas urbanas, e criou a “Qwest TV”, uma espécie de “Netflix do jazz”.
Casado três vezes, teve sete filhos. Numa entrevista à revista GQ em 2018, causou polémica ao gabar-se que tinha 22 companheiras em todo o mundo, falava 26 línguas e tinha feito um tratamento na Suécia que lhe permitiria viver até aos 110 anos.
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