O espetáculo, a apresentar na sexta-feira e no sábado, marca o regresso de Kat Válastur aos trabalhos a solo, como coreógrafa e intérprete, sete anos depois da estreia de “Gland”, com que explorou diferentes planos de narrativa, envolvendo público e um cenário mínimo, a que contrapõe agora um percurso sobre mulheres, num palco cheio de elementos, cruzando séculos de histórias, que desaguam na contemporaneidade.

“Eye, Lash!” apela aos “espíritos das mulheres do passado e do presente que foram oprimidas, marginalizadas, abusadas, queimadas ou decapitadas”, com o espaço do espetáculo a transformar-se num lugar “potencial de poder, carregado de transcendência e espiritualidade”, segundo a apresentação da obra.

Para “a construção do eu e da identidade” em que se afirma “Eye, Lash!”, Kat Válastur “materializa” a memória de mulheres como a freira francesa Marguerite Porete, do século XIII, autora de “O espelho das almas simples”, condenada à fogueira, por heresia, nos primeiros anos de 1300.

A partir do quadro de Paul Delaroche “A execução da Lady Jane Gray”, toma igualmente a memória da rainha adolescente que ocupou o trono inglês durante nove dias, no século XVI, até ser levada para a morte.

A estas, junta a mutante Monkey, que comunica com os mortos, no filme “Stalker”, de Andrei Tarkovsky.

Sobre a estreia de “Eye, Lash!”, em Berlim, no passado dia 04, a imprensa alemã recordou como, nas suas obras, Kat Válastur “criou tantas vezes mundos estranhos, inspirados na mitologia e em rituais arcaicos", fazendo agora apelo a "fantasmas de mulheres", num “jardim mágico”, como escreve a revista cultural Prinz, de edição digital.

Uma zona coberta de lajes quadradas, das quais saem flores e arbustos, revela-se uma ilha no meio da água que avança até ao limite do palco, descreve a revista. Neste cenário, “tudo acontece a partir da escuridão, uma escuridão a que, no final, tudo regressa”.

No início, é a respiração de Válastur que dá sinal das muitas vidas que evoca, antes de os movimentos se multiplicarem por “um número infinito de figuras”, como se fossem fantasmas a apoderar-se do seu corpo.

“O que também é fascinante nesta peça” – prossegue a revista – “é Kat Válastur aceder ao presente, a partir de imagens e rituais antigos e de visões pós-apocalípticas, vindas da ficção científica”, acabando assim por revelar “uma mulher do presente”, na partilha de “memórias com mulheres do passado e visões de mulheres do futuro”.

“As coreografias [de Válastur] demonstram como os corpos são sujeitos ao poder e a forma como lentamente se transformam em fonte de resistência”, escreve a crítica alemã sobre a coreógrafa.

“Até onde posso ir ao dançar? Até que ponto pode uma dança levar-me?”, interroga-se Válastur, nas notas que publica no seu ‘site’, aludindo aos "campos de forças" do seu trabalho, para mais à frente responder: “Persisto no corpo como meio através do qual procuro exprimir-me. Não eu mesma, como uma identidade, mas como alguém que coloca questões sobre o que torna a identidade profunda”.

Nascida em Atenas, Kat Válastur fixou-se em Berlim, onde trabalha como coreógrafa e ‘performer’, e na produção de obras em vídeo, como a primeira versão de “Eye, Lash!”, concluída durante o confinamento, ou instalações que por vezes acompanham as suas atuações em palco, como “Ultra Censored” e “Stellar Fauna”.

Formada na Escola Helénica de Dança, de Atenas, e nos Estúdios Trisha Brown, de Nova Iorque, Válastur fez um mestrado em dança no Inter-University Centre de Berlim, onde se fixou.

“Eye, Lash!” marca o regresso de Kat Válastur a Portugal, depois ter apresentado “Lang”, em Serralves, no Porto, em setembro de 2019, no âmbito do programa “O Museu como Performance”.

Em junho do ano passado, desenvolveu o projeto “The FarNear”, numa residência artística n’O Espaço do Tempo, em Montemor-o-Novo.

Os seus trabalhos têm sido apresentados nas principais salas europeias de cidades como Berlim, Paris, Viena, Madrid, Atenas e Basileia.

“Eye, Lash!” tem música de Stavros Gasparatos. É uma coprodução do centro teatral de Berlim HAU Hebbel am Ufer, e do projeto "December Dance", do Concertgebouw de Amesterdão e do Cultuurcentrum de Bruges, na Bélgica.

No CCB, tem sessões na sexta-feira, às 21h00 e, no sábado, às 19h00.

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