É o caso de Raquel Lima, com formação superior e pós-graduação na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE), no Porto: atriz, cantora e assistente de sala nos teatros S. João e Carlos Alberto, Raquel Lima não tem qualquer apoio do Estado para sobreviver.

Por isso, com o trabalho de atriz ou de música e cantora no sexteto vocal que integra, Raquel Lima é obrigada a fazer de tudo um pouco para sobreviver.

Já trabalhou em restaurantes, em cafés, já foi modelo de cabeleireiro e chegou a fazer traduções de legendagens para o Youtube, como contou à Lusa.

Amante da profissão que abraçou – atriz – e consciente de que se trata de uma profissional de um setor “cheio de carências”, Raquel não evita trabalhos noutras áreas para poder fazer aquilo que a apaixona.

Daí que não se importe de “agarrar qualquer biscate, desde que o dinheiro que ganhe não lhe faça perder tempo”.

Como assistente de sala, “pode ver os espetáculos que o dinheiro que ganha como atriz não lhe permite”.

Descontente com a situação que o setor atravessa com a pandemia de covid-19 que assola o país, Raquel Lima deixa um apelo ao Ministério da Cultura para que termine, de vez, a elaboração do estatuto do ‘intermitente’: “Só este [estatuto] permite melhorar a vida dos artistas, que é um viver constante na corda bamba”.

Agora sem trabalho, Raquel resta-lhe esperar por melhores dias, como muitos outros artistas.

A vida de Lara Mesquita não é muito diferente. Residente no Barreiro, a atriz com formação superior também viu o seu projeto atirado para um futuro sem data devido à pandemia. Mas como o teatro não lhe garantia a subsistência, viu-se obrigada a trabalhar numa loja.

E foi este trabalho que lhe permitiu agora ter dinheiro para comer. Não conseguiu entrar para o quadro, porque esta entrou em ‘lay-off’, mas a prestação do subsídio de desemprego garantiu-lhe o dinheiro necessário para comer e pagar as contas.

Ter a sobrevivência garantida trouxe-lhe, porém, um senão: Não se pode candidatar a subsídios para os projetos artísticos por já estar a receber uma prestação social.

Técnico de vídeo e projecionista, Cândido Lopes, residente no Porto, é outro dos afetados pela pandemia de COVID-19, encontrando-se sem trabalho neste segundo confinamento.

Com família e filhos, Cândido Lopes tenta sobreviver com os escasso 219 euros que lhe são pagos pela Segurança Social.

O pagamento de algumas despesas vai sendo atirado para quando tiver trabalho. Tanto o pagamento à Segurança Social, como a renda de casa. Porque a quantia que recebe da Segurança Social permite-lhe apenas a compra de bens de primeira necessidade e garantir o pagamento da água e da luz, como disse à agência Lusa.

“O resto das contas está todo a acumular-se e só pode ser pago quando tiver dinheiro, que nem sei bem quando vai ser”, disse.

“Esta pandemia veio mostrar o caos que é a vida dos artistas e dos criadores, e não é justo, porque não estamos assim por não querermos trabalhar”, sustentou.

Como forma de evitar “uma maior pobreza” do que a que está afetar a grande maioria dos artistas, Cândido Lopes defende que o Estado devia permitir que estes não pagassem Segurança Social quando estão sem trabalhar.

A vida atual do ator Simão Luís apresenta características semelhantes: Com os dois projetos que tinha em carteira em suspenso, Simão Luís não pode sequer candidatar-se a subsídios, porque em fevereiro de 2020 fechou a atividade como trabalhador independente.

“Isso impede-me de me candidatar ao que quer que seja”, disse, garantindo que a sobrevivência lhe fica apenas garantida pela família.

E há colegas que tiveram que abdicar da casa e voltar a casa dos pais; mesmo casais, em que ambos eram artistas, viram-se confrontados com o regresso a casa dos familiares para poderem garantir a sobrevivência, contou.

Artista a título individual, Diana Sá diz que, “apesar de tudo, teve sorte”.

Vive tempos complicados, mas não é das que estão pior, porque conseguiu dar aulas numa escola do ensino básico durante algum tempo no ano passado e conseguiu realizar dois projetos.

Como no primeiro confinamento teve um pequeno apoio da Fundação Calouste Gulbenkian e outro da GDA (Gestão dos Direitos do Artistas), neste confinamento optou por tirar um certificado de competências pedagógicas que lhe permite trabalhar como formadora.

Além disso, também tinha conseguido ficar selecionada para uma ´open call` em Guimarães, cidade a que está ligada como artista.

A pandemia “veio expor fragilidades do setor cultural que já existiam; agora apenas se agravaram”, sublinhou, frisando que é importante que se avance na concretização do estatuto do profissional da Cultura.

Apesar de tudo, Diana Sá está “otimista” e acredita que a pandemia de covid-19 “vai fazer mudar alguma coisa no setor cultural e que se vai repensar todo o modelo e toda a política cultural que existiu até aqui”.

Diana Sá espera, porém, que o futuro não passe pelo ´online’.

“É uma opinião muito pessoal, mas, para mim, o teatro online não é teatro”, frisou, alegando que há que se descobrir outras formas.

Os dois primeiros casos de pessoas infetadas em Portugal com o novo coronavírus foram anunciados a 2 de março de 2020, enquanto a primeira morte foi comunicada ao país a 16 de março. No dia 19, entrou em vigor o primeiro período de estado de emergência de 15 dias, que previa o confinamento obrigatório e restrições à circulação na via pública em Portugal continental.

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