"Através da ficção, o autor revela, no universo da sua obra, a complexidade das relações humanas em planos dificilmente acessíveis a outros modos do discurso. Muitas vezes essa revelação é agreste e incómoda, e não é raro que aborde temas considerados tabu. Essa possibilidade dá-se no uso rigoroso de uma linguagem cuja plasticidade se imprime em diferentes registos discursivos verificáveis numa obra que privilegia a densidade acima da extensão", lê-se na justificação do júri. A decisão do júri foi por unanimidade.

O secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, que anunciou o vencedor, disse que o premiado reagiu "com surpresa" à distinção, e que a acolheu com o "maior agrado e com orgulho".

A editora Cotovia, que publicou o autor, em Portugal, considera-o "um dos maiores escritores das letras brasileiras, originalíssimo autor de uma obra muito reduzida e depurada", que se estreou em 1975, com "Lavoura arcaica", que foi adaptada ao cinema, assim como a novela "Um Copo de Cólera", de 1978.

Raduan Nassar nasceu em Pindorama, Estado de São Paulo, em 1935, descende de uma família libanesa, estudou Direito e Letras na Universidade de São Paulo, onde concluiu a sua formação académica em Filosofia.

O comunicado do Ministério da Cultura, que anuncia o prémio, destaca Nassar como "autor de uma obra de intervenção, promovendo uma consciência política e social contra o autoritarismo, comparado a nomes consagrados da literatura brasileira, como Clarice Lispector e João Guimarães Rosa, graças à extraordinária qualidade da sua linguagem e da força poética da sua prosa".

A Cotovia publicou em Portugal, a coletânea de contos "Menina a caminho", de 1997.

Com a obra traduzida em várias línguas, Raduan Nassar fez parte, este ano, da lista inicial (longa) do MANBooker International Prize, com a tradução de "Um Copo de Cólera".

O júri desta 28.ª edição do Prémio Camões foi constituído pela professora catedrática da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Paula Mourão, pelo escritor português Pedro Mexia, pela escritora e professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro Flora Sussekind, pelo escritor e professor da Universidade Federal de Minas Gerais Sérgio Alcides do Amaral, pelo reitor da Universidade Politécnica de Maputo, Lourenço do Rosário, e pela professora da Faculdade de Letras de Lisboa e da Universidade de Macau Inocência Mata, natural de S. Tomé e Príncipe.

O Prémio Camões, no valor de 100 mil euros, foi instituído por Portugal e pelo Brasil em 1988, e atribuído pela primeira vez em 1989, ao escritor Miguel Torga (1907-1995). No ano passado, foi distinguida a escritora portuguesa Hélia Correia.