“O gabinete do ministro da Cultura foi informado do interesse na salvaguarda da obra discográfica de Zeca Afonso por parte da Associação José Afonso, nomeadamente das ‘masters’ que pertenceriam à Movieplay [Portuguesa]”, declarou à Lusa fonte oficial.
A mesma fonte acrescentou que, “em primeira linha”, o ministério quer “apurar o paradeiro das gravações” e “só depois se poderá decidir o que fazer”.
“Apesar de não nos ter sido solicitada qualquer intervenção, consideramos importante a preservação deste património fonográfico, e estamos a tentar obter mais informação com vista ao esclarecimento do processo através do Museu Nacional da Música”, rematou a mesma fonte.
A Sociedade Portuguesa de Autores (SPA) realçou hoje a “urgência da reedição da obra” de José Afonso, questão sobre a qual alertou o ministro da Cultura, para que obtenha o "estatuto de património cultural".
“O presidente da SPA [José Jorge Letria] propôs ao ministro da Cultura [Luís Filipe Castro Mendes] uma intervenção no sentido de se assegurar a competente e adequada reedição da obra discográfica, por se tratar de uma referência obrigatória da nossa vida cultural e cívica”, lê-se no comunicado hoje divulgado, quando se assinalam 30 anos sobre a morte do autor de “Grândola, Vila Morena”.
“Mais do que envolvimento financeiro, o que se pretende é que a esse nível o ministério use a sua autoridade e legitimidade para conferir estatuto de património cultural a uma obra musical e poética que tanto tem marcado a nossa vivência coletiva”, afirmou a SPA.
A obra discográfica de José Afonso foi maioritariamente gravada pela etiqueta Orfeu, adquirida na década de 1980 pela Movieplay Portuguesa, que editou em disco alguns dos álbuns do autor de “Índios da Meia Praia”, e que entretanto deixou de estar em atividade.
Um antigo colaborador desta discográfica disse à agência Lusa que algum do catálogo da Movieplay Portuguesa terá sido depositado num armazém em Alcântara, em Lisboa, onde funcionou a discográfica LX Editora, já inativa.
“Desde aí perdeu-se o rasto do catálogo da Movieplay Portuguesa”, disse à Lusa o ex-colaborador da discográfica.
Adriano Correia de Oliveira, Tonicha, Sérgio Godinho, Argentina Santos, Carlos do Carmo, o pianista António Vitorino d’Almeida, entre muitos outros, são alguns dos nomes que gravaram para etiquetas discográficas cujos espólios foram adquiridos pela Movieplay Portuguesa.
A SPA afirma que “tem apoiado juridicamente os herdeiros de José Afonso [a viúva e os quatro filhos] nas diligências que envolvem, junto de editores, a defesa da sua obra e dos direitos correspondentes, embora esse desígnio hoje dificilmente seja cumprido”.
Desde o encerramento da Movieplay Portuguesa, empresa que foi dirigida pelo empresário José Serafim, várias entidades e personalidades ligadas ao meio musical encetaram diferentes tentativas para a recuperação do seu espólio, no âmbito da preservação da memória coletiva, sem ter alcançado qualquer resultado.
A Associação Portuguesa dos Amigos do Fado (APAF) por várias vezes chamou à atenção, publicamente, para a importância do catálogo em arquivo da Moviplay Portuguesa, designadamente nas Jornadas de Fado realizadas na extinta Fonoteca Municipal, em Lisboa.
Sobre os arquivos da Movieplay Portuguesa, referindo-se às suas pesquisas, José Manuel Osório afirmou à Lusa em 2009: "E lá fui eu mergulhar no mar da poeira de um andar num prédio de uma rua de Benfica, espreitar se ainda por lá existiam os muitos milhares de discos que eu sabia ali terem estado. As pérolas preciosas que existem naquele arquivo permitem todos os sonhos e projetos de edição".
Nos últimos anos de atividade, a Movieplay editou em disco algumas antologias que recuperavam os diferentes catálogos, coordenadas, entre outros, por Ema Pedrosa, Mário Martins e José Manuel Osório (1947-2011), designadamente “O Melhor dos Melhores”, “Os Fados da Alvorada” e antologias de Anita Guerreiro, Fernanda Maria, Fernando Maurício e Lenita Gentil, entre outros.
Comentários