“É um dos meus heróis. É uma das figuras mitológicas da minha infância […]. Foi um dos grandes exemplos de músicos em Portugal que fizeram da canção uma ferramenta [para mudar o mundo] e um megafone para ampliar as suas causas”, declarou à Lusa Capicua, nome artístico de Ana Matos Fernandes.
Capicua assume que “Zé Mário”, como lhe chama, a inspirou muito para a fazer a sua música, recordando que escreveu os versos a pensar no artista para o tema “A última”, do seu primeiro álbum.
“‘A última’ começava com os versos ‘Eu cresci a ouvir Zé Mário, a TV era a rádio, e a minha primeira rima foi à porta do infantário’, porque de facto os meus pais ouviam muito Zé Mário e é um dos heróis do meu pai. São todos eles os meus heróis e ouvia muito as músicas dele que eu achava até que era música para crianças”, como por exemplo “A ronda do soldadinho” ou o “Charlatão”.
Lamentando a morte do músico que nasceu em 1942 no Porto e que morreu aos 77 anos, Capicua acrescentou que José Mário Branco é uma das vozes de que se lembra da infância: “De facto é como se fosse um amigo ou um amigo dos meus pais […]. É uma pessoas lá de casa, é uma voz lá de casa”.
Para além da memória afetiva daquele que é considerado um dos mais importantes autores e renovadores da música portuguesa, designadamente no período da Revolução de Abril de 1974, Capicua destaca que José Mário Branco “tem sido sempre uma referência” para ela.
“Porque é uma das pessoas que mais associou a música à palavra, como ferramenta para mudar o mundo e Portugal”, disse, lembrando que a expressão “a cantiga é uma arma” foi inventada por ele e que por ser uma “expressão tão forte” acabou por “definir toda a música de intervenção que é feita em Portugal”.
“Acho que tenho tentado honrar esse exemplo e fazer música com uma mensagem e com uma capacidade de mobilização e de mudança de mentalidades e falar das causas que me são queridas”, conclui.
Nascido no Porto, em maio de 1942, José Mário Branco é considerado um dos mais importantes autores e renovadores da música portuguesa, a partir do final dos anos de 1960 e em particular dos anos que rodearam a Revolução de Abril de 1974, cujo trabalho se estende também ao cinema, ao teatro e à ação cultural.
Foi fundador do Grupo de Ação Cultural (GAC), fez parte da companhia de teatro A Comuna, fundou o Teatro do Mundo, a União Portuguesa de Artistas e Variedades e colaborou na produção musical para outros artistas, nomeadamente Camané, Amélia Muge, Samuel e Nathalie.
Em 2018, José Mário Branco cumpriu meio século de carreira, tendo editado um duplo álbum com inéditos e raridades, gravados entre 1967 e 1999. A edição sucede à reedição, no ano anterior, de sete álbuns de originais e um ao vivo, de um período que vai de 1971 e 2004.
No ano passado, aquando da homenagem que lhe foi prestada no âmbito da Feira do Livro do Porto, José Mário Branco afirmou: “O que a gente faz é uma gota no oceano do grande caminho da Humanidade".
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