O bracarense Luís Fernandes e o californiano Pierce Warnecke foram os convidados do Teatro Municipal de Faro para mais uma das suas residências artistas na ilha localizada em plena Ria Formosa.
Instalados numa casa numa zona central da povoação, revelaram à Lusa terem realizado “muitas horas” de gravações em vários locais, tanto na maré alta como na baixa, registando tanto sons artificiais como sons naturais que agora vão trabalhar, apontou Luís Fernandes.
Foram sete dias de um trabalho “exploratório” de captação de ‘samples’ - pequenas amostras de som - que depois irão ser trabalhados “em vários aparelhos analógicos e digitais” para produzir “ritmos, harmonias ou melodias”, adiantou Pierce Warnecke.
“Encontrámos, por exemplo, muitos postes que ressoavam ao vento e produziam tons, notas mesmo. Um, à beira da escola primária, transformámos num som, quase um acorde”, revelou Luís Fernandes.
Sons subaquáticos captados através de hidrofones, o “cais a chiar” ou o “barulho dos motores de barcos debaixo de água” e que “muitas pessoas podem nunca ter ouvido” ou o “barulho de alguns animais” são alguma das amostras que levam da ilha e que vão agora procurar transformar em várias paisagens sonoras musicais.
“Grande parte daquilo que faremos será baseado do que foi feito aqui na Culatra, por isso a ilha terá um papel central no que será produzido”, acrescentou.
Os dois músicos conheceram-se há oito anos num festival de música eletrónica na Madeira e desde essa altura que procuram trabalhar juntos, algo que “finalmente foi possível com o convite para esta residência”.
O objetivo era produzir um disco com as recolhas sonoras, mas a ideia de criar um espetáculo seduziu-os, estando a tentar encontrar uma forma de elaborar “partituras gráficas" a partir da informação extraída das gravações e que possam “transformar a análise áudio em elementos visuais” servindo depois de “partitura para improvisações”, avançou Luís Fernandes.
Os dias de contacto com a comunidade culatrense implicaram explicar o trabalho que andaram a fazer e confidenciaram a interpretação de um dos moradores que classificou a sua arte como uma “escultura sonora”.
“Realmente, retirámos algumas frequências menos interessantes, forçámos outras, congelámos pequenas porções e esticámo-las. A partir de sons em bruto, trabalhámo-los e moldámo-los a algo que achamos que tem interesse musical, textural e tímbrico”, explicou o músico português, que se tem desdobrado em projetos desde há vários anos, de peixe:avião à dupla com Joana Gama.
A ideia do Teatro das Figuras é que estas residências se realizem duas vezes no ano, “uma na primavera e outra em outubro, fora da época de verão", já que querem “proporcionar um clima mais calmo e de introspeção para que os artistas possam criar”, revelou o vice-presidente da Câmara de Faro, Paulo Santos.
O autarca realçou que as ações têm acontecido em parceria com a Associação de Moradores da Culatra, com a disponibilização de uma casa, mas a pretensão é que a autarquia “estabeleça um estrutura permanente de criação cultural na ilha, não só na área da música, mas também na dança ou no teatro, podendo trazer projetos de criação ao longo do ano inteiro”.
A primeira residência artística aconteceu em 2019 com a artista norte-americana Julie Byrne e para 2020 estava agendada uma da cantora e compositora Silvia Perez Cruz, que teve de ser cancelada devido à pandemia de COVID-19.
Para outubro "está prevista outra residência", cujo nome ainda não foi indicado, mas “a ideia é haver alguma periodicidade”, realçou Paulo Santos.
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